Codevasf de Rogério Marinho superfaturou asfalto no RN e mais 9 estados

Durante a gestão do senador potiguar licenciado Rogério Marinho (PL) a frente do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional (MIDR), a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba – ligada ao Ministério) superfaturou o preço do asfalto em, pelo menos, dez estados: Amapá, Ceará, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Sergipe, Tocantins, Piauí e Pernambuco,

Os dados estão no relatório da Controladoria-Geral da União (CGU), publicado nessa última sexta (26). Ex-ministro de Bolsonaro, Marinho ficou à frente do (MIDR) e, consequentemente, da Codevasf até março de 2022. Os trabalhos de campo nos locais citados foram realizados entre 25/05/2022 e 21/10/2022. Porém, os documentos analisados pela fiscalização abrangem, também, período anterior a essas datas.

Da amostra de 24 contratos de obras tratadas no Relatório nº 1190310, pelo menos 15 apresentaram problemas, ou seja, 62,5% da amostra. Entre outros pontos, a fiscalização da CGU avaliou a utilização de Sistema de Registro de Preços (SRP) para contratação de obras de pavimentação asfáltica

No Rio Grande do Norte, foram analisadas amostras de obras realizadas em Tangará, Lajes Redondas, Campo Redondo, Jaçanã, Santa Cruz, Lagoa Nova, Parelhas, Currais Novos e Lajes Pintadas.

De maneira geral, os fiscais identificaram falta de critério para definição das áreas beneficiadas diante da ausência de documentação comprobatória. Alguns municípios foram beneficiados com o asfaltamento de uma única rua, enquanto outros com seis e, alguns, com apenas alguns trechos de rua.

Santa Cruz, por exemplo, teve mais de dez mil metros quadrados asfaltados, enquanto Parelhas teve 18 mil, sem que tenha sido apresentada qualquer justificativa para essa diferença.

Também foi verificado que em alguns locais estava prevista a colocação de asfalto que, ao final da contagem, acabou não aparecendo. Foi o caso de Tangará, onde a rua Sebastião Ferreira Lima constava na lista das que receberiam asfalto, mas na medição final não foi encontrada. Por outro lado, foi encontrada na medição o “Pátio da rodoviária” e respectivas baias de 01 a 04, assim como um “trecho 02” da rua Assis Lopes, que não constavam nos documentos anteriores.

Fato semelhante ocorreu em São Tomé, que possuía previsão de asfaltamento da rua “Alto Paraíso”, além de outras três vias, que não foram mais encontradas na medição final. Em seu lugar, foram identificadas as ruas “José Lopes Pereira” e “Travessa XV de Novembro” (a Rua XV de Novembro também figurou na medição).

Outro fato que chamou a atenção dos fiscais da CGU no exame dos diários de obra foi o relato de que ruas foram acrescentadas por políticos da região indicados por deputados estaduais e não pelos prefeitos dos municípios, conforme o esperado.

Diário de obra de janeiro de 2022 revela influência de deputados em decisões I Imagem: reprodução relatório CGU

Além disso, planilhas de obras não foram totalmente preenchidas. Em alguns casos há falta informação, em outros, não é possível distinguir se os serviços foram iniciados ou finalizados, e também há registros repetidos de uma mesma obra. Em cidades como Lagoa Nova e Parelhas, mesmo nas vias mais extensas, não há indicação da quantidade do serviço executado.

Menos asfalto do que o previsto

Pelo contrato, caberia à Codevasf fazer o controle sobre as obras, seja de quantidade ou qualidade do material utilizado. Porém, a estatal não fiscalizou, nem a empresa contratada por ela, a Engefort, apresentou espontaneamente uma prestação de contas.

Em resposta à CGU, a Codevasf apresentou documentos para comprovar que cobrou da empresa contratada esclarecimentos/providências quanto à execução de camadas asfálticas com espessuras inferiores aos 3,5 cm previstos em projeto.

A empresa, por sua vez, apresentou material para comprovar que não havia asfalto mais fino do que o previsto em contrato. Porém, a extração desse material aconteceu sem qualquer acompanhamento, inclusive, da própria Codevasf. Com isso, segundo a CGU, não é possível saber se o material apresentado foi realmente retirado das obras. Isso ocorreu na Rua João José de Oliveira Neto, em Parelhas, e nas Ruas VX de Novembro e Alto do Paraíso, no município de São Tomé.

Outro agravante apontado pela CGU é que a estatal não seguiu regras básicas da engenharia na contratação de serviços, como a exigência do registro da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), obrigatório para prestação de qualquer serviço na área. O documento foi apresentado apenas dez meses após o início da obra.

O relatório da CGU ainda revela que as medições realizadas pelos técnicos da Codevasf foram executadas de maneira errada, efetuando medidas de espessuras das camadas asfálticas só nas bordas das vias, com uso apenas de régua e trena, sem paquímetro. Essa medição é importante porque interfere no valor que será pago pela camada asfáltica efetivamente aplicada.

Imagem: reprodução relatório CGU
Imagem: reprodução relatório CGU

A espessura do asfalto também foi fiscalizada na Rua XV de Novembro. Tanto com a técnica considerada errada da Codevasf, quanto com utilização de paquímetro, a fiscalização detectou espessuras que variavam entre 2,5 cm e 3,5 cm de asfalto, sendo apenas este último valor previsto em contrato.

Já as medições na Dr. Borges de Oliveira, onde a camada asfáltica foi implantada sobre paralelepípedo, também variaram entre 2,5 cm e 3,5 cm de asfalto. Como a aplicação ocorreu sobre paralelepípedo, a espessura poderia até ser considerada como regular, porém, a fiscalização identificou outros problemas, como acabamento mal feito, áspero e desnivelado, com trincas e fissuras. Em alguns pontos a camada de asfalto é tão fina, que é possível visualizar o contorno das pedras.

