
Ainda pouco conhecida, a colina traz diversos benefícios para a saúde em várias fases da vida. Quais são esses efeitos, qual a quantidade necessária e onde encontrá-la para consumo?
A colina foi relacionada ao aumento do desempenho cognitivo e à redução da ansiedade, entre outros efeitos benéficos.
Getty Images/Serenity Strull/BBC
Talvez você ainda não tenha ouvido falar da colina. Mas estudos demonstram que ela é fundamental para a nossa saúde, em várias etapas da vida.
A colina não é vitamina, nem mineral. É um composto orgânico vital para o funcionamento saudável do sistema nervoso humano.
Existem, agora, novas evidências que demonstram que o aumento do consumo de colina pode trazer diversos efeitos poderosos. Eles variam desde o aumento do desempenho cognitivo até a proteção contra distúrbios do desenvolvimento neurológico, incluindo o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e a dislexia.
O nutriente também parece desempenhar papel significativo no neurodesenvolvimento humano.
Em um estudo, mães que tomaram suplementos de colina durante a gravidez deram à luz bebês com maior velocidade de processamento de informações, o que é uma medida do funcionamento cognitivo saudável.
Os cientistas afirmam que a colina é um nutriente maravilhoso, que foi imensamente subestimado.
Mas de onde vem a colina? E será que estamos conseguindo quantidade suficiente desta substância?
Nutriente fundamental
Todas as células do nosso corpo contêm colina, segundo a professora de ciências da saúde e da nutrição Xinyin Jiang, do Brooklyn College em Nova York, nos Estados Unidos.
A colina é um nutriente “essencial”, ou seja, nós precisamos dela para nossa saúde. Mas o corpo humano não a produz em quantidade suficiente. Por isso, precisamos conseguir parte da colina de que necessitamos na alimentação.
Neste ponto, ela é similar aos ácidos graxos ômega-3. Mas, na realidade, ela está mais próxima do complexo vitamínico B, segundo a escritora de ciências Emma Derbyshire, fundadora e CEO (diretora-executiva) da consultoria Nutritional Insight.
A colina pode ser encontrada principalmente em alimentos de origem animal, como carne, ovos, peixe, frango e leite. Ela também está presente em amendoins, feijão-vermelho, cogumelos e crucíferas, como brócolis. Mas os alimentos de origem animal costumam conter mais colina do que as fontes de origem vegetal.
O ser humano precisa de colina para inúmeras funções do corpo, incluindo a função hepática. A falta de colina pode causar uma série de problemas.
“A colina auxilia no transporte de gordura do fígado”, explica Jiang”. “E, quando uma pessoa apresenta deficiência, ela pode ter fígado gorduroso.”
A soja é uma rica fonte de colina de origem vegetal. Ela contém 120 mg de colina por 100 g de produto
Divulgação
A colina também ajuda o corpo a sintetizar fosfolipídios, que são o principal componente das membranas celulares do nosso corpo. A deficiência do nutriente pode prejudicar a expressão dos genes envolvidos no processo de multiplicação celular.
Durante o desenvolvimento do feto, a deficiência de colina pode ser particularmente prejudicial, pois ela inibe a proliferação celular no cérebro.
O papel da colina no cérebro é fundamental. Na verdade, ela é principalmente um “nutriente cerebral”, segundo Derbyshire.
Ela é necessária para que o nosso corpo produza acetilcolina, que é um neurotransmissor que emite as mensagens do cérebro para o corpo através das células nervosas. A acetilcolina desempenha papel importante nas células nervosas cerebrais, que são necessárias para nossa memória, pensamento e aprendizado.
Em um estudo envolvendo cerca de 1,4 mil participantes com 36 a 83 anos de idade, os pesquisadores concluíram que pessoas com maior ingestão de colina apresentaram tendência a demonstrar melhor capacidade de memória. Além disso, o consumo de colina na meia-idade pode ajudar a proteger o cérebro.
