Queda do ATR-72: Análise aponta condições meteorológicas críticas

O avião ATR-72 da VoePass, que caiu em Vinhedo, interior de São Paulo, na última sexta-feira, 9, resultando na morte de 62 pessoas, enfrentou uma zona meteorológica altamente crítica por nove minutos antes do acidente. Essa conclusão é do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), que utilizou imagens de satélite e radar para analisar a rota do voo.Entre 13h10 e 13h19, a aeronave reduziu a velocidade e atravessou nuvens supercongeladas com temperaturas de até -40°C. O meteorologista Humberto Barbosa, fundador do Lapis, afirmou que a aeronave estava sob condições meteorológicas “caóticas”. A Força Aérea Brasileira (FAB) relatou que, a partir das 13h21, o avião não respondeu às chamadas do Controle de Aproximação de São Paulo, não declarando emergência ou informando sobre condições meteorológicas adversas. Às 13h22, um minuto após o último registro, a altitude da aeronave era de 1.250 metros, com uma queda de aproximadamente 4 mil metros.O Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA) informou que o “Salvaero” foi acionado às 13h26 e localizou a aeronave acidentada em um condomínio.Um relatório técnico preliminar da FAB sobre as causas do acidente deve ser concluído em 30 dias. O Lapis identificou três possíveis cenários meteorológicos que podem ter contribuído para a queda: turbulência, formação de gelo e a influência de um ciclone extratropical e fumaça de queimadas.Turbulência e água supercongeladaImagens de satélite indicam que a aeronave enfrentou um sistema frontal de turbulência causado por nuvens do tipo Cirrocumulus, formadas em condições de alta umidade nos altos níveis da atmosfera. A primeira grande oscilação da aeronave ocorreu às 12h52, quando a velocidade caiu de 529 km/h para 398 km/h. Próximo da queda, às 13h06, o avião reduziu rapidamente sua velocidade de 604 km/h para 491 km/h, antes de perder velocidade drasticamente. O último dado registrado foi às 13h22, com a aeronave a 63 km/h e a 1.798 metros de altitude.

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Humberto Barbosa explicou que havia condições atípicas de congelamento devido à alta umidade, com gotículas líquidas supercongeladas a partir de 6 a 7 mil metros de altitude, enquanto a aeronave estava a cerca de 5,1 mil metros. “Havia um sistema frontal, com muita umidade e turbulência, frio extremo e água supercongelada. Essa situação pode levar a aeronave a entrar em condições de formação de gelo”, disse.Leia mais: >> Após seis dias do acidente da Voepass, avião de pequeno porte cai no MT; vídeoFormação de geloA primeira imagem do satélite mostrou a altura do ponto de congelamento na atmosfera, onde a água supercongelada estava a cerca de -55°C, abaixo do ponto de congelamento. Essa água, na condição líquida e supercongelada, teria maior aderência à aeronave, tornando-se gelo e possivelmente afetando a aerodinâmica do avião.

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“À medida que se aproximava do destino, a aeronave enfrentou muitas perturbações e variações na composição das nuvens complexas, com áreas de formação de gelo, nuvens mais altas e nuvens mais baixas, além de grandes variações nas temperaturas e nas condições de pressão”, analisou o meteorologista.A área em vermelho na segunda imagem indicava a presença de água supercongelada, gotículas ou cristais de gelo. O ponto destacado apresentava uma temperatura de cerca de -38ºC. A história da aviação mostra que a formação de gelo pode causar danos ao motor e a dispositivos essenciais da aeronave, além de afetar a capacidade de detecção de pressão dos tubos de Pitot, utilizados para medir a velocidade do ar, podendo resultar em dados de velocidade imprecisos e confundir os pilotos.Ciclone extratropical e fumaça de queimadasUm ciclone extratropical que se formou sobre o Uruguai e o Rio Grande do Sul na manhã da sexta-feira (9/8) injetou mais umidade na região do acidente, tornando as condições meteorológicas ainda mais caóticas. Humberto observou que a imagem do satélite GOES revela a presença do ciclone, identificado em amarelo e ciano, associado a uma frente fria que fez as temperaturas declinarem.

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Adicionalmente, a aeronave atravessou ventos intensos, com velocidade de 53 km/h, provenientes da Amazônia, o que representou um desafio adicional. As barbatanas roxas na imagem do satélite GOES-16 indicam esses ventos fortes em São Paulo, classificados com alta pressão.A fumaça das queimadas, trazida para o Sudeste pelo ar seco da Amazônia, ficou em altos níveis da atmosfera como aerossóis, que, segundo o laboratório, tornaram a água ainda mais fria e líquida, contribuindo para a formação de gelo e possivelmente aumentando o peso da aeronave. Embora esses aerossóis tenham diminuído a intensidade da chuva, também resultaram em temperaturas da água ainda mais baixas, potencializando a formação de gelo. Assim, mesmo durante uma frente fria de inverno, houve intensa convecção, gerando nuvens verticais que poderiam já conter gelo.

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