Mais Querido: Adriano de Sousa lança livro que une futebol e memória potiguar

Eu, particularmente, sou indiferente ao futebol. Acho legal a questão cultural envolvida, mas não chega a ser algo que me toque. Mas, ao conversar com o jornalista Adriano de Sousa sobre o livro “O Mais Querido”, que ele lança na próxima quinta (15), a partir das 17h, no 294 Bar e Restaurante, em Petrópolis, a curiosidade foi dando lugar à indiferença.

Pelo título, é de se imaginar que o livro trate da história de 109 anos do time de futebol ABC, fundado em Natal no ano de 1915, e que ao longo de suas 420 páginas o autor detalhe os personagens, títulos, artilheiros, anedotas, peripécias, momentos difíceis e conquistas do clube. Mas, para além disso, o livro é uma reconstituição, em ordem cronológica, não apenas da história do alvinegro, mas da cidade do Natal e do Rio Grande do Norte.

O tino de jornalista não permitiu que a publicação fosse uma simples ode ao time escrita por um torcedor fanático.

Eu sou mais tranquilo, não tenho esse vínculo clubístico. Gosto mais do jogo, do futebol, do que do ato de torcer. Sempre joguei muito infância e adolescência. Meu interesse é mais pela cultura do futebol em si do que pelo ato de torcer”, esclarece o jornalista.

Imagem cedida: reprodução do livro “O Mais Querido”

Adriano de Sousa tem 62 anos, nasceu em Alexandria, no interior do Rio Grande do Norte, e veio para Natal na primeira oportunidade que teve, ao concluir o 1º ano do 2º grau. Na capital passou a estudar e fazer o que mais gostava, escrever e assistir aos jogos do ABC nos finais de semana.

Minha trajetória muito comum para quem nasce no interior. Saí de Alexandria em 1977, quando concluí o ensino médio. Na época, você podia concluir pagando as matérias do 1º ano e fazer a série com as matérias básicas e mais um curso técnico, que foi o que eu fiz. Como eu queria sair de lá, vim estudar na Escola Agrícola de Jundiaí. Não queria ser técnico agrícola, mas sair da cidade e era mais complicado ir para a casa de parentes em Natal. Coincidiu que na época uma parte das vagas na Escola Agrícola, a partir do 2º ano, era destinada a alunos de escolas públicas do interior que tivesse feito esse 1º ano unificado”, conta Adriano de Sousa.

Nesse período, vez por outra, ele vinha até Natal e ficava na casa de um tio durante o final de semana.

Aproveitava, evidentemente, para assistir aos jogos do ABC no fim de semana. O livro, inclusive, é dedicado a esse tio, que me hospedava. Ele já morreu, mas quando vinha para Natal ficava na casa dele, que também pagava o ingresso do jogo, eu não tinha renda”, revela.

Como gostava de escrever, Adriano se formou em jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e, desde então, trabalhou em vários veículos de comunicação, chegando a morar 13 anos em Brasília, onde passou pelo no Correio Braziliense, Bandeirantes, TV Educativa e TV Globo. Ele voltou para Natal em 2001, por pura saudade da capital potiguar.

“O Mais Querido” foi escrito em momentos diferentes. O trabalho de pesquisa começou nos anos de 2009/ 2010. Em 2015, o jornalista chegou a escrever seis capítulos, mas teve que guardar o projeto na gaveta para trabalhar. Foi durante a pandemia da Covid-19 que a escrita foi retomada de maneira mais sistemática.

O livro traz 200 ilustrações, entre fotografias, imagens históricas e recortes de jornais antigos numa reconstituição da Natal, do ABC e da influência que o time teve ao longo do tempo.

Tentei fugir dessa coisa do pitoresco, que é muito presente na escrita do futebol, de modo geral. Minha pretensão era fazer um livro diferente dos que a gente costuma ver sobre o tema que, mesmo quando conta a história de um clube, o faz de forma restrita, parcial… ‘foi fundado dia tal, numa reunião com fulano’… também tem essa mania de estatística dizendo que ganhou tantos campeonatos, teve artilheiros em tais anos, venceu tantos títulos… Eu não queria contar a história do ABC com base em recorte, mas por um fio cronológico até 2023”, antecipa Adriano.

