Dona Lourdes, nosso patrimônio vivo

No povoado Pedras, em Marechal Deodoro, desde 1982, a galinha de cabidela — feita com molho à base do sangue da ave — tem nome e sobrenome: Dona Lourdes Pereira. E não é só sabor. No dia 23 de março de 2025, essa alagoana se tornou oficialmente Patrimônio Cultural e Imaterial do Estado de Alagoas, reconhecida pelo saber e fazer da tradicional galinha à cabidela, por iniciativa do deputado Inácio Loiola.
Galinha cabidela de dona Lourdes
 
Mas a história começou bem antes desse reconhecimento. Foi no fogareiro de lata, com a cara, a coragem e três filhos para criar, que Dona Lourdes acendeu a chama que mudaria sua vida — e, de quebra, a história da gastronomia alagoana. Sem dinheiro e sem marido , ela encontrou na cozinha não só um sustento, mas um propósito. E fez disso seu caminho.
 
Dona Lourdes, com 80 anos, comanda, com maestria e simpatia, as panelas do seu modesto restaurante, referência na culinária regional feita com capricho, afeto e sabor. E parte desse sucesso vem da estrela da casa: a galinha ao molho pardo. A fama da iguaria atravessa gerações, graças a um molho encorpado, de textura aveludada, livre de qualquer acidez. O segredo? “Não tem mistério. Bato o sangue com vinagre, alho e coentro. Depois peneiro e junto à galinha”, revela.
Galinha cabidela com pirão
A receita é temperada com ervas frescas como hortelã, manjericão e louro, além da escolha certeira da galinha velha, que garante sabor mais intenso. Para acompanhar, arroz com açafrão, feijão caseiro, farofa, pirão e salada crua. Uma dica de quem entende: misture o molho na farofa e se permita essa felicidade.
 
O caminho até aqui foi longo. Dona Lourdes aprendeu sobre novos temperos, como açafrão e salsinha, durante os 20 anos que viveu em São Paulo, onde trabalhou como empregada doméstica e, depois, cozinheira. “Não sabia nem fazer arroz, mas uma patroa me deu um curso de culinária. Abracei a oportunidade”, lembra.
 
Na capital paulista, ela comandou cozinhas de famosos como Jô Soares, Vanusa e Carlos Alberto da Nóbrega. “Vida de artista é uma loucura. Não tem hora certa pra comer. Mas aprendi muito, foi uma fase boa”, conta.
Molho aveludado da galinha da Lourdes
Embora também dominasse pratos árabes, a galinha cabidela é um legado de família, aprendido ainda menina, observando as avós. Hoje, ela prepara, em média, 190 galinhas por mês, para alegria de seus incontáveis fãs. Desde 1982, seu restaurante mantém viva uma cozinha de memória — aquela que tem cheiro de infância, de roça e de raiz. Mais que cozinheira, Dona Lourdes é resistência, história e sabor. Uma mulher que temperou a própria vida com fé, força e afeto — e, de quebra, temperou também a cultura de um povo inteiro.
Restaurante da Lourdes no meu Guia
Rota: Restaurante da Lourdes

Preço: Meia porção a partir de R$58,90 (para duas pessoas)/ Aceita cartão/ De terça a sexta-feira, das 11h às 15h; sábado e domingo, das 11h às 16hTelefone: (82) 3263-1826

 
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