A luta cotidiana por saúde em Pernambués

Em meio ao dinamismo e à densidade populacional de Pernambués, a atenção à saúde é uma engrenagem vital — embora marcada por lacunas, esperas e soluções improvisadas. A paisagem do cuidado à saúde na região é composta por seis unidades públicas, que buscam dar conta da demanda de milhares de moradores: a UBS CSU Pernambués, CAPS Eduardo Saback, CAPS AD (especializado em álcool e outras drogas), USF Humberto Castro Lima, UBS Edson Teixeira Barbosa e o Pronto Atendimento Edson Teixeira.Essa rede, gerida pela Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab), abarca desde os serviços primários até a atenção especializada em saúde mental. Ainda assim, na prática, a população de Pernambués lida com desafios constantes para acessar um atendimento ágil e completo. É nesse contexto que clínicas populares particulares — espalhadas por diversas ruas do bairro — tornam-se aliadas importantes no complemento aos serviços públicos, oferecendo consultas e exames que o Sistema Único de Saúde (SUS) nem sempre consegue garantir.“Essas clínicas acabam preenchendo uma lacuna”, explica Levi da Silva Caldas, agente comunitário de saúde com 27 anos de experiência no bairro. “Elas oferecem serviços que a unidade de saúde não tem, como exames laboratoriais e consultas com especialistas. Tem coisa que no SUS é mais difícil de conseguir”.A realidade apontada por Levi se reflete no cotidiano de moradores como a dona de casa, Joelma Coutinho Araújo, que prefere usar o serviço público sempre que possível, mas admite as dificuldades. “Eu tenho costume de usar o serviço público de saúde, como consultas, exames e tudo que tenho direito como cidadã. Mas tem muita fila. Estou precisando de exames do ouvido, por exemplo, e é bem difícil de conseguir. Acho que o problema são as vagas, que são poucas”. Para ela, o caminho seria “aumentar o número de médicos e técnicos para atender à população com mais efetividade”.

Pronto Atendimento Dr. Edison Teixeira Barbosa, em Pernambués

|  Foto: Shirley Stolze | Ag. A TARDE

Onde emperra a engrenagem do atendimentoDe acordo com Levi, a maior fragilidade está, como em tantos outros cantos do Brasil, na falta de profissionais suficientes para compor as equipes: “A dificuldade, geralmente, é a ausência de profissionais que completem o quadro de funcionários, para que se possa atender melhor à demanda”. Além disso, a questão da regulação, que afeta o tempo de espera por exames mais complexos e por leitos hospitalares, também pesa: “Quando se trata de regulação, por ser uma rede aberta para todo o estado, acontece a demora no atendimento — seja para exames, seja para internação em UTI”.Apesar das limitações, há nuances que diferenciam os tipos de unidades. O Programa Saúde da Família (PSF), por exemplo, tem uma dinâmica própria. Segundo Levi, a marcação de consultas é feita diariamente para os pacientes cadastrados, e o acompanhamento é contínuo.“A marcação de consultas é feita de forma diária, porque os pacientes já fazem parte do cadastro do programa, que é realizado pelo agente comunitário na residência de cada indivíduo. Por isso, ele funciona de forma diferenciada, enquanto as outras unidades atendem por demanda aberta”.Demanda aberta e pacientes de foraEssa abertura, aliás, não se restringe aos limites do bairro. “Nas outras unidades, sempre há procura de pessoas, inclusive de outros municípios, como Lauro de Freitas e Simões Filho, que conhecem a região e vêm fazer marcação de atendimento médico aqui”, observa Levi. Isso faz com que as filas aumentem e a capacidade de resposta das unidades seja ainda mais pressionada.A agente comunitária de saúde Isabel Cristina da Silva, que atua na USF Professor Humberto Castro Lima há quase 27 anos, detalha como se dá esse processo. Ela explica que, na UBS Edson Teixeira Barbosa — uma das mais requisitadas do bairro —, as marcações de consulta acontecem sempre nos últimos dias de cada mês. “Os usuários têm que chegar cedo para garantir o agendamento da consulta, seja com clínico, seja com ginecologista, seja com pediatra”, relata Isabel.Vacinas, exames e a força das campanhasOutro aspecto fundamental do serviço público de saúde em Pernambués são as campanhas de vacinação promovidas regularmente pela Secretaria Municipal de Saúde. “Geralmente acontece campanha vacinal promovida pelo município para cada tipo de paciente de forma diferenciada — ou seja, para adultos, crianças, adolescentes, gestantes ou para cada tipo de doença específica”, explica Levi.O atendimento laboratorial e de diagnóstico por imagem também segue uma lógica própria. Segundo Isabel, “existe distribuição de senhas para o atendimento do laboratório e de Raio-X”. No entanto, ela destaca um gargalo específico: a escassez de dentistas. “O maior desafio enfrentado pela UBS é a falta de profissionais da odontologia. Esse atendimento só acontece na emergência”, afirma.Mesmo diante das dificuldades, o trabalho das equipes de saúde de Pernambués revela uma rede que se sustenta, em grande medida, pela dedicação de seus profissionais e pela resiliência de seus usuários. As clínicas populares surgem como resposta pragmática da população a um sistema que, por vezes, falha em sua universalidade — e essas soluções, ainda que pagas, muitas vezes são o único caminho viável para diagnósticos e tratamentos em tempo hábil.A articulação entre agentes comunitários e os moradores, por sua vez, mostra que, para além das estatísticas e das estruturas físicas, o que realmente movimenta o cuidado à saúde no bairro é o compromisso diário com o bem-estar da comunidade.Levi, com quase três décadas de atuação em Pernambués, conclui com sabedoria: “Aqui, a gente conhece cada rua, cada casa, cada história. E isso faz toda a diferença no cuidado. A saúde começa pela escuta, pelo olhar atento, e por entender que cada pessoa tem seu tempo, sua urgência. A gente faz o que pode com o que tem. E sempre com esperança de que o serviço melhore”.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.