A colina é frequentemente incluída como ingrediente em suplementos conhecidos como “nootrópicos” – um grupo diverso de substâncias que algumas pessoas acreditam que pode melhorar o nosso aprendizado e a memória.
Por outro lado, a deficiência de colina foi associada a doenças neurodegenerativas, como o mal de Parkinson e Alzheimer.
A colina também pode influenciar o cérebro em relação à nossa saúde mental. Um estudo concluiu que o aumento do consumo de colina foi associado a menores níveis de ansiedade. E, em outro estudo, a maior ingestão de colina na alimentação foi relacionada à redução do risco de depressão.
O consumo adequado de colina também pode trazer diversos outros benefícios. Pesquisas em camundongos concluíram que a colina pode ajudar a reduzir os níveis de homocisteína, um aminoácido que pode aumentar o risco de doenças cardíacas.
Altos níveis de homocisteína também podem estar relacionados à osteoporose. E pesquisas descobriram que pessoas com maior ingestão de colina na alimentação costumam ter densidade óssea mais alta, o que é um indicador de ossos fortes e saudáveis, com menor risco de fraturas.
“A colina, potencialmente, pode ter efeito contra a perda óssea”, afirma a pesquisadora Øyen Jannike, do Instituto de Pesquisas Marinhas da Noruega. Ela estudou a relação entre a colina e a saúde dos ossos.
Este efeito pode se dever, em parte, à homocisteína, mas também ocorre porque a colina é uma estrutura essencial das nossas membranas celulares, segundo Jannike.
Os primeiros 1 mil dias
Sabe-se que os dois primeiros anos de uma criança são fundamentais para o seu desenvolvimento – e que a alimentação da mãe durante a gravidez e a amamentação exerce grande influência neste aspecto.
Estudos demonstram que a colina detém importância vital para o desenvolvimento do bebê no útero. E os bebês nascem com três vezes mais colina do que suas mães, o que, segundo Derbyshire, demonstra como a substância é importante nesta etapa da vida.
Um estudo concluiu que pessoas que consomem ovos costumam ingerir cerca de duas vezes mais colina do que as demais
Eduardo Rodrigues/Estadão Conteúdo
Diversos estudos concluíram que o fornecimento de colina no útero está correlacionado aos resultados cognitivos do bebê. Seus benefícios podem persistir por anos, influenciando o desenvolvimento da criança.
Um estudo descobriu que bebês de mulheres com maior ingestão de colina na alimentação durante o segundo trimestre de gravidez (da semana 13 à 28) atingiram melhores resultados em um teste de memória de curto e longo prazo realizado aos sete anos de idade.
Outras pesquisas chegam a indicar que o consumo insuficiente de colina durante a gravidez poderá estar ligado à incidência de TDAH entre as crianças.
“Estamos observando muito mais [incidência de] TDAH e dislexia nas escolas e parte delas é genética”, explica Derbyshire. “Mas também é possível que, no útero, eles não estejam recebendo nutrientes importantes.”
“Estão ocorrendo estas mudanças muito sutis do neurodesenvolvimento, que os afetam posteriormente. Estamos, agora, tratando dos resultados.”
Jiang estudou a relação entre o desenvolvimento cerebral e o fornecimento de colina durante a gravidez e a amamentação.
“Em estudos com animais, quando a mãe tem maiores níveis de colina, o desenvolvimento cognitivo da ninhada é melhor”, afirma ela. “Estamos começando a encontrar resultados similares em estudos humanos, embora com algumas diferenças.”
Estamos ingerindo colina suficiente?
A Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA, na sigla em inglês) estabeleceu recomendações para a ingestão de colina: 400 mg para adultos e 480 mg e 520 mg para mulheres grávidas e lactantes, respectivamente.
