Mães em greve? Livro infantil debate carga mental e cuidado coletivo

Depois de amanhã, completam-se nove anos que Joaquim saiu do conforto da barriga materna, realizando o sonho da jornalista e escritora Carla Bittencourt de dar à luz uma criança. Quase uma década depois de ter um filho, Carla está trazendo ao mundo a sua contribuição para que os pequenos entendam a complexidade da tarefa de criar um pequeno ser humano, e o quanto outras pessoas podem, e devem, envolver-se nessa empreitada.Em O dia em que as mães entraram em greve, seu quarto livro, a escritora faz uma provocação aos leitores mirins sobre a atenção que precisa ser dada também à figura materna. “Quem cuida dessa pessoa que a gente estabeleceu que cuida de todo mundo?”, questiona Carla.A escritora avalia que ao ler sobre a greve materna os pequenos podem entrar em choque e questionar se suas mães não os amam. E a resposta que eles recebem é que não se trata de uma greve de afeto, mas das tarefas. “Há uma série de trabalhos que são feitos e que ninguém presta atenção. Quando a gente para de fazer, todo mundo repara”, pontua Carla.Os exemplos de tarefas e conhecimentos que deveriam ser de conhecimento de toda a casa mas costumam ser rotulados como afazeres maternos vão desde o lado correto para colocar a fralda no bebê até o controle do uso de celular e demais aparelhos eletrônicos por pré-adolescentes.O título do livro é inspirado no filme Um dia sem mexicanos, que justamente especula sobre o cotidiano nos Estados Unidos, em caso de desaparecimento dos imigrantes latinos, que fazem os trabalhos mais duros naquele país. “Eu penso em todo mundo que é invibilizado. As mães, os trabalhadores domésticos, os imigrantes. A gente só valoriza determinadas pessoas quando elas não estão”, compara a escritora.Carla destaca que é difícil valorizar o trabalho alheio quando se vê apenas o resultado e não o processo de produção. A autora também sublinha que não pretende usar seu livro como um instrumento de guerra à figura paterna. “É uma convocação para que adultos e crianças reflitam sobre como poderia ser uma outra sociedade se houvesse uma divisão justa das tarefas”, afirma a escritora.O livro busca atingir todas as configurações familiares possíveis e não apenas o tradicional universo de pai e mãe. E mesmo quem não faça parte da família de forma direta: “Se todo mundo na sociedade se envolve, pelo bem das crianças, não é só quem tem criança que vai lucrar, é todo mundo”.

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Como exemplo, a autora pontua que uma cidade menos violenta e mais arborizada joga a favor desenvolvimento das crianças, mas ao mesmo tempo é benéfica para o conjunto da sociedade. “Se eu tenho uma creche para deixar meu filho, eu vou poder estudar mais, trabalhar melhor, entregar mais”, pondera Carla.Da mesma forma, a escritora acredita que a sociedade precisa se engajar no bem-estar materno. “Em melhores condições, as mães vão poder sair desse lugar de abdicar das coisas. Quantas mães a gente conhece que foram fazer mestrado, doutorado, e os pais delas é que ficaram segurando a onda?”, questiona a escritora.Carla ressalta, por exemplo, a diferença de tratamento entre o pai e a mãe da criança em uma entrevista para emprego ou em uma saída noturna com os amigos. A mulher sempre é questionada se tem filhos, no primeiro caso, e onde eles estão, no segundo. “Infelizmente, a gente ainda encontra quem diga que isso é mimimi, que nós não somos fortes o suficiente, que no seu tempo era assim”, pondera Carla.A autora destaca ainda que a construção do livro não se baseia em arquétipos de mulheres de esquerda ou de direita. “Vivemos um momento político complicado, mas aqui a política não é vista de forma partidária, mas em termos de políticas públicas”, afirma Carla, com a ressalva de que a história leva em conta as desigualdades sociais do país. “Eu conversei com mães que não têm perfil militante e elas disseram que queriam aderir à greve”, conta a escritora.SensibilidadeO livro foi produzido em parceria com a ilustradora Aline Terranova, também mãe, que classificou esse trabalho como uma experiência muito especial. “Eu queria que as imagens transmitissem não só o humor da história, mas também toda a sensibilidade que existe por trás desse gesto das mães, de dizer basta de uma maneira amorosa, mas firme”, afirma Aline.A ilustradora explica que procurou criar cenas leves e divertidas, mas que também mostrassem o cansaço, a sobrecarga e a importância da união entre mães e filhos. “A estética que escolhi tem muito dessa mistura: cores vibrantes, pinceladas orgânicas, composições que respiram”, declara Aline, para quem a greve é, no fundo, um pedido por mais espaço, mais cuidado, mais parceria.Editado pela Caramurê Publicações, O dia em que as mães entraram em greve será lançado no próximo dia 10, véspera do Dia das Mães, às 14h, no Café Caramurê (Comércio). O pré-lançamento foi dia 30 de abril, durante a III Festa Literária do Gira Girou.

Serviço

Lançamento
Livro: O dia em que as mães entraram em greve, de Carla Pinto Bittencourt
Data: 10 de maio (sábado)
Horário: 14h
Local: Caramurê Café, Arte e Livros – Doca 1, Comércio – Salvador/BA
Para quem: Crianças, famílias e educadores
Atividades: Contação de história + Ato político com cartazes e faixas feitos por crianças e adultos

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