Direito ao amor: casamentos homoafetivos crescem no RN acima da média nacional

Em um cenário nacional marcado por oscilações e desafios, o Rio Grande do Norte desponta como um dos estados que mais avançaram na oficialização de uniões homoafetivas. Segundo dados recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os casamentos entre homens cresceram 21,5% no estado em 2023, enquanto as uniões entre mulheres tiveram alta de 14,7%. Esses percentuais superam a média nacional, que apresentou queda de 5,1% entre homens e aumento de 5,6% entre mulheres, e também a média da região Nordeste.

O destaque estadual ficou para o município de Mossoró, onde os casamentos entre homens praticamente dobraram (alta de 86,7%) e as uniões femininas aumentaram 72,7%. Em Parnamirim, os números também subiram: 16,7% entre homens e 22,2% entre mulheres. Natal, capital do estado, registrou uma queda de 33,3% nas uniões masculinas, mas crescimento de 5,7% entre as mulheres.

Ao todo, foram registrados 160 casamentos homoafetivos no RN em 2023: 65 entre homens e 95 entre mulheres. Enquanto isso, os casamentos heterossexuais seguiram a tendência de queda observada em todo o país, com redução de 3,5% no estado — passando de 13.115 em 2022 para 12.675 em 2023.

Para além dos números, cada casamento representa uma história. Uma afirmação de amor, mas também de pertencimento e resistência, especialmente em um país onde a comunidade LGBTQIA+ ainda enfrenta obstáculos sociais, políticos e religiosos. A seguir, duas histórias mostram que o “sim” no cartório também pode ser um ato de coragem.

“Foi uma conquista de espaço”, diz Karla, sobre casamento civil no interior do RN
Em 16 de janeiro de 2018, na cidade de Cruzeta, interior do Rio Grande do Norte, Karla Brito e Josefine Campos disseram sim diante da lei. “Fomos o primeiro casamento homoafetivo no civil registrado até então. E foi um momento muito especial”, relembra Karla.

O relacionamento das duas começou em 2017 e, pouco tempo depois, decidiram oficializar a união. “Queríamos algo mais sério em nossa relação e casar foi algo grandioso em nossas vidas”, conta. A celebração no cartório foi acolhedora e emocionante. “Fizeram até uma pequena celebração com votos e tudo, achei muito lindo e especial.”

Para o casal, o gesto teve um significado profundo. “Representou para nós uma conquista de espaço, sabe? De reconhecimento e respeito. Senti que era um grande passo em uma cidade tão pequena”, afirma Karla, emocionada.

Apesar dos avanços, ela reconhece que ainda há barreiras, especialmente para casais religiosos. “Acho que para casais que são apegados à religião cristã, ainda deixa desejar o fato de não existir esse momento na igreja também.”

Karla deixa uma mensagem de força e ternura:
“Amar alguém é o ato mais lindo de coragem que se pode existir. Que se for real e recíproco os sentimentos, então, que vença sempre o amor. Torço muito para que casais possam ter momentos como esse que vivi.”

“Nosso amor nasceu no meio da negação”, relata Alan Dantas, casado em Assú

Em Assú, também no interior potiguar, Alan Eugênio Dantas Freire e Judson Manoel de Souza Silva oficializaram a união em 15 de dezembro de 2018, após já viverem juntos desde 2012. Eles estão juntos há 13 anos, mas escolheram o casamento civil como forma de reafirmar um compromisso que transcende o amor, é também político.

“Especialmente as ameaças contra a liberdade vividas durante o governo Bolsonaro. Tínhamos muito medo de perder esse direito, havia bastante discussão na época”, lembra Alan. Mesmo diante das tensões políticas, o casal encontrou acolhimento no cartório. “Curiosamente, não encontramos nenhuma dificuldade com as questões burocráticas. O cartório nos acolheu muito bem.”

Para Alan, o casamento foi uma resposta direta ao contexto de violações e violências simbólicas. “Sempre entendemos que o nosso amor tinha uma luta política como fundo de acontecimento. Nosso amor nasceu no meio da negação diária contra a comunidade LGBTQIAPN+. Então, casar no papel era também sinônimo de que estamos dispostos a construir uma realidade outra.”

Eles realizaram uma grande festa, com a oficialização da união conduzida por uma juíza de paz. “Foi uma festa linda, para pessoas mais próximas. Mas depois soubemos que alguns vizinhos do espaço fizeram comentários homofóbicos, nada além disso”, conta Alan.

Mesmo com estabilidade, Alan reconhece os privilégios que facilitaram seu processo. “Certamente em virtude da posição social e econômica que ocupamos. O que é muito triste, tendo em vista que muitos dos nossos irmãos e irmãs não gozam da mesma condição e sofrem violências cotidianamente.”

Com firmeza, ele defende o direito de amar como um direito humano:
“É preciso que ocupemos o direito que temos e os espaços que a heterocisnormatividade tenta nos desautorizar. O armário não cabe em nossas casas e nossos corpos devem viver livres para amar. Nenhum direito a menos! Ainda temos muito por conquistar, mas nosso amor não merece esperas.”

Em tempos de retrocessos e de discursos intolerantes, os dados revelam mais do que uma tendência: apontam para uma transformação social em curso. O crescimento dos casamentos homoafetivos no Rio Grande do Norte não é apenas estatístico — é feito de passos firmes, votos sinceros e histórias reais que desafiam o preconceito e reafirmam o direito de amar.

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