Matrículas em escolas públicas do RN terão material sobre violência doméstica

A ficha de matrícula, que por tantos anos resumiu-se a nomes, documentos e dados escolares, agora se transforma em um canal direto de informação e proteção. No RN, todas as escolas públicas da Rede Estadual deverão entregar às famílias, no ato da matrícula, um material informativo sobre violência doméstica. O conteúdo explicará o que caracteriza esse tipo de violência, apresentará orientações sobre a Lei Maria da Penha, os canais de denúncia e os serviços de acolhimento às mulheres disponíveis no estado.

A nova exigência está prevista na Lei nº 12.131, já em vigor e que será regulamentada nos próximos meses. A proposta é de autoria da deputada estadual Isolda Dantas (PT) e foi sancionada pela governadora Fátima Bezerra (PT). A proposta reconhece o papel estratégico da escola pública não apenas como espaço de ensino, mas também como ponto de apoio e conscientização, sobretudo em comunidades mais vulneráveis.

Pela nova norma, mães, pais ou responsáveis legais receberão os materiais impressos no momento em que formalizarem a matrícula dos filhos. A expectativa é que o conteúdo entregue seja claro, acessível e direcionado para a realidade das comunidades atendidas pela rede estadual de ensino. A iniciativa busca ampliar o alcance de informações que muitas vezes não chegam às mulheres em situação de violência.

Violência contra a mulher persiste no estado

A obrigatoriedade surge em um contexto em que os crimes contra a mulher seguem em alta no estado. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, o número de tentativas de feminicídio passou de 37 para 66 entre 2023 e 2024 — um aumento de 78,4%. Também houve crescimento nos registros de lesão corporal dolosa em casos de violência doméstica, que saltaram de 1.348 para 1.429 no mesmo período.

Os feminicídios consumados, por outro lado, caíram de 24 para 19 casos — redução de 20,8%. Apesar disso, os números seguem elevados. Entre janeiro de 2020 e agosto de 2024, 10.742 mulheres foram vítimas de agressão física no estado. Em quase 58% dessas ocorrências, os filhos estavam presentes.

De 2020 a 2024, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte concedeu 37.594 medidas protetivas. Os dados são do Projeto Marias – Radar da Violência Doméstica. Para além da Justiça, a rede de apoio inclui os canais de denúncia Ligue 180 (disponível 24h), o Disque 190 para emergências e as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), que atendem em todo o estado.

Maioria das vítimas é agredida na frente dos filhos no RN

Os dados do Projeto Marias – Radar da violência doméstica mostram que entre 1º de janeiro de 2020 e 28 de agosto de 2024, 10.742 mulheres sofreram algum tipo de agressão física no Rio Grande do Norte e em 57,99 % dos casos (8.147 mulheres), a vítima foi agredida na frente do filho (a). Dentre as agressões sofridas pelas vítimas, o empurrão foi o mais citado por 8.909 mulheres (21,28%), seguido pelo tapa (17%), citado por 7.137 e depois apareceu o puxão de cabelo, citado por 6.155 vítimas (14,7%). A contagem ainda registra casos de soco (14,6%), chute (12,85%), enforcamento (5,4%), sufocamento (4,26%), estrangulamento (3,27%), pauladas (2,16%), facadas (1,07%), queimaduras (0,72%), afogamento (0,17%) e tiro (0,14%).

Para 3.579 mulheres (25%) potiguares, as agressões ocorreram durante a gravidez ou nos três meses posteriores ao parto e as mulheres pardas foram maioria entre as vítimas, tanto de violência por agressão física, quanto por agressão sexual.

O perfil das vítimas

A maioria das mulheres (77%) vítimas de agressão se consideram independentes financeiramente do agressor. Porém, 47% delas dizem ter filho (s) com o agressor, sendo a maioria das crianas com idade entre 0 e 11 anos. Quase metade das vítimas (45%) disseram ter tido familiares agredidos.

O perfil do agressor

Em 33,1% dos casos (4.650 homens), o agressor faz uso abusivo de álcool e/ou outras drogas. Já em relação ao uso de álcool e/ou outras rogas, a maioria faz uso abusivo, num total de 58% ou 8.201 homens. A maioria (76%) dos agressores, num total de 10.715, não possui doença mental comprovada, 34% deles (4.786) já falaram ou tentaram suicídio e 66,73% (9.375) respeitou medida protetiva anterior. Um outro agravante é que 32,96% dos agressores (4.630) possuem acesso a arma de fogo.

Para os movimentos feministas e setores progressistas, a nova lei que vai divulgar informações nas escolas é um passo importante no fortalecimento de uma rede de proteção que articula educação, assistência social e justiça, combatendo uma das formas mais persistentes de desigualdade no país. A inclusão do material informativo nas escolas reforça a ideia de que o enfrentamento à violência de gênero não é responsabilidade isolada de um setor. É política pública que atravessa a educação, a saúde, a justiça e, agora, chega até o momento mais cotidiano do vínculo escolar: a matrícula.

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