‘Sonia Gomes: Barroco, mesmo’ apresenta obras em Salvador

A artista plástica mineira Sonia Gomes realiza, pela primeira vez, uma exposição institucional na Bahia. Intitulada Sonia Gomes – Barroco, mesmo, a mostra está em cartaz no Museu de Arte Contemporânea da Bahia (MAC-BA) desde o último sábado (12) e segue aberta à visitação até o dia 13 de julho.A exposição é realizada em parceria com o Instituto Tomie Ohtake e o Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC) e reúne cerca de 60 obras de diferentes fases da trajetória de Sonia, além de fotografias inéditas da artista em seu ateliê, registradas pela fotógrafa baiana Lita Cerqueira. As peças estabelecem pontes viscerais entre a estética barroca e a poética têxtil e escultórica da mineira.A curadoria da exposição é assinada por Paulo Miyada, diretor artístico do Instituto Tomie Ohtake. A mostra acontece em duas etapas: primeiro em Salvador, depois em Ouro Preto (MG), e, por fim, se reúne em uma única apresentação no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, entre novembro de 2025 e março de 2026.Segundo o curador, a relação de Sônia Gomes com o barroco é antiga e profunda e essa exposição é uma forma de conectar a artista com dois centros simbólicos dessa tradição no Brasil. “Quando concebemos a exposição, vimos a chance de promover um diálogo entre a artista e dois polos centrais da arte barroca no Brasil: Ouro Preto e Salvador. É uma oportunidade para o público dessas cidades conhecer de perto a obra de uma das maiores artistas brasileiras e, ao mesmo tempo, para que a própria Sônia se reconecte com parte da sua história. Esse reencontro pode abrir novos caminhos, inspirar outras pesquisas e criações”, afirma.As obras da artista mineira não copiam formas ou técnicas do barroco, mas incorporam seu espírito: gestos dramáticos, excesso como linguagem, o corpo como símbolo, a tensão entre opostos. É nesse plano simbólico e político que sua arte se inscreve, reativando o barroco como potência de leitura e criação, especialmente nos contextos de Minas Gerais e da Bahia.“A exposição é um conjunto diverso de escalas, materiais e modos de apresentação, que revela a relação de Sonia com a duração, a memória, os materiais, e com uma forma de criação que nunca busca a simetria, mas que convida ao movimento. Suas obras são compostas sempre por fragmentos, por pedaços que vêm de tempos e lugares distintos, mas que se unem em uma única composição”, pontua o curador.Em sua primeira visita a Salvador, Sônia destacou a importância afetiva e simbólica de apresentar sua obra na cidade. “Estar aqui é muito importante pra mim, porque é a minha primeira vez em Salvador. Senti que fui acolhida, abraçada. E essa exposição tem um significado especial, porque é uma forma de mostrar meu trabalho para o Brasil”, disse.Oficina e livroNascida em 1948 em Caetanópolis, Minas Gerais, Sonia iniciou sua carreira artística aos 45 anos, após abandonar o Direito para estudar na Escola Guignard, em Belo Horizonte. Gomes já participou de importantes exposições internacionais, incluindo a Bienal de Veneza em 2015, e possui obras em acervos de instituições como o MoMA, em New York, o Museu Guggenheim Bilbao, na Espanha, e o Centre Pompidou, na França.A programação de abertura da exposição em Salvador no último sábado incluiu a oficina educativa “Palavra-semente”, voltada para famílias e conduzida por Mariana Per, gerente de Educação do Instituto Tomie Ohtake. Houve também o lançamento do livro Sonia Gomes – Assombrar o mundo com beleza (editora Cobogó), organizado por Paulo Miyada. A publicação reúne imagens de obras recentes da artista, além de cadernos de anotações e cartas, revelando detalhes de seu processo criativo. O livro estará à venda no museu durante todo o período expositivo, com lançamento oficial previsto para o dia 25 de abril, em São Paulo.Barroco contemporâneoA proposta da exposição Sonia Gomes: Barroco, mesmo é estabelecer um diálogo entre a produção singular da artista mineira e a tradição barroca brasileira, e esse encontro se dá em diversas camadas, estéticas, históricas, afetivas e políticas. Ao contrário de um gesto decorativo ou meramente temático, Sonia opera uma reinterpretação profunda dos princípios do barroco a partir de uma perspectiva contemporânea e atravessada por suas raízes negras, femininas e populares.“Eu acho que a exposição como um todo é muito importante. E essa, em especial, está muito completa, é a primeira vez que mostro materiais do meu ateliê, que revelam um pouco do meu processo de criação” disse a artista.Nas igrejas, nas esculturas e na arquitetura, o barroco se expressava com dramaticidade, dualidade e espiritualidade. Em Sonia Gomes, esses elementos se reconfiguram: o excesso aparece nos volumes orgânicos de suas esculturas têxteis; a dramaticidade se revela nas dobras, nos fios soltos, nas amarrações que tensionam o espaço; a espiritualidade aparecem nas escolhas de materiais carregados de histórias pessoais e coletivas. “Estamos falando de uma artista que já passou por grandes instituições, no Brasil e no exterior, mas que nunca havia exposto nem em Salvador, nem em Ouro Preto. Isso revela muito sobre como o Brasil ainda conhece pouco de si mesmo” pondera o curador.A artista também trabalha com tecidos reaproveitados, objetos do cotidiano e elementos que remetem ao afeto e à ancestralidade. Segundo o curador, cada obra nasce de um gesto artesanal, muitas vezes improvisado, que remete às tradições de costura passadas de geração em geração entre mulheres negras. Esse fazer, ao mesmo tempo íntimo e político, conecta sua produção à complexidade do barroco, mas subverte sua origem aristocrática, deslocando-o para um território da memória popular e da resistência.“O título da exposição e essa ideia do barroco funcionam como uma provocação… Sim, é uma provocação para que repensemos o barroco, não apenas como um estilo arquitetônico europeu, mas como uma expressão de inquietude, movimento e transformação. Uma linguagem que nasce na Europa, mas ganha uma força singular no Brasil – justamente por estarmos em uma sociedade marcada pela desigualdade, mas também por ser um ambiente de desejo e busca por mudanças” finaliza o curador.Sonia Gomes: Barroco, mesmo / Visitação até 13 de julho, de terça- feira a domingo, das 10h às 20h / Museu de Arte Contemporânea da Bahia (MAC_BAHIA, Rua da Graça, 284, Graça) / Gratuito*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.
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