Em diversas regiões do Rio Grande do Sul, a madrugada da Sexta-Feira Santa é marcada por uma tradição centenária: a colheita da marcela, uma planta medicinal reconhecida por seus benefícios terapêuticos e sua simbologia religiosa.
Um dos guardiões dessa tradição é Júlio Adão Mauman, de 65 anos, morador da comunidade de Alto Convento, em Lajeado. Desde os 10 anos, ele segue o ensinamento herdado de sua mãe: levantar antes do amanhecer, tomar um chimarrão e caminhar pelas lavouras com seu cão Pelé para colher a planta ainda coberta pelo orvalho da manhã.
“A marcela tem que ser colhida antes do sol nascer. É nesse momento que ela está mais abençoada, mais forte”, conta Júlio, que faz questão de escolher áreas livres de agrotóxicos para preservar a qualidade da planta.
A fé e o uso medicinal da macela
Considerada símbolo do Rio Grande do Sul, a marcela é utilizada para tratar problemas digestivos, inflamações, infecções oculares e até como ingrediente natural em cosméticos, como xampus clareadores. A crença popular é respaldada por estudos que comprovam as propriedades anti-inflamatórias e digestivas da planta.
“Ela ajuda muito no estômago. Eu uso no chimarrão, faço chás, e sempre colho para doar também. Tem vizinho que não consegue mais sair, então compartilho”, relata o agricultor.
Tradição ameaçada
Apesar do valor cultural e medicinal, a macela tem se tornado cada vez mais escassa. O uso de agrotóxicos e a falta de cultivo sistemático são os principais responsáveis pela diminuição da planta nativa. Especialistas alertam ainda para os cuidados na colheita: evitar locais próximos a rodovias, onde há contaminação por poluentes, e não enterrar demais as sementes, já que a planta precisa de bastante luz solar.
Preparação e armazenamento
Após a colheita, Júlio deixa as plantas secando à sombra por alguns dias, retira as flores e as guarda em potes de café reutilizados. A quantidade colhida é suficiente para uso durante todo o ano, até a próxima Sexta-Feira Santa.
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