
Três pessoas morreram em SP nos últimos dois meses atropeladas na faixa de pedestre. Código determina que os pedestres são sempre prioridade e que quando não há sinalização semafórica, o pedestre deve sinalizar com a mão e tem a travessia priorizada pelo veículo. Em caso de semáforo, mesmo se o pedestre desrespeitar o sinal vermelho, o motorista deve parar. Jovens foram atropeladas na faixa de pedestre na Avenida Goiás
Reprodução/CGE
Em março e abril deste ano, três pessoas morreram e uma ficou ferida após serem atropeladas enquanto atravessavam a rua na faixa de pedestres na Grande São Paulo.
Na última quarta-feira (9) duas jovens foram mortas por um motorista que dirigia em alta velocidade na principal avenida de São Caetano do Sul. Elas atravessavam na faixa de pedestres quando foram atingidas pelo veículo.
Uma câmera mostra que as duas atravessaram a avenida quando o sinal estava vermelho para pedestres. Brendo dos Santos Sampaio, de 26 anos, atropelou as amigas e para a polícia, ele estava acima da velocidade permitida. Brendo foi transferido para o Centro de Detenção Provisória de São Bernardo do Campo, onde vai ficar preso.
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Na segunda-feira (7), uma idosa de 78 anos foi atropelada por um ônibus ao atravessar uma rua na faixa de pedestres na cidade de Cajamar. Por conta da gravidade do acidente, ela precisou ter as duas pernas amputadas.
E em março uma jovem de 17 anos também morreu ao ser atropelada quando atravessava na faixa. Uma câmera de segurança flagrou o momento em que o carro atinge a vítima. É possível ver que, antes de atravessar na faixa, Thalía de Oliveira olha para os dois lados e só, então, cruza a avenida. O motorista fugiu sem prestar socorro. O caso ocorreu em Osasco.
Segundo a Lei nº9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro, independente do semáforo, os pedestres são sempre a prioridade no trânsito.
Veja o que diz o CTB sobre a faixa de pedestre:
O Código de Trânsito Brasileiro determina que os pedestres são sempre prioridade no trânsito e, a partir do momento em que está atravessando na faixa, o veículo deve parar.
“O Código de Trânsito traz um capítulo que fala sobre as regras de circulação e conduta. Lá existe um dispositivo que fala que os veículos de maior porte devem respeitar os de menor porte. Os de menor porte, por sua vez, devem respeitar, inclusive, os veículos não motorizados — e todos esses veículos sempre defendendo a segurança do pedestre. Então, essa é uma regra geral: que os pedestres têm prioridade na segurança do trânsito”, afirma Ademir Rafael dos Santos, Presidente da Comissão de Direito do Trânsito da OAB-SP.
Essas informações constam no capítulo três, Art. 29.
Durante todo o capítulo, a lei define medidas que devem ser tomadas por motoristas para que, obviamente, evite todo ato que possa oferecer perigo ou obstáculos para animais, pedestres e até atrapalhar o próprio fluxo.
Falando especificamente da faixa, segundo Ademir, existem dois momentos em que a travessia deve ser respeitada, tanto de parte do pedestre quanto do condutor:
Quando há somente uma faixa, sem semáforo e uma sinalização específica para isso, o pedestre tem que respeitar a distância: se ele estiver a menos de 50 m da faixa de pedestre, a travessia precisa ser feita na faixa;
Agora quando na situação existe a presença de uma sinalização semafórica para o pedestre, ela precisa ser respeitada e isso também está previsto na lei, ou seja, tem que esperar que seja autorizado a travessia
Porém, “uma vez que o pedestre iniciou a travessia, independente do sinal estar vermelho para ele ou não — o motorista tem que priorizar a segurança do pedestre, que é a regra geral”, completa Ademir.
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Comportamento do pedestre com ou sem sinalização
O código também deixa claro que o pedestre deve respeitar a sinalização semafórica, no capítulo sobre infrações, no Art. 254, entre as determinações, diz que é vetado andar fora da faixa própria, passarela, passagem aérea ou subterrânea e desobedecer à sinalização de trânsito específica.
“Tem uma observação importante a trazer, que há previsão legal também para quem desrespeita — para o pedestre que desrespeita. Inclusive, há uma infração de trânsito para o pedestre que desrespeita a legislação. Porém, na prática, ela não é colocada em atuação. A gente não vê, no dia a dia, os agentes de trânsito fiscalizando os pedestres. Mas há uma previsão legal no Código de Trânsito para isso. No caso, quando ele desobedece à sinalização semafórica, ele está cometendo essa infração do artigo 254, inciso 6, do CTB”, continua.
Defesa da vida
No entanto, a prioridade do código é a defesa da vida, então, a partir do momento que o pedestre inicia a travessia, os carros devem parar para que ela seja finalizada.
