Além das condicionantes não respondidas ao Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (IDEMA), a Prefeitura do Natal do Natal deixou, pelo menos, quatro questões não respondidas publicamente e que são motivo de preocupação para quem acompanha o desenrolar da obra:
- Como vai funcionar a drenagem na praia após a engorda para evitar que a areia depositada seja levada para o mar em dias de chuva?
- O material da nova jazida tem granulometria mais grossa, fina ou igual à da Praia de Ponta Negra?
- A jazida tem material suficiente para a obra e para futuras reposições?
- Qual o impacto da engorda de Ponta Negra sobre as demais praias?
A Agência Saiba Mais tentou levantar essas respostas junto à Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinfra), que repassou os questionamentos para a Funpec (Fundação Norte-Rio-Grandense de Pesquisa e Cultura), contratada no início de 2024 apenas para acompanhar a execução da obra.
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Além da histórica dificuldade em responder as condicionantes necessárias para obter a Licença de Instalação e Operação (LIO), obrigatória para o início dos serviços, a Prefeitura do Natal enfrentou novo problema ao iniciar a dragagem da jazida de areia que seria utilizada para a engorda da praia de Ponta Negra e encontrar material diferente do esperado, com presença de cascalho.
Uma nova jazida foi encontrada pela Funpec em uma semana (entre 12 e 19 de setembro). Porém, fora da área que havia sido licenciada. Para não ter que começar de novo todo o processo de licenciamento, o prefeito da cidade emitiu um decreto de emergência por erosão marinha, e desde então, tem tocado o serviço sem o licenciamento previsto em lei.
Questão 1 – Como vai funcionar a drenagem na praia após a engorda para evitar que a areia depositada seja levada para o mar em dias de chuva?
Até o momento a Prefeitura do Natal não explicou como será feita a drenagem da praia de Ponta Negra após a engorda. No início da obra, em resposta à Agência Saiba Mais, foi dito apenas que 70% do serviço estava concluído e que os 30% restantes seriam executados junto com a obra de engorda.
“Fizeram um projeto de drenagem com base em enrocamento aderente, mas até agora não se tem um projeto dessa questão associado à engorda. Não sei nem se foi pensado, nenhuma solução foi esboçada, tem que ter uma avaliação do impacto paisagístico e urbanístico, mas, para isso, a drenagem teria que ter sido feita antes, vai terminar engorda sem a drenagem?”, questiona João Abner, professor aposentado e fundador do curso de pós-graduação de Engenharia Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Outro pesquisador que também acompanha a obra de engorda classifica como erro a implantação de drenagem ao mesmo tempo que a engorda é realizada.
“Há evidências de drenagem e isso é o pessoal da praia que mostra pra gente. Há estruturas colapsando em alguns setores, vamos observar quando chover e começar a vazar. O pior é a falta de informação sobre essa estrutura em relação ao aterro, ainda é difícil entender como ela vai se integrar ao aterro, porque pode ocorrer perda de areia acelerada”, alerta Venerando Eustáquio, professor de Engenharia Civil e Ambiental da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) e coordenador do Laboratório de Geotecnologias Aplicadas Modelagem Costeira e Oceânica (GNOMO).
Questão 2 – O material da nova jazida tem granulometria mais grossa, fina ou igual à da Praia de Ponta Negra?
Essa é outra dúvida que ainda não foi respondida e eu tem implicação direta em como a praia pode ficar. A pesquisa realizada pela Funpec foi apenas para caracterizar a jazida, não tratando sobre o impacto ambiental.
“Quando se troca a jazida por diferença de granulometria, se não for a mesma prevista no projeto, o ideal é que toda modelagem para engorda seja refeita. Tem que caracterizar nova modelagem para definir qual o perfil de praia novo. O novo sedimento garante o mesmo perfil de praia modelado no EIA/ RIMA? Se o grão de areia for igual a Ponta Negra, o modelo é outro porque a energia das ondas terá diferença de comportamento, ela retira a areia mais rápido, ela precisa ser um pouco mais grossa do que a da praia. A questão que fica é como vão garantir que o sedimento vai ficar no local colocado? Como não será transportado pela deriva litorânea? Não sabemos como será mantido. No caso de Ponta Negra, cuja praia tem formato de anzol, a tendência é pegar sedimento de sul em direção ao norte, no sentido da deriva litorânea. Onde o sedimento novo vai parar? A erosão sempre vai acontecer, temos que garantir que a areia permaneça o maior tempo possível, não sabemos o modelo de praia eu projetaram e o tempo que os grãos vão ficar… será mais obra no futuro”, pondera Venerando.
Questão 3 – A jazida tem material suficiente para a obra e para futuras reposições?
Até esta quarta (02) não foi divulgado quanto material há na jazida, portanto, não é possível saber se há areia suficiente para a obra e futuras reposições.
Questão 4 _ Qual o impacto da engorda de Ponta Negra sobre as demais praias?
“Falta estudo sobre a jazida, qual impacto sobre outras praias? Sobre as áreas vizinhas? Há um vício de origem por que a lei requer estudo prévio. Houve falha quando empresa contratada para fazer EIA/RIMA [Estudo de Impacto Ambiental/ Relatório de Impacto Ambiental] definiu como área de influência direta apenas os 4 quilômetros da engorda, enquanto o correto é abranger a área onde ocorrem impactos negativos – na área de engorda só é negativo durante execução da obra por causa dos transtornos, mas na área jazida é onde teremos maiores impactos negativos. Há áreas de praias onde impactos deverão ocorrer permanentemente… toda a costa de natal deveria ser área do projeto. Não estudaram impactos no mar da Via Costeira? E sobre Areia Preta? Praia do Meio? Redinha? Isso compromete totalmente o estudo, que deveria ter sido considerado nulo”, assevera João Abner, professor aposentado e fundador do curso de pós-graduação de Engenharia Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
A pressa…
Um ponto comum observado pelos dois pesquisadores consultados pela Agência Saiba Mais foi a pressa em realizar a obra em pleno ano eleitoral.
“A sociedade está desprotegida, isso deveria ser proibido, a justiça eleitoral deveria intervir. A questão é que qualquer crítica à pressa da escolha da jazida, é que vão alegar que há suspeição em ato da prefeitura ou da Funpec, é como se não pudéssemos levantar o questionamento… é um rolo compressor, falta lisura. A nova jazida foi encontrada em 8 dias! É muito suspeito, é um crime eleitoral, há um alto risco de ser estelionato eleitoral. Qual garantia que a população tem que isso corresponde com a realidade efetiva? O que vai acontecer passada a eleição? Até agora fizeram um pouco mais de 10% da obra? Há areia para a obra toda? Isso tem que ser auditado? É possível? Não tem como isso não se tornar tema eleitoral”, avalia João Abner.
“O litoral norte convive com erosão há anos e nem por isso as prefeituras decretaram estado de emergência para lidar com o problema. A mesma coisa em Pipa… que enfrentou problemas mais graves e não houve decretação, não se utilizaram desse tipo de recurso. A intenção desse recurso é atropelar o Idema. Essa é a primeira vez que uma prefeitura está usando desse artifício, nunca se fez isso. Será um impacto difícil de ser recuperado em outras praias. Isso mostra que o decreto não está respaldado pela precaução devida, por causa da campanha em curso. Se estivessem realmente preocupados, não seria só com Ponta Negra, mas com Natal como um todo”, arremata Abner.
A Agência Saiba Mais fez contato com a Funpec na quarta (02), mas não nos foram enviadas as respostas até a publicação da matéria.
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