Nos Estados Unidos, o Instituto de Medicina (IOM, na sigla em inglês) estabeleceu recomendações para a ingestão adequada de colina pela primeira vez em 1998: 550 mg por dia para os homens e 425 mg por dia para as mulheres; ou 450 mg durante a gravidez e 550 mg durante a amamentação.
Um ovo contém cerca de 150 mg de colina. Já um peito de frango contém cerca de 72 mg e um punhado de amendoins contém cerca de 24 mg.
Em 2017, a Associação Americana de Marketing (AMA, na sigla em inglês) também destacou que os suplementos vitamínicos pré-natais devem conter teores de colina “baseados em evidências”.
Alimentando o cérebro
Em 2020, uma análise de 38 estudos com animais e 16 com seres humanos concluiu que a suplementação de colina ajuda o desenvolvimento cerebral. Mas apenas um estudo, atualmente, demonstra forte ligação entre a colina e o aumento das funções cognitivas.
O trabalho não define a quantidade ideal de suplementação, mas afirma que a maior parte dos estudos com seres humanos utiliza suplementos que fornecem até 930 mg de colina por dia (o equivalente a cerca de seis ovos de galinha), sem relatos de efeitos adversos.
Pode também haver pessoas que precisam de mais colina do que as quantidades diárias recomendadas, segundo Øyen Jannike – incluindo mulheres pós-menopausa, por exemplo, que possuem níveis mais baixos de estrogênio, e pessoas com esteatose hepática – a doença do fígado gorduroso.
Também sabemos, segundo Derbyshire, que as diferenças genéticas entre uma pessoa e outra fazem com que algumas pessoas possam precisar de maior quantidade de colina.
Emma Derbyshire já atuou como consultora de organizações britânicas como o Painel Consultivo da Carne, a empresa Marlow Foods (Quorn), o Serviço de Informações sobre Suplementos à Saúde e o Serviço Britânico de Informações sobre Ovos, entre outras.
O amendoim contém altos níveis de colina, com 61-66 mg por 100 g de manteiga de amendoim
Reprodução/TV Globo
Quando ingerimos alimentos que contêm colina, a substância é absorvida pelo sangue com muita facilidade, segundo Jiang. Isso facilita o consumo de colina em quantidade suficiente.
Mas diversos estudos demonstram que, para muitos de nós, não é o que acontece. Uma pesquisa concluiu que apenas 11% dos americanos adultos consomem a quantidade diária recomendada.
Os ovos são uma das maiores fontes de colina na alimentação. E existe certa preocupação de que as pessoas que decidem adotar a dieta vegana possam não conseguir este nutriente na quantidade necessária, embora haja muitas fontes vegetais da substância e suplementos de colina largamente disponíveis nos países desenvolvidos.
Um estudo concluiu que as pessoas que comem ovos ingerem quase duas vezes a quantidade habitual de colina, em comparação com as demais.
Esta conclusão levou os pesquisadores a concluírem que o consumo da quantidade diária adequada de colina é “extremamente difícil” sem o consumo de ovos ou suplementos.
Mas a recomendação da FSA, de consumir 400 mg de colina por dia, pode ser atingida pela maioria das pessoas, se a alimentação for cuidadosamente planejada, explica Xinyin Jiang.
Algumas fontes veganas de colina incluem o tofu (28 mg de colina por 100 g), manteiga de amendoim (61-66 mg por 100 g) e soja (120 mg por 100 g).
Pessoas com receio de não consumirem colina em quantidade suficiente podem recorrer aos suplementos diários, explica Jannike. Paralelamente, segundo ela, precisamos de mais pesquisas com seres humanos e animais para compreender melhor os mecanismos responsáveis por alguns dos benefícios da colina à saúde.
“Os médicos estão se conscientizando cada vez mais sobre [a colina]”, afirma Derbyshire.
Muitas vezes, a colina parece ser um tanto ignorada, mas ela espera que o nutriente comece a ganhar mais atenção em breve.
Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Innovation.
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