STF volta a julgar lei do RN que obriga bíblia em bibliotecas

O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a analisar uma ação direta de inconstitucionalidade relativa a uma lei do Rio Grande do Norte que obriga a compra de bíblias para as bibliotecas públicas do estado. O julgamento iniciou no plenário virtual do Supremo nesta sexta-feira (24) e segue até 6 de maio.

A Lei 8.415, aprovada em 2003, determina a inclusão, no acervo de todas as bibliotecas públicas do RN, de pelo menos 10 exemplares da Bíblia Sagrada, sendo quatro delas em linguagem Braile.

Inicialmente, a discussão sobre a validade desta lei havia começado em 28 de março, mas havia sido paralisada no começo de abril por um pedido de vistas do ministro Flávio Dino, que solicitou mais tempo para analisar a ação. 

O relator da ação é o ministro Nunes Marques, que já havia votado a favor de considerar a lei inconstitucional. Além dele, Alexandre de Moraes acompanhou o voto. Dino fez a devolução dos autos para julgamento em 8 de abril e divergiu do relator. Segundo ele, “não se tem, em absoluto, na lei estadual comando excludente da disponibilização de obras sagradas diversas nos acervos das bibliotecas públicas do Estado do Rio Grande do Norte, bem como imposição da leitura da Bíblia, ou de qualquer conteúdo, seja ele de cunho religioso ou não”. Os demais ministros também têm até 6 de maio para fazer seu voto.

Antes do pedido de vistas, Nunes Marques havia explicado o porquê de defender a lei como inconstitucional. 

“A Bíblia é o livro sagrado das religiões que professam a fé cristã, as quais foram, sem quaisquer fatores de discrímen legítimos, beneficiadas com exclusividade pela norma local. O acesso facilitado a determinado livro religioso em bibliotecas públicas e, por antecedente lógico, a aquisição dos exemplares mediante recursos públicos caracterizam incentivo estatal injustificável a valores religiosos específicos, em desconformidade com o princípio da laicidade estabelecido na Constituição de 1988”, disse o relator em seu voto.

“Aos entes políticos da Federação não cabe conceder, mediante atos legislativos, administrativos ou judiciais, tratamento privilegiado a determinada confissão religiosa. De acordo com a jurisprudência deste Tribunal, o óbice constitucional não se dá ante à mera disponibilização de exemplares de determinado livro religioso em bibliotecas ou unidades escolares públicas, tampouco à sua divulgação em espaços públicos; mas, sim, à obrigação normativa de manutenção no acervo público de determinado livro, com imposição dos respectivos custos ao poder público”, completou.

A ação foi ajuizada em 2015 pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que propôs quatro ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs 5248, 5255, 5256 e 5258) questionando leis estaduais do Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Mato Grosso do Sul e Amazonas que preveem a inclusão obrigatória no acervo das bibliotecas e escolas públicas de exemplares da Bíblia Sagrada. 

À época, o procurador-geral da República alegou que as leis ofendem o princípio constitucional da laicidade estatal, previsto no inciso I do artigo 19 da Constituição Federal. Segundo Rodrigo Janot, se por um lado os cidadãos detêm liberdades individuais que lhes asseguram o direito de divulgarem publicamente suas crenças religiosas, por outro, o Estado não pode adotar, manter nem fazer proselitismo de qualquer crença específica. 

“O princípio da laicidade lhe impede de fazer, por atos administrativos, legislativos ou judiciais, juízos sobre o grau de correção e verdade de uma crença, ou de conceder tratamentos privilegiados de uma religiosidade em detrimento de outras”, alegou, em 2015.

Ainda em 2015, em ofício ao Supremo, o presidente da Assembleia, Ezequiel Ferreira, havia defendido a norma, ao informar que o projeto tramitou regularmente na Casa, tendo recebido vários pareceres favoráveis em todas as comissões e sem possuir qualquer irregularidade formal.

“A própria legislação constitucional admite a possibilidade de o Estado manter relações de dependência ou aliança com cultos religiosos, tratando-se da colaboração de interesse público. Nesse afã, observe-se que a norma em comento estabelece cooperação estatal sem ocasionar discriminação entre as várias religiões ou relações de dependência, tendo em vista que o Estado laicista não pode favorer uma religião em detrimento de outras. Contudo, não impede que a Igreja e o Estado possam ser parceiros em obras sociais e de interesse público”, defendeu.

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