A redução pela metade no teto de renúncia fiscal da Lei Municipal Djalma Maranhão começa a afetar diretamente a realização de eventos tradicionais e iniciativas independentes em Natal. A medida limita o uso de incentivos fiscais da Djalma Maranhão a apenas 1% da previsão orçamentária do município, o que já levou ao esgotamento do recurso disponível em abril.
O decreto nº 13.311/2025, publicado no Diário Oficial do Município (DOM) em 31 de janeiro, estipula em R$ 8,5 milhões o teto para renúncia fiscal via Lei Djalma Maranhão, da previsão orçamentária de arrecadação do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e do Imposto Sobre Serviços (ISS), para o exercício financeiro de 2025. O montante corresponde a 1% da arrecadação prevista. Antes, a taxa era de 2%.
A mudança preocupa produtores culturais e parlamentares. A vereadora Brisa Bracchi (PT) disse que a redução aprofunda o cenário de abandono da cultura na capital potiguar. “O teto da renúncia fiscal, que até o ano passado era de 2%, já se mostrava insuficiente para atender às demandas da produção cultural local. A valorização da nossa cultura passa, necessariamente, pela revisão deste decreto que escancara o projeto de desmonte cultural em curso na nossa cidade”, afirmou ela, em entrevista ao AGORA RN.
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Para Brisa Bracchi, além de comprometer o calendário cultural da cidade, o decreto fragiliza especialmente projetos com viés comunitário e alternativo, que não contam com grandes estruturas nem redes consolidadas. “A realidade dos nossos artistas e produtores culturais é marcada pela ausência de políticas públicas sólidas, que garantam segurança para que projetos culturais saiam do papel e se mantenham a longo prazo”, completou a parlamentar.
Diante desse cenário, conforme a vereadora, a maior parte dos incentivos acaba sendo de caráter emergencial e com ofertas limitadas. “Manter a chama cultural da nossa cidade acesa não é fácil e esse é apenas um recorte de um problema que possui raízes profundas. A nossa cultura precisa, com urgência, começar a ser tratada com a seriedade que merece”.
Um dos eventos afetados pela escassez de recursos é o aHAYá de Rua, projeto cultural comunitário que ocorre na Potilândia. Idealizado por Haylene Dantas, o evento reuniu cerca de 12 mil pessoas em sua última edição, arrecadando 10 toneladas de alimentos e beneficiando mais de 20 instituições sociais. Mesmo com o impacto positivo, o projeto ainda enfrenta dificuldades.
O projeto foi aprovado na Djalma Maranhão, mas a redução no teto de renúncia fiscal comprometeu o acesso a recursos. Mesmo com duas empresas já alinhadas à proposta, o limite foi atingido antes que o aHAYá pudesse finalizar seu processo junto à Secretaria de Tributação. Agora, a produção busca alternativas por meio da Lei Estadual Câmara Cascudo e também pela mobilização de novos parceiros interessados em somar à continuidade do projeto.
“Já visitamos várias empresas, mas muitas deram negativas. Ainda temos esperança de que essa mobilização sensibilize mais parceiros. Falta entendimento do empresariado sobre como funciona esse processo de isenção”, pontuou Haylene, alertando para o tempo curto até a próxima edição, que será realizada em junho.
Com entrada gratuita, o evento realizado há sete anos se consolidou como um dos maiores arraiás de rua da capital potiguar. Segundo Haylene, o evento movimentou toda a economia local do bairro de Potilândia, os estabelecimentos comerciais da região faturam durante o evento – mostrando como o evento proporciona um “respiro” econômico para a comunidade.
“É muito delicado o momento que a cultura do RN se encontra, a gente está tendo que mendigar, que pedir o mínimo para fazer o óbvio. Acredito que eles querem fazer esse esgotamento, mas a gente não vai cansar. O aHAYá representa tudo que aprendi sobre cultura viva, para todos os públicos. Nasci e cresci na Potilândia, vivenciando um dos maiores festejos de arraiá de rua do Nordeste e infelizmente também acompanhei o fim dele, o memorável arraiá da Esmeralda. Estou vendo o aHAYá crescer com amor e me recuso a vê-lo morrer”, frisou ela.
A Secretaria Municipal de Cultura de Natal (Secult/Funcarte) foi procurada pela reportagem para comentar a mudança da Lei Djalma Maranhão, mas não respondeu até o fechamento desta matéria.
Na última terça-feira 6, a Prefeitura do Natal divulgou a programação oficial do São João deste ano com atrações como Bell Marques, Luan Santana, Simone Mendes, Henry Freitas e Xand Avião, com investimento estimado em quase R$ 20 milhões. Do total, conforme a secretária de Cultura Iracy Azevedo, quase R$ 1 milhão será investido em editais de quadrilha, arraiá de rua, chamamento de bandas e trios.