Gaeco: vereador “manejou funcionários” na Prefeitura de Natal para obter votos

Uma troca de mensagens encontrada no celular apreendido com um dos investigados na ação que apura o abuso de poder político e econômico nas eleições municipais do ano passado revelou como o vereador Irapoã Nóbrega (Republicanos) usou vagas em órgãos da Prefeitura de Natal para obter apoios para sua candidatura à Câmara Municipal. A prova foi analisada pelo do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público Eleitoral (MPE).

De acordo com o relatório do Gaeco, Irapoã Nóbrega fez uso do “manejo de funcionários”, indicando pessoas para trabalhar nas mais diversas secretarias do município, para alcançar votos para sua candidatura a vereador.

“Podemos ver que são citados nomes de pessoas e possíveis trocas, mencionando termos como ‘família ótima’, ‘investimento’, ‘família muito grande’, ‘quero amarrar eleição’, demonstrando assim a forma como eles utilizam para angariar votos”, descreve o Gaeco.

O relatório cita uma mensagem enviada pelo então candidato a vereador Irapoã Nóbrega, ex-titular da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (Semsur), na gestão do ex-prefeito Álvaro Dias (republicanos), ao investigado Itamar Domingos da Cruz no dia 5 de agosto de 2024.

Na mensagem, Irapoã diz a Itamar que ele “vai continuar atuando como está”, recebendo “apenas algumas orientações”.

Em uma conversa anterior, no dia 22 de fevereiro de 2024, Irapoã, à época titular da Semsur, envia uma lista de nome a Itamar, perguntando-lhe qual dele seria melhor para assumir uma vaga de encarregado na Urbana.

Irapoã avisa a Itamar que precisaria ser alguém “desenrolado”, porque se tratava de uma “questão de investimento”.

Depois o cabra controla de outra forma”, orienta vereador

Romário (levantando a bandeira de Paulinho Freire) declarou apoio a Irapoã após ser indicado para cargo na Urbana. Foto: Reprodução Relatório Gaeco

Itamar responde “Romário é bom”, mas pondera que ficaria “distante dele”, o que ele classifica como “ruim”, porque o melhor seria estar “pertinho” para ficar “no controle”.

O então secretário da Semsur tranquiliza Itamar dizendo que “depois o cabra controla de outra forma”, citando outras pessoas que estariam perto para dar “um arrocho” em Romário.

“Rubinho tá lá, tem Formiga, esses caras tão tudo comigo, dá pra eles dá um arrocho nele

lá”, avisa Irapoã. Em outra mensagem enviada a Itamar, o vereador instrui que, mesmo distante do indicado, ele poderia orientá-lo dizendo para ir “puxando o povo para nós”.

“Os meninos da Urbana vão começar a trabalhar nisso também. Vai dar certo, vai dar certo”, diz, em tom confiante, Irapoã Nóbrega.

Itamar pondera que estando “pertinho” seria “mais fácil”, mas assegura que não perderia o controle. “Tá seguro”, ressalta.

Tem que ter cuidado com os áudios”, alerta Irapoã

No dia 23 de fevereiro de 2024, Irapoã volta a trocar mensagens com Itamar. Dessa vez, eles conversam sobre uma convocação para um evento de pré-campanha. “Vai todo mundo de ônibus”, avisa Itamar.

“O homem lá quer tirar uma foto, todo mundo junto, então não dá certo ir separado isso não, a gente marcou um canto, se encontra, chega todo mundo no ônibus, viu? Certo? Porque se for separado vai ficar um pra lá ou pra ali, aí quem não sair na foto não vai sair na contagem”, diz o investigado.

Irapoã manda Itamar “ter cuidado com isso”, numa referência ao áudio dele, alertando que a mensagem teria vazado e ido parar “no grupo dos vereadores”. “Tem que ter cuidado com os áudios”, adverte o então titular da Semsur.

“Ainda bem que eu não citei nada do seu nome, nem citei nada do que é o evento, né? Ainda bem, né? Graças a Deus”, diz, aliviado, Itamar.

Irapoã afirma que “a sorte” foi que, no referido áudio, Itamar não falou que o evento se tratava de uma convocação, nem dizia o que era em si, porque, caso contrário, “teria sido pior”.

“Mas aí pode ser uma convocação normal pra uma reunião geral né? Né isso? Pode ser entendido como isso, né?”, reflete Irapoã.

Mesmo após ser exonerado, Irapoã continuou dando as cartas na Semsur

Em outra troca de mensagens encontrada no celular de Itamar, no dia 17 de abril de 2024, ele é avisado pela servidora comissionada da Semsur, identificada como Jéssica Kallyne da Costa Morais Cabral, que uma pessoa chamada Daniel havia solicitado a limpeza de três praças onde o ex-secretário gravaria vídeos de campanha.

O conteúdo das conversas, segundo o Gaeco, revelou que “recursos humanos e materiais da Semsur” foram usados “em benefício de interesses particulares e eleitorais do ex-secretário da pasta, Irapoã Nóbrega”, que havia sido exonerado do cargo no dia 4 de abril de 2024.

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De acordo ainda com o Gaeco, o então candidato a vereador, mesmo depois de exonerado do cargo, continuou dando as ordens na Semsur.

“Ele não mantinha mais qualquer vínculo formal com a referida secretaria. No entanto, as requisições de limpeza e manutenção de determinados locais, para possíveis gravações de campanha eleitoral do mesmo, a serem realizadas pela Semsur, ocorreram em data posterior à sua exoneração”, diz trecho do relatório do Gaeco.

MP pede cassação do prefeito, vice e dois vereadores

O Ministério Público do Rio Grande do Norte ajuizou uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), no início de fevereiro desse ano, contra o prefeito de Natal, Paulinho Freire (União Brasil), a vice-prefeita Joanna Guerra (Republicanos), o ex-prefeito Álvaro Dias (Republicanos) e os vereadores Daniel Rendall (Republicanos) e Irapoã Nóbrega (Republicanos).

Eles são acusados de suposto abuso de poder político e econômico nas eleições municipais de 2024. A ação também pede que todos se tornem inelegíveis pelo período de oito anos, a aplicação de multa aos envolvidos e a cassação do mandato dos candidatos eleitos.

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Além deles, o então diretor técnico da Arsban (Agência Reguladora de Serviços de Saneamento Básico do Município de Natal), Victor Diógenes, cunhado de Álvaro Dias, também foi denunciado pela suposta participação no esquema para favorecer a eleição de Paulinho Freire.

Victor Diógenes foi gravado em reunião com os servidores comissionados e empregados terceirizados do órgão coagindo os subordinados manifestarem publicamente o apoio a Paulinho Freire e Joanna Guerra.

Depois da divulgação da gravação pela imprensa, ele foi exonerado “a pedido” da Arsban, no dia 15 de outubro de 2024, mas foi renomeado para o cargo, após o segundo turno das eleições, no dia 1º de novembro de 2024.

De acordo com a denúncia do MPE, Álvaro Dias “orquestrou como um todo o esquema eleitoral, valendo-se da máquina pública administrativa municipal” para favorecer a candidatura do prefeito eleito de Natal Paulinho Freire e da sua vice, Joanna Guerra, além dos vereadores Daniell Rendall e Irapoã Nóbrega.

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