A cidade do Natal precisa pensar o planejamento urbano incorporando os riscos e impactos das mudanças climáticas 

Rylanneive Leonardo Pontes Teixeira 
Pesquisador no Laboratório Interdisciplinar Sociedades, Ambientes e Sociedades (LISAT) da UFRN, e no INCT – Rede Observatório das Metrópoles – Núcleo Natal.

Que é preciso lidar com as mudanças climáticas, isso parece ou deveria ser claro! A tragédia socioambiental, resultante das mudanças climáticas cada vez mais intensas e acontecendo de forma rápida, que atingiu o estado do Rio Grande do Sul (RS) em 2024 evidencia ainda mais a necessidade e importância de um olhar sobre a problemática climática, com a elaboração e, sobretudo, a implementação de políticas públicas e ações de enfrentamento da crise climática global, atuando sobre os impactos impostos localmente aos territórios e suas populações. 

Ainda que as mudanças climáticas já estejam acontecendo na prática, o que se percebe é a pouca integração do tema (ou até mesmo ausência dessa integração) nas políticas públicas, nos instrumentos, nas ações, entre outros, de planejamento e gestão urbanos locais, como é o caso dos planos diretores. O estudo de Rylanneive Teixeira, Zoraide Pessoa e Eric Dias (“As mudanças climáticas no planejamento urbano de Natal/RN”, 2022), ao analisar se e como a questão das mudanças climáticas é incorporada no planejamento urbano de Natal, especialmente durante o processo de revisão do plano diretor local, observou que o tema ainda estava sendo pouco assimilado nessa política pública urbana. Na verdade, o tema ainda continua sendo pouco incorporado na principal política urbana de Natal. 

De um conjunto de 15 capitais brasileiras que não apresentam plano de mudanças climáticas, conforme apontou levantamento desenvolvido pelo Instituto Jones dos Santos Neves (vinculado ao governo do Espírito Santo), Natal está entre elas, contando apenas com uma proposta de elaboração de seu plano local de mudanças climáticas, que ainda não saiu do papel. Essa aparição acontece no Plano Diretor de Natal, regulamentado atualmente pela Lei Complementar nº 208, de 07 de março de 2022; mas sem muitos aprofundamentos, como já sinalizado.  

Mesmo que com poucos ou quase nenhum aprofundamento sobre o tema das mudanças climáticas, nem como se dará o seu processo de formulação de fato, não podemos desconsiderar que existe uma proposta nessa perspectiva e que, para o contexto de Natal, já se trata de algum avanço. Todavia, é preciso desenvolver esse plano e avançar ainda mais na compreensão das mudanças climáticas e na elaboração das políticas públicas locais de planejamento urbano de Natal, como no caso do plano diretor em vigência.  

O processo de revisão desse plano, iniciado em junho de 2017 após 10 anos do plano anterior (de 2007), foi marcado por conflitos de interesses, incluindo econômicos e imobiliários, com baixa capacidade de adesão pela gestão pública local das demandas e necessidades da sociedade civil, que, muitas vezes, tentou contribuir e não teve um espaço de voz e escuta. Especificamente em relação às pautas socioambientais e climáticas da cidade, esse também foi um desafio.  

Importante pontuar, nesse sentido, que é preciso construir um espaço de discussões e debates que proporcione uma participação de “baixo para cima”, com a população sendo ouvida e com poder de decisão nos processos de tomada de decisões políticas. Nesse ano de 2024, teremos eleições municipais, e está na hora das pessoas estarem mais atentas àqueles políticos que possuem a pauta socioambiental e climática como prioritária em suas agendas de governo.  

Os desafios climáticos já são um problema “do agora”, havendo a necessidade de uma vontade política alinhada às questões climáticas, o que ainda é pouco comum como apontam Rylanneive Teixeira e Zoraide Pessoa em artigo (“Planejamento urbano e adaptação climática: entre possibilidades e desafios em duas grandes cidades brasileiras”, 2021) desenvolvido para o contexto das cidades de Natal e Curitiba. Outro estudo, no qual Rylanneive e Zoraide contribuíram para o contexto de seis capitais brasileiras, incluindo Natal, sob a liderança de Gabriela Di Giulio (“Bridging the gap between will and action on climate change adaptation in large cities in Brazil”, 2019), apontam que a ausência de vontade política compromete a incorporação e efetivação do tema das mudanças climáticas no planejamento e na gestão urbanos locais.  

O planejamento urbano, por meio do plano diretor local, é uma importante ferramenta para a incorporação e efetivação da questão das mudanças climáticas na governança urbana local, na medida em que consiste em uma política intersetorial (ou seja, que tem o papel de dialogar e integrar os mais diversos setores) para pensar, construir e efetivar, particularmente, processos de adaptação climática.  

A ocupação de novos gestores nos cargos de Executivo e Legislativo municipais de Natal pode, quem sabe, mudar ou fortalecer um planejamento urbano local, além de tudo, direcionado e preocupado com a crise climática global. Com essas eleições, pelo menos o que se espera, de uma forma bem otimista, é que haja uma mudança comportamental da sociedade, incluindo dos atores políticos e gestores, para inserção da questão climática no planejamento e na gestão urbanos de Natal e outras cidades.  

A partir disso, outros caminhos podem ser construídos e alcançados, como efetivar a elaboração do plano local de mudanças climáticas de Natal que foi proposto no plano diretor em vigor; mas que as ações e medidas apresentadas nesse plano sejam, de fato, colocadas em prática em uma perspectiva de abordagem tanto da mitigação das emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) quanto da adaptação aos impactos climáticos locais em curso. Para isso, é necessário que haja um planejamento estratégico-governamental e um orçamento voltados ao tema, com um fundo municipal climático, porque, com isso, a gestão pública local passa a ter mais próximas suas ações em prol mudanças climáticas. 

Enfim, são inúmeros os desafios e obstáculos para a incorporação da questão climática nas políticas públicas e ações de planejamento urbano de Natal, porém espera-se que os novos políticos e gestores eleitos ou aqueles que continuarão com mandatos percebam a necessidade urgente de incorporação e efetivação de medidas frente à crise climática. Gerir uma cidade em um contexto de impactos severos e drásticos das mudanças climáticas é um grande e complexo desafio; mas é preciso e urgente para a promoção de espaços adaptados, resilientes e sustentáveis. 

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