Falta de acesso e abandono do tratamento agravam doenças oculares no Brasil

Estima-se que 6,5 milhões de pessoas tenham algum grau de deficiência visual no Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). A adesão ao tratamento para doenças oculares graves é fundamental para evitar a progressão dos sintomas e preservar a qualidade de vida dos pacientes.No entanto, uma pesquisa da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV/CPDOC) revelou um dado alarmante: quase um terço dos brasileiros com doenças oculares graves interrompe o tratamento em algum momento. A desistência pode agravar os sintomas e acelerar a progressão das condições que estão entre as principais causas de perda de visão em pessoas acima de 55 anos.O estudo, realizado em parceria com a ONG Retina Brasil e com apoio da Roche Farma Brasil, focou em duas doenças: a Degeneração Macular Relacionada à Idade (DMRI) do tipo úmida e o Edema Macular Diabético (EMD). Essas condições afetam cerca de 1,4 milhão de brasileiros atualmente e, segundo projeções, esse número pode chegar a 1,7 milhão nos próximos cinco anos, devido ao envelhecimento populacional e ao aumento de casos de diabetes no país.

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A oftalmologista Patricia Kakizaki, especialista em Retina Clínica e Cirúrgica pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), explica que tanto a DMRI quanto o EMD afetam a mácula, região central da retina responsável pela nitidez da visão.“Prejudicam atividades de rotina como dirigir, ler ou até fazer compras no supermercado. O tratamento pode exigir a aplicação de injeções intravítreas (dentro do olho) até uma vez por mês, representando um peso grande para os pacientes e familiares”, detalha.

Painel sobre a conscientização da saúde ocular

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A pesquisa mostrou que 45% dos entrevistados relatam uma perda grave de visão, com impactos profundos na qualidade de vida. De acordo com a Dra. Kakizaki, o diagnóstico tardio e a falta de adesão ao tratamento são fatores que contribuem para esse cenário preocupante. Porém, avanços na medicina vêm oferecendo novas esperanças aos pacientes.“Estamos acompanhando o desenvolvimento de inovações capazes de impedir a progressão dessas doenças, estabilizando ou muitas vezes até melhorando a visão dos pacientes, além de proporcionar mais comodidade, diminuindo a frequência do tratamento e a necessidade de deslocamento até os consultórios e as clínicas”, afirma.Políticas públicas e integração de tecnologiasA falta de uma política pública organizada para diagnóstico e tratamento adequado de doenças oculares também é um ponto de preocupação. Michelle França, líder médica da Roche Farma Brasil, destaca a necessidade de estruturar uma rede de atenção que permita o diagnóstico oportuno e o encaminhamento ágil dos pacientes que necessitam de tratamento.“A política pública do reconhecimento da necessidade de ter o país numa rede organizada que possa fazer o diagnóstico oportuno desses pacientes e o direcionamento sério para todos aqueles que têm ausência ou a necessidade de agilidade do seu tratamento. Quando a gente olha para o cenário da oftalmologia, a gente já reconhece que os pacientes hoje não têm acesso ao oftalmologista. Mas não é só oftalmologista, o paciente também precisaria ter acesso a uma rede de centros socializados que pudessem fazer o tratamento”, afirma.A vice-presidente da Retina Brasil, Maria Antonieta Leopoldi, reforçou a necessidade de criação de soluções locais para garantir o acesso ao tratamento. “Tem que ser criado um sistema público local que inclua o transporte do paciente para o tratamento num determinado dia e algum veículo que vai apanhando os pacientes e levando. Algumas prefeituras fazem isso, é raro, mas é algo que é possível”, explica.Para França, integrar as informações de saúde é fundamental para identificar e cuidar dos pacientes em maior risco, como aqueles com diabetes descompensada.

Michelle França, líder médica da Roche Farma Brasil

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“Uma UBS tem condições a partir do uso eficiente de saber quais são as suas redes ou regiões onde eu tenho o maior número de pacientes com diabetes descompensada. O controle do diabetes é essencial para o controle dessa condição”, explica. Ela reforça que priorizar a política pública oftalmológica dentro de uma linha de cuidado estruturada é essencial para atender as especificidades de cada condição ocular.Outras condiçõesO impacto das doenças oculares vai além da saúde física. Segundo o levantamento, seis em cada dez pacientes relataram sofrer com dificuldades financeiras devido à condição, e 47% afirmaram que já buscaram ou gostariam de ter apoio psicológico para lidar com as consequências emocionais da perda de visão.Outro dado relevante é que 72% dos participantes da pesquisa convivem com outras doenças crônicas, como diabetes, hipertensão, doenças renais, hipotireoidismo e artrose. O acúmulo de condições de saúde agrava ainda mais a complexidade do tratamento e a qualidade de vida dos pacientes.A pesquisa entrevistou 155 pessoas de todas as regiões do Brasil, sendo 65% mulheres e 59% com 60 anos ou mais. Cerca de um terço dos entrevistados estava em tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no momento da coleta de dados.

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