Ao passar pelo Campo Grande, quem lê talvez não tenha observado um simples portão localizado ao lado do imponente Palácio da Aclamação. Ao abri-lo e descer os degraus, vai dar de cara com um espaço conhecido como Quintal do Raso da Catarina. Aberto desde 1979, o Quintal, como é mais conhecido, tem história na boemia soteropolitana.Foi com a intenção de compreender o processo de construção do espaço e ouvir as histórias do lugar que o ator e cineasta Dody Só resolveu realizar o documentário O Senhor do Raso da Catarina. O filme, que foi lançado no ano de 2023, será exibido hoje, às 19h30 na sala Walter da Silveira, localizada nos Barris. O documentário já passou pelo Cine Glauber Rocha e Teatro Martim Gonçalves.O documentário resgata a história do Quintal do Raso da Catarina, tendo como eixo central a figura de seu criador, Antônio Franco Barretto, que, até 1993, comandou o que ficou conhecido como o bar mais libertário da cidade.A narrativa se entrelaça com as angústias, esperanças, sonhos e frustrações de uma geração, ao mesmo tempo em que registra um capítulo vital da história contemporânea da Bahia.Além de diretor e roteirista do filme, Dody só também é um frequentador assíduo do espaço e foi justamente enquanto visitava o bar que teve a ideia de fazer um documentário. “A ideia surgiu da minha convivência com o ambiente, e estar frequentando, de estar começando a fazer teatro e viver naquele ambiente extremamente efusivo onde tudo acontecia”, explica Dody.Memória e resistênciaSe engana quem pensa que o bar funcionava apenas como um lugar de lazer. Nos anos 1980, o local era um dos mais ativos centros de resistência e sobrevivência cultural da Salvador, em contraponto à postura anticultural do regime militar. Artistas, jornalistas, estudantes, intelectuais, profissionais liberais e políticos, sobretudo de esquerda, se reuniam nas mesas espalhadas pelo Quintal, localizado na área externa da casa de estilo colonial que até hoje abriga a sede da Associação dos Engenheiros Agrônomos.Quando resolveu fazer o documentário, o cineasta conversou com o então dono do bar, Antônio Franco Barreto. O proprietário não só gostou da ideia, como contribuiu durante todo o processo de construção do filme. “Franco achou a ideia maravilhosa, aí eu construí o roteiro, mostrei pra ele e fizemos algumas alterações. Ele sugeriu convidar alguns amigos para eu entrevistar e foi assim que conseguimos vários que ele sugeriu, outros não conseguimos. Esse foi o início de tudo”, conta Dody.Apesar da importância de registrar a história do espaço, Dody explica que foi desafiador finalizar a obra sem acesso a recursos, mas isso não fez com que ele desistisse do projeto. “Fomos batendo em várias portas. Tivemos ajuda de vários amigos. Tivemos ajuda da deputada Fabíola Mansur, Péricles Palmeiras e até o próprio Franco Barreto ajudou na produção, explica Dody.Mesmo com o apoio que conseguiu, o cineasta deixa claro que precisou utilizar recursos próprios para finalizar a obra. “Eu também coloquei os meus parcos recursos à disposição do filme, porque a gente queria fazer e esse é o ponto mais importante. O documentário tem isso, ele fica, ele resgata a memória e a memória não pode ser perdida assim”. Afirma DodyCom todos os desafios que envolveram a produção, Dody não abriu mão de conhecer Paulo Afonso, terra natal de Franco, considerada a “capital” do Raso da Catarina. O diretor também fez registros em Piranhas e Canindé do São Francisco, buscando traduzir a essência sertaneja que inspirou a ambientação do bar em Salvador. “Chegando lá, Franco se reconectou com sua cidade e vibramos muito! Passamos alguns dias por lá e talvez tenha sido o momento de poder fazer um link, mostrar dois lados e tentar fazer com que as pessoas compreendam que esse filme fala de um homem do interior que cria um espaço em Salvador, com características do interior”. Relata Dody.O diretor garante que o público vai se emocionar e até mesmo se identificar com as histórias dos personagens entrevistados e explica que, apesar dos desafios, conseguiu entregar uma obra digna do seu objeto de investigação.“Busquei fazer o melhor de mim, dentro das condições que me foram apresentadas, e está aí o resultado. Espero que gostem. Ainda hoje eu me emociono vendo algumas cenas e dou risada com as coisas que eu vejo, parece que eu estou vendo pela primeira vez”, conclui Dody Só.Vale ressaltar que a exibição será gratuita.Sessão do documentário ‘O Senhor do Raso da Catarina’ / Hoje, 19h30 / Sala Walter da Silveira (Rua General Labatut, 27 – Barris) / Gratuito*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.
Documentário ‘O Senhor do Raso da Catarina’ tem sessão única
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