“Quando não tem sinaleira. O pedestre aguarda ali. Claro que ele vai verificar as condições de segurança, esticar a mão na via, fazendo um sinal para atravessar e aí o veículo prioriza a travessia sempre. Quando há sinalização semafórica, aí o pedestre já vai respeitar — tanto o pedestre quanto o motorista, né? O condutor vai respeitar a sinalização semafórica.”
“Agora, acontece nos casos, por exemplo, em que não há nenhum veículo passando na via no momento. Aí o pedestre desrespeita a sinalização e está no meio da via, mesmo com o sinal vermelho para ele. Mas, se chegar um veículo, o veículo vai ter que, pela regra geral de segurança do pedestre — por mais que ele esteja cometendo uma infração — priorizar a travessia do pedestre”, conclui Ademir.
Cores dos semáforos
Existe um manual de sinalização do Conselho Nacional de Trânsito, dentro dele, estão as determinações das cores do semáforo.
Do ponto de vista do condutor do veículo: verde significa que o motorista deve seguir, amarelo é um sinal de alerta – informando que deve diminuir a velocidade e estar atento para parar, pois o sinal vai mudar e vermelho é para que pare imediatamente.
Mas segundo Ademir, pela falta de fiscalização, muitas vezes os motoristas acabam aproveitando o sinal amarelo para acelerar e avançar antes do vermelho.
“O cidadão que está conduzindo o veículo, o condutor, tem que reduzir a velocidade, porque é um sinal de alerta para ele: ‘Olha, já vai fechar aqui, toma cuidado que não dá mais tempo. Agora, também não é nenhuma infração de trânsito, não gera nenhuma infração se ele cruzar uma via com o sinal amarelo”, afirma.
O que o código diz sobre homicídio no trânsito?
O Código de Trânsito só acrescenta penas previstas para um tipo de homicídio: culposo na direção de veículo automotor, ou seja, quando não tem a intenção de matar.
No caso da morte das jovens, o boletim de ocorrência foi registrado como homicídio com dolo eventual quando assume o risco, “ao lançar-se em prática de altíssima periculosidade em via pública e mediante alta velocidade (em conduta conhecida por ‘racha’)”. Nesse caso, o motorista responde de acordo com o Código Penal, no Art. 121.
“Existe uma discussão há muitos anos nos sinistros de trânsito, onde uma pessoa que está conduzindo o veículo se envolveu em um acidente com evento morte, se for caracterizado, por exemplo, que ingeriu bebida alcoólica, que estava em velocidade alta, praticando racha ou qualquer coisa desse tipo, os promotores de Justiça têm levado um entendimento de que ele assumiu o risco de acontecer alguma coisa tal como o homicídio. Quando isso acontece, a classificam do crime é desviada do Código de Trânsito para o Código Penal”, afirma Ademir.
“Com isso, existe a possibilidade de a pessoa ser penalizada de uma forma mais severa porque no Código de Trânsito fala sobre detenção de dois a quatros anos. Se fosse no Código de Trânsito, como aconteceu na faixa de pedestre, ele aumentaria de um terço a metade. Já no Código Penal é uma pena mais elevada”, completa.
Nesta quinta-feira (10), a Justiça decidiu que vai manter preso preventivamente o motorista que atropelou as jovens. Segundo o advogado dele, Francisco Ferreira, o motorista contou que seguia entre 60 km/h e 70 km/h, mas que não sabe precisar a velocidade exata.
À Polícia Militar, ele confessou estar “um pouco acima da velocidade” permitida, que é de 60 km/h. O teste do bafômetro constatou que ele não estava bêbado. Depois, ele também foi submetido a uma contraprova junto ao Instituto Médico Legal (IML), mas o resultado ainda não foi divulgado.
Aumento de mortes por atropelamento
A cidade de São Paulo registrou um aumento de 30% no número de mortes por atropelamento se comparado ao mesmo período em 2024. Entre janeiro e fevereiro deste ano, 53 pessoas morreram atropeladas nas avenidas da cidade.
Em 2024, foram registrados 41 casos, 12 atropelamentos com mortes a mais. É o maior número já registrado nos últimos seis anos. Pessoas com mais de 60 anos são as que mais correm perigo ao transitar pelas avenidas da capital.
Para o pesquisador de Engenharia de Transporte na Unicamp Luiz Vicente Figueira de Mello, os casos se repetem e podem ter explicação pela quantidade de distrações no trânsito dos dias de hoje.
“É a distração das pessoas, de não estarem atentas no que estão fazendo, na mobilidade, no deslocamento. Isso contribui significativamente no risco de acidente. O acidente não ocorre porque uma pessoa ficou desatenta e sim o número de pessoas envolvidas naquele acidente”