Goya Lopes no MAM: Okòtò – A espiral da evolução

No dia 8 de abril, os olhares do mundo das artes estarão voltados para o Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM-BA). Nesse dia será inaugurada, em Salvador, uma exposição que a Bahia estava em dívida com uma das suas mais importantes artistas contemporâneas, Maria Auxiliadora dos Santos Goya Lopes, conhecida como Goya Lopes, designer têxtil, artista visual, empresária visionária e bem-sucedida.Essa grande exposição será uma retrospectiva que vai abranger toda a imensa produção artística e profissional de Goya Lopes. Serão expostos nos dois grandes salões expositivos do MAM, além da capela anexa, mais de 100 obras da artista. A iniciativa, coordenação e curadoria é do atual diretor do MAC-BA, Museu de Arte Contemporânea da Bahia, Daniel Rangel e do curador Marcelo Campos.Goya é uma mulher serena, de voz mansa e calma, como só as baianas têm. Um sorriso constante, um raro brilho adolescente nos olhos castanhos que transmitem confiança e fé em seu trabalho que nos conduz ao seu universo criativo e profissional. Goya é oriunda da classe média de Salvador, portanto, teve privilégios que muito a ajudaram em toda a sua carreira profissional.Seus genitores possuíam boa formação escolar, sendo que seu pai era engenheiro formado pela Escola Politécnica da Ufba e funcionário da Petrobrás, onde chegou por mérito ao cargo de superintendente. Tendo realizados vários cursos de especialização na Europa, foi em Paris que Goya descobriu-se e foi descoberta artista, aos 8 anos, por meio de uma professora.Essa professora atenta e sensível identificou precocemente na menina Maria Auxiliadora um talento especial que a diferenciava dos demais colegas, alertando imediatamente os pais da menina. Seus pai e mãe dotados de rara sensibilidade proporcionaram apoio e estímulo ao seu evidente talento com livros de arte fartamente ilustrados, da coleção do Museu do Louvre em Paris, cidade onde moravam à época. Goya conta que os presentes que recebia do pai eram conjuntos de lápis de cor que comprava em suas viagens ao exterior.Arte popular baianaDe volta ao Brasil, Goya continuou seus estudos regulares e após a experiência francesa, seu pai, grande fã e estimulador, mais uma vez entrou em cena contratando uma professora particular, Marisa Gusmão, à época professora da Escola de Belas Artes da Ufba.Ela foi fundamental na vida artística de Goya, na medida em que a norteou quanto a importância cultural e estética da arte popular baiana, com destaque aos elementos decorativos da cerâmica do recôncavo baiano e marajoara, os ex-votos e também os padrões do vestuário de origem africana, presentes em nossa cultura com as cores primárias e intensas.Já cursando Artes Plásticas na Escola de belas Artes da Ufba, o professor Rocha, de História da Arte, observou que Goya tinha um pescoço longo, tipicamente africano, o que a levou a pesquisar acerca da arte africana.Essa forte e rica descoberta foi o embrião geracional do seu estilo. Goya é sem dúvida a precursora desse estilo revolucionário de design no Brasil e quiçá no mundo.Teve grande importância em sua decisão pelo design a sugestão do nosso saudoso professor Romano Galeffi, filósofo e crítico de arte, fundador da cadeira de Estética (Filosofia da Arte), na Universidade Federal da Bahia.Recém-formada em Artes Plásticas pela Escola de Belas Artes (EBA), ganhou uma bolsa de estudos do Governo Italiano de pós-graduação na Università Internazionale dell’arte Florença-Itália.Assim, consultou o professor Galeffi sobre que área que deveria escolher para especialização, tendo o mesmo sugerido que escolhesse a profissão do futuro (nas palavras dele), o Design.O design afro-brasileiro de Goya Lopes, além da sua beleza visual, mais que uma tendência é um potente vetor de da expressão identitária e de resistência cultural.Goya tem como objetivo de artista e designer mergulhar profundamente no patrimônio ancestral da temática de matriz africana e expressar a sua diápora em solo brasileiro.AncestralidadeEvidenciada na medida em que recupera sua ancestralidade, parcialmente colonizada culturalmente, ela a subverte revelando um conjunto sólido de informações que vão além do puro grafismo, porém de costumes, práticas, doutrinas e crenças, por meio de seu desenho limpo e econômico, requintado e distante do folclórico, rico de símbolos, signos e significados.Ela nos oferta um legado cultural que, certamente, será transmitido por gerações de novos designers e artistas visuais, proporcionando a cada dia maior visibilidade, dignidade e continuidade da importância estrutural da cultura africana na sociedade brasileira. E, certamente, ocupando seu devido e digno lugar, assim como dando voz e visibilidade a uma cultura tão rica e presente em mais da metade da população brasileira.Chegamos a ficar confusos ao percebermos que dentro dessa cabeça de mulher aparentemente frágil reside uma usina criativa, serenamente administrada de modo natural, firme e eficiente. Goya é uma daquelas artistas que conseguem lidar com a criatividade, com seu imenso universo interior particularíssimo de sonhos e liberdade imaginativa, inata aos bons artistas, com a capacidade e competência da empreendedora e empresária.À frente de sua geração, ela percebeu a importância da arte popular, da cultura regional e global, como fonte de inspiração na renovação do design têxtil baiano, brasileiro e internacional.VisibilidadeAlém desses importantes aspectos de sua obra, Goya insere-se e oferece visibilidade às mulheres, principalmente negras, de maneira extremamente bela e elegante, resgatando assim sua dignidade, com estilo requintado e sutil. Goya resgata principalmente sua africanidade, sua ancestralidade.Atualmente, Goya Lopes inicia uma nova etapa de transformação, já que suas atividades, enquanto empresária do Design de Moda, estão sendo gradativamente terceirizadas. Está num momento de mudança consciente e planejada de dedicar seu tempo e energia a um trabalho mais pessoal enquanto artista visual, um retorno à sua formação acadêmica. Assim, poderá criar com mais liberdade de tempo e criatividade, suponho, expor e atender às inúmeras demandas no mercado nacional e internacional das artes visuais. A artista é representada pela Paulo Darzé Galeria de Arte.*O conteúdo assinado e publicado na coluna Olhares não expressa, necessariamente, a opinião de A TARDE*Arquiteto e artista visual | [email protected]

Serviços

Exposição: Okòtò – A espiral da evolução – Goya Lopes
Local: Museu de Arte Moderna da Bahia. (Casarão e Capela)
Abertura: 8 de abril, 17h
Visitação: 9 de abril a 10 de agosto
Horário: Terça a domingo, das 10h às 18h
Entrada gratuita

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