Quando a arte de contar histórias vira um amor de gerações

Professora há 40 anos, foi ouvindo os relatos do pai que Dorinha aprendeu a, também, ser uma contadora de histórias.

“Somos suma família de contadores de histórias, estamos na 4ªgeração. Meu pai era maquinista de trem e quando ele ia buscar sal em Macau, ia cheio de água e deixava nas localidades, onde ia ouvindo as histórias das pessoas, histórias muito tristes”, relembra Dorinha Timóteo, que se aposentou do estado após 40 anos de trabalho como professora, mas que segue atuando pelo município há 25.

Quando ele voltava e chegava em casa, eu corria para ouvir as histórias que ele tinha ouvido no sertão. O respeito e a saudade eram tão grandes que eu não ousava falar nada. Meu pai não tinha consciência de que estava formando uma contadora de histórias e eu tão pouco”, acrescenta.

Se na seca as histórias eram tristes, no inverno elas ganhavam um final feliz.

“Em retribuição pela água que levava, meu pai tem mais de 100 afilhados no interior. Minha família até participou de alguns batizados na figueira. Ele também ganhava sacos de feijão verde, milho, jerimum, quiabo…”, conta Dorinha, que já na adolescência, descobriu a rate de contar histórias por um acaso.

“Na adolescência fui ser crismada nas Quintas, onde morava. O padre me convidou para ser catequista. Depois fui para o Igapó, onde o mesmo padre estava. Tinha uma mulher chamada Regina, que contava histórias da bíblia, ela não lia e eu ficava encantada. Um dia Regina faltou e fui chamada. Eu contei as histórias, não li. Minha história começou dentro da igreja”, resgata.

Com a vocação para contação de histórias cada vez mais evidente, Dorinha também foi chamada para fazer a formação religiosa dos meninos e meninas que se formavam no escotismo. Na sequência, foi a vez da sala de aula, onde ela encontrou o palco perfeito.

Quando fiz magistério, a sala de aula passou a ser meu palco, levava muita literatura, sempre contava muita história para alunos e até hoje estou nessa caminhada. Sou mestre em Educação, ensino desde os pequenos, mas também já fui orientadora de pós-graduação. Nesse momento, trabalho com bibliotecas, quando o RN aderiu ao Pró-Ler, entrei na 1ª turma do programa, que forma professores mediadores de leitura. Era gratificante formar professores que iam levar leitura para crianças”, reconhece.

Atualmente, Dorinha trabalha na biblioteca da Escola Municipal de Tempo Integral Padre Tiago Theisen, onde desenvolve um trabalho de leitura e contação de hisórias.

“O momento de contação é mágico, as crianças ficam pedindo, elas pedem, adoram, por elas, gostariam que tivesse contação todos os dias. Recebo turmas uma vez por semana e preciso motivá-los a ler esses livros. Fazemos um concurso, no final do semestre ganha prêmio quem mais leu, eles contam sobre o que aprenderam no livro. A aluna que venceu ano passado leu 73 livros! Ano passado premiamos os três primeiros colocados, mas esse ano queremos dar aos cinco primeiros leitores. O detalhe é que eles leem para turma inteira, não só para mim, com isso os colegas se interessam e querem o livro emprestado… é um ciclo. A leitura tem que ser prazerosa, não uma obrigação. Nossa biblioteca é um espaço de prazer, mesmo aquele aluno quem ainda não lê, mostramos que ele pode ler figuras, a mãe, o colega, o amigo ou o vizinho pode ler para ele. O importante é ter contato”, avalia Dorinha.

A contação de histórias e a leitura foram transformadoras na vida da professora, que e ela conseguiu transmitir a mesma paixão que sentia a diferentes gerações da família.

Fiz a formação dos meus filhos e netos, que também são contadores de história. Há 13 anos temos um grupo oficializado como empresa, o Grupo de Contadores de Histórias Humanecentes. Prestamos serviço, somos contratados e concorremos em editais. Ao todo somos oito componentes, quatro contadores de histórias, eu, meu esposo e dois netos. Minha filha dirige o grupo e tem mais três músicos, na sanfona, violão e percussão”, revela Dorinha, que segue cheia de planos e amor pela leitura e contação de histórias.

Com a contação de histórias, a família já viajou para Portugal, se apresentando no Porto e em Viana do Castelo; também passaram por Santiago de Compostela, na Espanha; além de Londres, na Inglaterra; Escócia e Irlanda. Durante a turnê, Dorinha também lançou o livro de poesia infantil Bonequinhas de Pano, escrito em português e inglês.

População do RN é a que menos lê no Brasil

O potiguar é o povo que menos lê no Brasil, com o agravante de que está lendo cada vez menos, segundo o levantamento da 6ª edição do “Retratos da Leitura no Brasil”, divulgado em 2024. Depois do RN, que lidera o ranking de pior índice de leitura, aparecem os estados do Mato Grosso (36%) e Piauí (37%).

No Nordeste, o Ceará (54%) foi o que apresentou melhor desempenho, seguido por Pernambuco (46%), Maranhão (45%), Bahia (42%), Sergipe (40%), Alagoas (39%), Paraíba (38%), Piauí (37%) e Rio Grande do Norte (33%).

Enquanto a média nacional de leitura é de 47%, esse índice baixa para 43% no Nordeste e para 33% no Rio Grande do Norte. A média nordestina já foi mais alta, chegando aos 48% em 2019. Eram 25,3 milhões de leitores na região em 2019 e 23,3 milhões em 2024.

De uma maneira geral os índices do RN seguem uma tendência nacional de queda no número de leitores. São 7 milhões de leitores a menos em todo o país nos últimos cinco anos, sendo essa a 1ª vez que o número de pessoas que não leram nem parte de uma obra (53%) superou a de leitores (47%).

Ao todo, foram realizadas 5.504 entrevistas para a pesquisa, em 208 municípios do Brasil, entre os dias 30 de abril e 31 de julho de 2024. O “Retratos da Leitura” é considerada a pesquisa mais abrangente sobre os hábitos de leitura do brasileiro.

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