Há algo de definitivo no gesto de Alice Carvalho. Um passo firme, o olhar reto, a escolha consciente de não pedir licença para ocupar o espaço que lhe cabe. Em 2025, ela escreve um novo capítulo da cultura potiguar ao integrar o elenco de O Agente Secreto, filme brasileiro selecionado para a Palma de Ouro no Festival de Cannes. É sobre isso — mas também sobre o que vem antes e o que se desdobra a partir daqui.
O Agente Secreto, dirigido por Kleber Mendonça Filho, foi anunciado nesta quinta-feira (10) como representante do Brasil na competição oficial. Alice atua ao lado de Wagner Moura e Maria Fernanda Cândido, numa trama ambientada no Recife de 1977. Um país em tensão. Um tempo suspenso. E, agora, uma atriz do Rio Grande do Norte entre os nomes que vão atravessar o tapete vermelho mais importante do cinema mundial.
Não é pouco. Mas também não é repentino.
Alice vem construindo sua trajetória com consistência rara. Criou e protagonizou Septo, série que virou referência de produção independente no Nordeste. Em Cangaço Novo, foi Dinorah — e não passou despercebida. Recentemente, interpretou Maria Santa jovem no remake de Renascer, na TV Globo. Foi uma aparição breve, mas marcante: Maria Santa é o eixo afetivo da trama, e Alice soube entregar, com poucos gestos, a força de uma personagem que sustenta toda uma linhagem ficcional.
Entre a ficção e a vida, construiu uma presença cênica que é ao mesmo tempo bruta e delicada, política e sensível. Uma atriz que se recusa a caber onde esperam que ela caiba.
A notícia de hoje não é apenas sobre um filme que chega a Cannes. É sobre quem está sendo visto. E de onde vem essa pessoa. Alice carrega o sotaque, a cidade, as ruas, as referências culturais de um lugar que ainda precisa explicar onde fica no mapa quando cruza as grandes rodas. Mas ela não explica. Ela mostra.
Em meio a um mercado audiovisual ainda centralizado no eixo Sudeste e em um país onde o cinema enfrenta cortes, censuras e incertezas, ver uma artista do RN romper a bolha não é um detalhe — é um ato político.
Cannes é vitrine, é validação, é um farol apontado para o cinema brasileiro num ano em que precisamos, mais do que nunca, reafirmar nosso lugar no mundo. E entre tantos nomes que poderiam ocupar essa vitrine, está Alice. Potiguar, nordestina, brasileira, criadora. Uma artista que não esperou a vez: criou seus próprios caminhos. E agora, caminha por onde quiser.
RN já esteve outras vezes em Cannes
O cinema potiguar já marcou presença no Festival de Cannes. Em 2021, o curta-metragem “Sideral”, dirigido por Carlos Segundo, foi selecionado para a competição oficial de curtas-metragens do festival, tornando-se o primeiro filme potiguar a concorrer à Palma de Ouro. A produção, genuinamente natalense, contou com elenco e equipe majoritariamente do Rio Grande do Norte, e sua estreia em Cannes representou um marco significativo para o audiovisual do estado.
Além de “Sideral”, outras produções filmadas no Rio Grande do Norte também ganharam destaque em Cannes. O filme “Bacurau” (2019), dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, embora seja uma produção pernambucana, teve cenas gravadas no município de Parelhas e Acari, no sertão potiguar. O longa recebeu o Prêmio do Júri no Festival de Cannes de 2019, consolidando-se como uma obra de relevância internacional.
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