No município de Lagoa Nova, na Av. Silvio Bezerra de Melo, o asfalto já está deteriorado nas áreas de esquinas, o que dificulta o tráfego de veículos.

Imagem: reprodução relatório CGU
Asfalto fino permite visualizar contorno de paralelepípedos e até asfaltos recentes apresentam trincas I Imagem: reprodução relatório CGU

Superfaturamento

Numa fiscalização de campo realizada nos dias 17 e 18 de agosto de 2022, os fiscais detectaram que a não utilização de equipamentos corretos, como rolos do tipo pneumáticos autopropulsionados, que deixaria o asfalto regular e sem desníveis, resultou numa série de irrregularidades:

“Percebeu-se marcas características no acabamento superficial da camada asfáltica de algumas vias, incompatíveis com a utilização de rolos do tipo pneumáticos autopropulsionados (imperfeição no alisamento superficial, rugosidade/aspereza mais acentuadas nos locais mais fundos etc.). Uma das principais características da utilização do rolo compactador de pneu em pavimentação asfáltica é fornecer uma qualidade de acabamento superficial mais fina, sem rugosidade, excessiva que pode ser observada nas fotos adiante (“selar o pavimento”, como se diz na prática de obra), proporcionando mais conforto ao usuário”, traz um trecho do relatório da Controladoria-Geral da União.

Máquina utilizada nas obras de
pavimentação não se enquadra na categoria ‘rolo misto’ I Imagem: reprodução relatório CGU
Equipamentos que deveriam ser utilizados na obra I Imagem: reprodução relatório CGU

Os fiscais da CGU observaram que nos relatórios fotográficos realizados pela Engefort, empresa contratada pela Codevasf para realizar as obras, sempre aparecem imagens do rolo de cilindro liso realizando esses serviços e nunca o equipamento rolo de pneu que durante as medições as execuções das camadas asfálticas. As imagens foram registradas em Santa Cruz (1ª medição), Tangará (2ª medição), Laje Pintada (3ª medição), Jaçanã (4ª medição), Currais Novos (5ª medição) e Parelhas (5ª medição).

Em resposta, a Codevasf afirmou ter sido usado um “rolo Misto” na obra. Porém, essa opção está em desacordo com a planilha de custos e não consta no projeto recebido pela Codevasf. A mudança tornaria o serviço mais barato, ou seja, a Codevasf pagou por um serviço que não recebeu:

Vale salientar que na composição de custo unitário desse serviço o preço unitário demonstrado é de R$ 200,78, por tonelada, estando incluso nela o preço da utilização do equipamento rolo compactador de pneu. Excluindo-se o preço desse equipamento da composição o seu valor fica reduzido de R$ 1,35 por tonelada, ou seja, o seu preço inicial fica reduzido a R$ 199,43, por tonelada”, traz outro trecho do documento.

Imagem: reprodução relatório CGU

O produto dessa diferença (R$ 1,35) pela quantidade total desse serviço contratado (16.566,12 toneladas) é R$ 22.364,20 (a preço inicial contratado), caracterizando superfaturamento atinente ao serviço contratado e que não vem sendo executado”.

Prazo desrespeitado

O prazo original de vigência do contrato era de um ano, com início em 23.06.2021 e fim em 22.06.2022. Porém, em resposta à solicitação de auditoria recebida em 06.06.2022, a poucos dias do fim da vigência contratual, a Codevasf forneceu cronograma atualizado do contrato, com um período adicional de 300 dias, o que resultou em um 1º aditivo. Os 12 meses de obra custaram R$3.713.574,47, mas apenas 13,89% do serviço havia sido executado.

Conclusão

O relatório foi realizado com a ajuda de uma empresa especializada na análise da qualidade de asfalto. Ao todo, foram avaliadas obras em 12 estados, sendo que em 10 foram identificadas as irregularidades.

Na avaliação dos técnicos da CGU, o desperdício de dinheiro público estão não só no superfaturamento dos serviços contratados, mas no menor tempo útil das obras, que exigirão manutenção em menor tempo do que deveria.

A estimativa da CGU, até o momento, é que a não observância aos critérios exigidos pelas normas tenha causado um prejuízo de R$ 7,3 milhões aos cofres públicos.

O outro lado

Ao jornal Estadão, a Codevasf informou que:

1. Atua em permanente cooperação com órgãos de fiscalização e controle. Apontamentos e recomendações desses órgãos são observados pela Companhia para fins de controle e contínuo aperfeiçoamento de procedimentos;

2. Obras que apresentem imperfeições ou inconformidades são objeto de notificação às empresas responsáveis, com vistas à correção. Todas as obras contratadas pela Codevasf devem atender a requisitos de qualidade estabelecidos em contrato;

3. Divergências eventualmente existentes entre faturas apresentadas por empresas contratadas e serviços efetivamente executados são igualmente objeto de notificação a essas empresas, para fins de ressarcimento do faturamento indevido.

Saiba +
Estatal que foi comandada por Rogério Marinho tem obras paradas, superfaturadas e com asfalto “movediço”
Estatal sob responsabilidade de Rogério Marinho não consegue comprovar obras do orçamento de R$ 3 bilhões
MPF vai investigar obra paga com orçamento secreto que beneficia Rogério Marinho
Rogério Marinho usa dinheiro público de orçamento secreto para construir mirante que beneficia terreno de sua propriedade
Rogério Marinho, no último dia como ministro, fala como pré-candidato, mas amarga rejeição

The post Codevasf de Rogério Marinho superfaturou asfalto no RN e mais 9 estados appeared first on Saiba Mais.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.