“A história não existe num vácuo, não é uma coisa estanque, desvinculada da história, daquele lugar e daquele tempo. O que acontece no clube reflete o que tá acontecendo lá fora, ou até produz, em parte, fora do âmbito do clube. A história do ABC não existe descolada da história da cidade, do estado. O livro tem essa pegada desde o começo”, acrescenta o autor.

O ABC – assim como o América, cerca de 1 mês depois – foi fundado numa Natal que, apesar do título de ‘cidade’, estava mais para uma vila da fase do Brasil Colonial. Na capital, apesar de já haver bonde, predominavam as ruas de terra batida.

Imagem cedida: reprodução parcial de página do livro “O Mais Querido”

Eles surgiram no contexto de cidade que, embora tivesse o título formal, era uma vila com baixíssimo índice de urbanização, com ruas de areia e um sistema de transporte precário, apesar de já ter bonde. Não havia um campo de futebol oficial. A partir de 1915, quando surgem os primeiros clubes que, de fato, vão se manter como ABC e América, e com o surgimento de dois clubes de remo que ainda existem até hoje, que são o ‘Náutico’ e o ‘Esporte’ permitiu a organização da 1ª Liga Desportiva e das primeiras competições, não só de futebol, mas também de remo, ciclismo, atletismo, que as pessoas praticavam, mesmo que de forma improvisada. Já tinha quase três décadas de proclamação da República, mas Natal ainda era uma vila colonial, era ainda uma cidade por fazer e acho que o futebol ajudou, de alguma forma, a constituir a identidade da cidade, dos moradores… parte do que é ser natalense é ser torcedor do América, ABC, Alecrim… não é só isso, lógico, mas é isso também”, analisa o autor do livro.

Adriano de Sousa com o livro em mãos I Foto: cedida

Para americano também…

Ao contar a história do ABC, Adriano explica que acaba por também contar a história de Natal, do estado e de seu maior rival, sem o qual não teria a mesma força.

“Esse não é um livro de torcedor, mas de jornalista que, por coincidência, torce pelo time. Mas não é um livro oficial do ABC, institucional do clube. Ele não foi feito para enaltecer o ABC a qualquer preço, o que tem para enaltecer é reconhecido. É um livro crítico que tenta apreender a história do ABC dentro desse viés que venho explicando, como parte da história de Natal e do Rio Grande do Norte”, pondera Adriano.

Imagem cedida: reprodução parcial de página do livro “O Mais Querido”

Foi a rivalidade entre os times, na avaliação do autor, que garantiu a institucionalização do futebol em terras potiguares.

“Não tem como contar a história do ABC sem falar do maior rival dele porque dessa rivalidade existente desde o começo foi fundamental para garantir a sobrevivência desses dois clubes e a institucionalização do futebol aqui, com a institucionalização da Liga, com a promoção dos primeiros campeonatos estaduais, com o intercâmbio com clubes, principalmente, da Paraíba, Pernambuco e Ceará, no começo, por serem os estados mais próximos. A história do América está, também muito bem contada no livro com base nas memórias do escritor Esmeraldo Siqueira, que era irmão de dois dos fundadores do América. Ele conta o choque que tomou ao ver o primeiro jogo de futebol em Natal, quando tinha por volta de 7 ou 8 anos de idade. Era a 1ª partida organizada do ABC contra o Natal Futebol Clube, um time que hoje não existe mais, e o ABC ganhou por 3X1, acho. Em seguida, veio o 2º jogo oficial do ABC, que foi contra o América, e que ganhou por 4×0”, relembra o jornalista Adriano de Sousa.

Não precisa gostar de futebol para ler o livro”, resume o autor de “O Mais Querido”.

Depois dessa, acho que tá feito o convite.

Serviço

O que | Lançamento do livro “O Mais Querido”

Quando: quinta (15)

Hora: a partir das 17h

Onde: no 294 Bar e Restaurante, em Petrópolis.

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