Editorial – O dólar furado

A imposição de novas tarifas, por parte dos Estados Unidos, abalou o valor da confiabilidade, pilar de sustentação de toda relação comercial, desde a mercearia de bairro e sua freguesia aos contratos das superpotências.Apesar do recuo de 90 dias e outros pontuais, cedendo a pressões de investidores, entre os quais financiadores de sua campanha eleitoral, Donald Trump já pode ser lembrado como o presidente da incerteza.São 600 bilhões de dólares em comércio bilateral sob ameaça, nos jogos diuturnos da geopolítica, produzindo efeito de curto prazo inconveniente para o país causador de dúvidas: sua moeda já não é invicta.O efeito pode não ter sido calculado pelos mentores da abusiva trama de erodir o fundamentalismo de mercado, pois o dólar perdeu parte do seu poder baseado na plena segurança.O índice Bloomberg, termômetro de medição das 10 moedas-fortes, caiu 3%, sinalizando quanto de aventura há nas bravatas de Washington, sob sério risco de entregar as chaves do castelo da economia mundial. Analistas de grandes bancos já utilizam amiúde a expressão “desdolarização” em seus relatórios.Na ilusão de recuo aos australopithecus, ou quem sabe, acreditando nalgum superpoder inventado por ilustradores de desenhos infantis, a Casa Branca vacila ao servir-se de seu desproporcional perfil narcísico.O princípio de realidade, ao desvelar fantasias de onipotência, mostra força no bate-pronto da China, recusando-se vergar à “Tábua de Trump”. Além de adaptarem a justiça aritmética do Talião – olho por olho, taxa por taxa –, os chineses foram muito além, ao anunciarem, com seriedade, a disposição de topar qualquer tipo de conflito contra os EUA.A União Europeia, por sua vez, formada por 27 países, já planejou três datas de retaliação, estendendo até dezembro os contra-ataques econômicos, em um mundo agora contaminado pelo ceticismo geral.
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