Do lixão a empresário de reciclagem

Reduzir, reutilizar, reciclar. Os ‘mantras’ do consumo consciente são também a base do sucesso do empresário Carlos Santana, 61, dono de uma empresa que coleta todo tipo de sucata e material descartado no lixo e ganha dinheiro revendendo peças totalmente remodeladas.Instalada em um terreno de 10 mil metros quadrados, a Ecoglobal reúne em seu galpão algo em torno de R$ 500 mil em materiais considerados inservíveis. Qualquer pessoa eu entrar no lugar vai enxergar sucata, ou lixo, mas, para Carlos, tudo é uma questão de transformação.Nascido em Mata de São João, Carlos é filho de carpinteiro. Acompanhava pai dos 7 aos 11 anos na carpintaria e depois na ‘venda’, onde trabalhou até os 17, quando se casou. Por indicação do cunhado se tornou assessor de uma vereadora em Mata de São João.O atendimento a pessoas em situação de vulnerabilidade despertou o dom para a articulação. Depois de conhecer uma criança, de 8 anos, que morava na rua e dormia em papelão, Carlos conseguiu com a Politeno R$ 600 mil para a construção de uma creche. A empresa ainda bancou o custeio de R$ 500 mil por ano para manter o local funcionando.A experiência na área social levou o assessor a buscar empreender. Foi a partir de um convite que iniciou sua trajetória no ramo da reciclagem em um lixão no município de Catu. No local, teve que enfrentar a resistência de algumas ‘lideranças’, alguns ligados a facções criminosas.“Como olhar para a montanha de lixo e no meio dos vermes enxergar um futuro”, indagou o candidato a empresário. Ele conta que foram necessários três meses para conquistar as lideranças e ganhar a confiança das 70 famílias que tiravam seu sustento do lixo.Implantou noções de higiene, o uso de equipamentos de proteção individual (EPI´s), difundiu noções de consciência ambiental, realizou doações de geladeiras e máquinas de lavar. Para vencer a concorrência com traficantes, que ofereciam drogas em troca do material coletado pelos catadores, investiu em um espaço ‘alternativo’.Evangélico, comprou uma casa e iniciou um trabalho de evangelização. No lugar das drogas, oferecia alimentação. Montou uma lanchonete e ‘pagava’ pelos resíduos coletados com hambúrgueres e batata frita. “Era o ‘Recicoin’, brinca Carlos, fazendo referência à moeda virtual.Ganha-ganhaMas, um desentendimento com um patrocinador motivou sua saída do lixão. Daí surgiu a ideia de montar uma empresa de reciclagem em Camaçari. Procurou a indústria Catanordeste, de embalagens, também buscou a indústria de plásticos, como a Tigre, Fortlev, e começou a coletar e transformar materiais.Os produtos reciclados vão para clientes como a Blaspel (plásticos), CSP (papel), Bahia Ecologia (baldes e bacias) e Metal Verde (sucata). Hoje, várias indústrias pagam a Ecoglobal para limpar suas instalações. A empresa ganha duas vezes, comercializando o produto da ‘limpeza’, após o processo de reciclagem. E muitas vezes, os produtos nem precisam ser recondicionados.Foi assim que a empresa recebeu numerosos de peças da Ford, quando foi contratada para esvaziar as instalações da empresa. Só de parafusos são 30 mil, todos novos, sem falar em para-choques, componentes eletrônicos e até motores, que são revendidos para lojas de auto-peças.Desta forma, a Ecoglobal ganha duas vezes. Recebe das empresas que precisam limpar seus estoques de ‘inservíveis’ e lucra com a revenda. Em alguns casos, no entanto, o material reciclado é simplesmente doado.É o caso de monitores antigos de computador, que ocupam uma estante inteira no galpão da empresa. Geladeiras e máquinas de lavar também fazem parte do estoque. São 50 toneladas de telhas de fibra, das quais 20 toneladas já foram comercializadas a preços populares.

Modelos antigos de monitores de computador, sem valor de mercado, são doados para estudantes

|  Foto: Alan Rodrigues | AG. A TARDE

Algumas pérolas também fazem parte do acervo coletado, como uma bomba hidráulica de R$ 40 mil que foi encontrada ‘perdida’ no meio da sucata de uma indústria. Carlos exibe com orgulho 100 peças de vidro inteiriças que serão transformadas em mesas de centro.O ‘hobby’ do empresário é desenvolver móveis a partir de madeira reutilizada. Ou, como ele diz: ‘pegar o que estava morto e transformar em algo útil para toda a vida’. O empresário também se interessa pela pesquisa e está desenvolvendo novos materiais a partir do processamento de resíduos industriais, mas isso ele guarda em segredo até que possa patentear.ParceriasAlém de indústrias, Carlos tem entre seus parceiros escolas e condomínios. Como o residencial Vivendas Camaçari. Lá, conta a administradora Natália Gomes, ele remunera os condôminos para ter o direito de coletar os resíduos de todo o conjunto habitacional.A parceria começou em junho do ano passado e tem contribuído para a maior conscientização dos moradores. O volume de lixo coletado, que no início chegou 1.200 quilos, hoje oscila entre 500 e 600kg, demonstrando um consumo mais consciente e redução do desperdício.

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