Parlamentares contestam aumento da passagem em Natal e falam em “caixa-preta”

Em nova movimentação do processo que pede a suspensão do aumento da passagem de ônibus de Natal, o vereador Daniel Valença (PT) e a deputada federal Natália Bonavides (PT) afirmam que o sistema tarifário da capital é estruturado em uma “caixa-preta”. Os parlamentares afirmam que houve violação à transparência e à participação popular no processo de reajuste, e contestam a metodologia usada para justificar o aumento.

A movimentação mais recente é uma réplica às contestações apresentadas pelo município de Natal e pelo Sindicato das Empresas de Transporte Urbanos de Passageiros do Município do Natal (SETURN), dentro da ação apresentada no final do ano passado e que segue na Justiça. O teor do documento foi publicado inicialmente pelo portal O Potiguar. 

Datado de 14 de maio, o documento dos parlamentares petistas afirma que houve uma violação flagrante aos princípios da publicidade, transparência da estrutura tarifária e da gestão democrática da cidade, resultante da não concessão, com antecedência, da planilha de custos tarifários e dos cálculos que a embasam, o que teria, segundo eles. “inegavelmente” frustrado o debate e sonegado informações importantes à sociedade civil.

“A Prefeitura silencia sobre o fato de que suprimiu, deliberadamente, a obrigação de fornecimento prévio de informações ao Conselho. Igualmente, também não nega que só ocorreu uma breve exposição da composição tarifária apenas no próprio ato da reunião do CMTMU [Conselho Municipal de Transporte Mobilidade Urbana], sem qualquer respeito à antecedência necessária para o bom exercício do poder popular de fiscalização. O SETURN, por sua vez, sequer nega que a planilha não tenha sido disponibilizada tempestivamente – apenas tenta legitimar o conteúdo da planilha, o que não afasta a nulidade do processo deliberativo. É inequívoco, portanto, que a deliberação do Conselho ocorreu sob grave vício aos princípios da transparência e da gestão democrática”, dizem.

Contestação à metodologia

No processo, o advogado de Valença e Bonavides afirma que tanto o município quanto o SETURN deixaram transparecer, em suas contestações, a fragilidade da metodologia adotada, e assumiram, expressamente, que o modelo não contempla a margem de lucro da operação/serviço, conforme exige a boa técnica regulatória e o princípio da transparência. A metodologia é a GEIPOT, que incorpora a remuneração do capital como item único dentro dos custos fixos, sem separar o lucro da operação propriamente dita, “o que contraria as melhores práticas regulatórias e administrativas.”

Foto: Lorena Veríssimo

Segundo o advogado, modelos mais avançados, como o da ANTP, recomendam expressamente a separação entre a remuneração do capital imobilizado (veículos, garagens, equipamentos) e a margem de lucro decorrente da prestação do serviço. Essa diferenciação permitiria, por exemplo, de acordo com ele, adotar indicadores de eficiência, fixar lucros compatíveis com o risco assumido e evitar abusos tarifários.

“Aliás, enquanto a metodologia ANTP, que corretamente segrega ‘remuneração pelo serviço prestado (lucro das empresas) e a remuneração pelo capital imobilizado (veículos, instalações, equipamentos e almoxarifado), dando mais transparência para esses valores à sociedade em geral’, o defasado e incorreto GEIPOT não o faz, já tendo sido criticado ‘pelo Tribunal de Contas da União (TCU), quando esta taxa fixa era utilizada para o Transporte Rodoviário Interestadual e Internacional de Passageiros (Tribunal de Contas da União, 2005) pois não era apresentado nenhum fundamento econômico-financeiro como justificativa’”.

Para ilustrar a disparidade entre o modelo adotado em Natal e boas práticas nacionais, foi citado o exemplo da maior cidade do país, São Paulo, onde essa segregação é feita, o lucro líquido do operador é de média de 5,6% da receita tarifária reconhecida, conforme detalhado em planilha pública da autarquia municipal e exibido no documento:

“Nada disso é possível em Natal, onde o sistema tarifário continua estruturado em uma caixa-preta, impedindo que a população, o Ministério Público e os órgãos de controle fiscalizem o real desempenho financeiro das empresas”, aponta a réplica do vereador e da deputada federal.

Assim, de acordo com o documento, não há margem de lucro prevista para a operação em si, como ocorre em modelos tarifários adequados; e a remuneração sobre o capital investido é tomada como substitutiva de qualquer ganho empresarial, o que distorce a lógica econômico-financeira da relação administrativa e subverte o equilíbrio contratual em favor da concessionária, que opera sem prestação de contas quanto à eficiência ou à lucratividade da operação.

Pedidos

Na réplica, os parlamentares pedem:

-O recebimento da réplica, com a consequente rejeição integral das contestações apresentadas tanto pelo Município do Natal quanto pelo SETURN, ante a manifesta insuficiência de fundamentos para afastar os vícios formais e materiais apontados na inicial; 

-O reconhecimento da nulidade da deliberação do Conselho Municipal de Transporte e Mobilidade Urbana (CMTMU), de 26 de dezembro de 2024, por afronta ao dever de transparência, participação democrática e devido processo deliberativo;

-A declaração da invalidade do reajuste tarifário promovido em 26 de dezembro de 2024, em razão da ausência de fundamentação técnica adequada, do uso de metodologia incompatível com os princípios da publicidade e da economicidade, e da não disponibilização prévia e razoável da composição de custos aos conselheiros;

-Caso a Justiça entenda necessário, a designação de perícia técnica especializada, a ser realizada por instituição pública ou profissional isento, para aferir da (in)adequação da metodologia empregada (GEIPOT) e da (in)existência de margem de lucro oculta ou indevidamente calculada no reajuste impugnado, bem como eventual lesão ao patrimônio municipal;

-A condenação dos réus à obrigação de não fazer, consistente em se absterem de promover novos reajustes tarifários do serviço público de transporte coletivo municipal com base em metodologias que não contemplem de forma separada e transparente a remuneração do capital e a margem de lucro da operação, enquanto não houver: revisão da metodologia tarifária com observância dos princípios da transparência tarifária, moralidade administrativa e controle social; e garantia de prévia disponibilização da composição de custos aos integrantes do Conselho Municipal de Transporte e Mobilidade Urbana (CMTMU), com antecedência razoável para deliberação técnica e democrática. 

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Parlamentares pedem suspensão de aumento de passagem de ônibus em Natal

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