Grupos de pesquisa, núcleos e laboratórios acadêmicos da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) e grupos da sociedade civil se uniram em um Manifesto de Preocupação com a proposta de instalação de um Complexo Fotovoltaico no Parque Nacional da Furna Feia, em Mossoró, segunda maior cidade do RN. Através de estudos de impactos ambientais, os grupos chegaram a conclusão que a construção pode impactar uma área de 265 hectares do Parque e prejudicar a fauna e flora do local.
O Complexo Fotovoltaico Sereno é um parque de energia solar que está previsto para ser instalado na zona de amortecimento do Parna Furna Feia, um dos mais importantes da região entre Mossoró e Baraúna. O problema é que essa área corresponde uma região de mata nativa e responsável por abrigar dezenas de espécies de plantas e animais ameaçados de extinção. Em nota conjunta, os grupos explicaram que a proposta é preocupante porque a zona de amortecimento é crucial para a conservação de recursos fundamentais para a sustentabilidade local.
“A instalação de um empreendimento desse porte em torno do Parque Nacional da Furna Feia, especialmente em um período crítico como o que vivemos, marcado por queimadas e deterioração da qualidade do ar, é uma afronta à preservação ambiental”, destaca um trecho do manifesto.
A Agência Saiba Mais conversou com Heloíse Almeida, membro Fridays For Future (FFF), Movimento Jovem Socioambiental em Mossoró, uma das organizações que assina o manifesto, que explicou a situação. Segundo a liderança, não significa que não podem existir construções nessa área, mas elas precisam ser de baixo impacto na natureza, nas moradias e na agricultura familiar.
“Fizemos o manifesto após descobrir sobre o empreendimento através dos conselheiros do Conselho Consultivo do Parque da Furna Feia e após a leitura do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental, que passaram pelo ICMBio sem nenhuma deliberação do Conselho do Parque da Furna Feia, e mostram que a usina será instalada numa área de cerca de 200 hectares de floresta, somente a 1,3km de distância do Parque Nacional da Furna Feia, que abriga espécies endêmicas e ameaçadas de extinção da Caatinga.”, explica Almeida.
Outro ponto que chamou a atenção do grupo foi a audiência pública para apresentar o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) que aconteceu sem representação da sociedade civil.
“Descobrimos que a audiência pública para a discussão e apresentação do EIA e do RIMA (etapa obrigatória do processo de licenciamento ambiental) já aconteceu sem ampla participação de representantes da sociedade civil. Foi no dia 11 de janeiro deste ano, quando inclusive, a própria Câmara dos Vereadores estava de recesso.”, denunciou.
A reportagem entrou em contato com a empresa SER Renováveis, responsável pela construção do Complexo Fotovoltaico no Parque, para saber sobre os estudos de impactos ambientais e a posição do grupo sobre o manifesto, mas até o momento da publicação desta matéria, não obteve resposta. O Espaço segue em aberto.
Ausência de estudos locais
Outro fator denunciando pelas entidades foi a ausência de estudos sobre a interação da obra com a fauna e a flora local, especialmente os impactos nas presenças de morcegos, avifaunas, fauna de cavernas, peixe-anual, rotas migratórias, impacto de supressão vegetal, número de aroeiras presentes na área, desmatamento, aumento de temperatura local e o impacto na captura de carbono.
Outro ponto a ser considerado é que, em função da mudança na cobertura do solo, poderá ocorrer uma alteração na qualidade da água e a quantidade da recarga do aquífero Jandaíra, que deve ser reservada para garantir uma boa qualidade desse recurso. O aquífero é amplamente utilizado na agricultura local e no abastecimento doméstico.
A nota em conjunto ainda destaca que projetos dessa natureza vão na contramão da Política Estadual de Convivência com o Semiárido (LEI N° 10.851, DE 20 DE JANEIRO DE 2021).
“Ressaltamos que existem inúmeros terrenos em nossa região que já foram devastados e não possuem mais vegetação, os quais poderiam abrigar usinas fotovoltaicas sem comprometer áreas de floresta de caatinga tão importantes quanto as do entorno do Parque. A preservação dessa área é fundamental para a sobrevivência das espécies que ali habitam e para a manutenção do equilíbrio ecológico”, destaca um trecho do manifesto.
Leia o Manifesto completo:
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Parque Nacional da Furna Feia
O Parque Nacional da Furna Feia é uma unidade de conservação brasileira de proteção integral da natureza localizada na Mesorregião do Oeste Potiguar, no Rio Grande do Norte. Tem uma área de aproximadamente 8.494 hectares, distribuída pelos municípios de Mossoró e Baraúna. É administrado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Criado em 2012, contribui para a conservação de 251 cavernas atualmente identificadas, sendo 208 na área da unidade de conservação e outras 43 na zona de amortecimento. Além disso, são 105 espécies de plantas, 176 de aves, 31 de mamíferos, 11 de répteis, um peixe anual e 16 espécies de invertebrados, além de dois sítios arqueológicos.
O Furna Feia tem o objetivo de proteger parte significativa da Caatinga. É responsável por abrigar exemplares do patrimônio espeleológico local, a exemplo da Caverna Furna Feia.
As cavernas são ecossistemas frágeis e delicados, nesses ambientes o fluxo de energia depende do ambiente externo. Nesse sentido, a população local entra como parte fundamental para preservar o meio ambiente e a natureza lhes fornece os meios de ganhar a vida.
A Unidade de Conservação Ambiental também desempenha papel fundamental para a produção agrícola nos municípios de Baraúna e Mossoró, garantindo o abastecimento dos mananciais de águas subterrâneas.
A Agência Saiba Mais já conversou com famílias que vivem da natureza do Parque.
Saiba +: Caatinga: famílias vivem da natureza no Parque Nacional da Furna Feia
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