Quem é Cássio Dias Barbosa, brasileiro campeão mundial da montaria em touros que acumula fortuna no exterior


Aos 22 anos e com breve carreira, caubói de São Francisco de Sales (MG) já faturou cerca de R$ 10 milhões e mantém trajetória bem-sucedida de peões do Brasil nos EUA. Cássio Dias Barbosa, campeão mundial da montaria em touros em 2024
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Há uma semana, o caubói Everton Natan Silva, de Viradouro (SP), fez história na Festa do Peão em Barretos (SP). Ele foi o primeiro competidor da montaria em touros a conquistar os títulos da Liga Nacional de Rodeio (LNR) e do Rodeio Internacional de Barretos na mesma edição do maior evento do gênero no país.
As vitórias deram ao peão a oportunidade de disputar o rodeio mais bem pago do mundo, o The American Rodeo, que acontece em abril de 2025 no estado americano do Texas.
“Eu creio que chegou a hora. Se Deus me deu essa oportunidade, eu creio que ele tem o melhor pra mim lá e eu vou dar o meu melhor para representar o Brasil lá fora”, diz.
Mesmo contestado por ativistas, o rodeio e a atividade de peão de montaria são regulamentados por lei. A prática é considerada esporte com os competidores alçados à categoria de atletas profissionais.
Everton segue, agora, na esteira de outros brasileiros que se destacaram no cenário nacional e que fora do Brasil fizeram fama e fortuna. Adriano Moraes e Silvano Alves são tricampeões mundiais da modalidade.
Everton Natan da Silva, de Viradouro (SP), vence o Rodeio Internacional de Barretos na Festa do Peão 2024
Érico Andrade/g1
Kaíque Pacheco e José Vitor Leme, o Vitinho, são exemplos mais recentes de carreiras bem-sucedidas no exterior. Leme teve sua trajetória retratada, por exemplo, na série The Ride, da plataforma de streaming Prime Video.
Os competidores foram lembrados inclusive pelo cantor americano Cody Johnson, que esteve no último sábado (24) para show exclusivo na Festa do Peão. Johnson, que é ex-peão e celebridade do country nos EUA, se declarou fã dos brasileiros e disse que todos são incríveis.
Atualmente, um jovem de São Francisco de Sales, município de Minas Gerais com 5,7 mil habitantes na região do Triângulo Mineiro, ostenta o título de melhor caubói do planeta. É Cássio Dias Barbosa, o Cassinho para os mais chegados, de 22 anos. Ele se tornou campeão mundial em maio deste ano na arena do estádio do Dallas Cowboys, em Arlington, no Texas.
A PBR World Finals é a principal prova da modalidade e é realizada pela Professional Bull Riders (PBR), a mais importante liga de rodeio do mundo.
Como prêmio, Cássio recebeu a incrível cifra de um milhão de dólares, cerca de R$ 5,2 milhões na cotação de maio deste ano. Desde que passou a integrar a PBR em 2021, o competidor acumula R$ 10,1 milhões na conta.
Os brasileiros Cássio Dias Barbosa e José Vitor Leme, campeões do mundo na montaria em touros
Arquivo pessoal
Desde a barriga da mãe
Cássio jura que o interesse pelos rodeios surgiu quando ainda estava na barriga da mãe, dona Evanilda Dias Silva, por causa do pai, Aldo Pereira Barbosa, que era competidor.
“Eu sempre tive essa vontade de querer montar e ser um peão famoso, ter sucesso no Brasil e nos EUA. Isso sempre veio de mim. Minha mãe conta que o meu pai conversava comigo dentro da barriga dela e que eu pulava. Meu pai falava que ia sair para o rodeio e ela falava que eu não dormia.”
Ainda moleque, vivia nas fazendas no entorno de São Francisco de Sales com os amigos, tirando leite das vacas em troca de se aventurar montando os bezerros.
Aos 13 anos, com o dinheiro de economias da venda de picolés e da ordenha de vacas, disse para a mãe que ia embora para São Paulo em busca do sonho de ser peão de rodeio. Dona Evanilda duvidou.
“Ela não acreditou. Eu vendia picolé na rua e juntei o dinheiro, comprei a passagem e fui pro estado de São Paulo junto com um amigo, pra Fernandópolis. Ele tinha um cunhado que mexia com uns bezerros, sempre tinha molecada e lá nós ingressamos. Comecei a treinar bastante e a abrir as portas nos rodeios juvenis em Votuporanga, Paranapuã, rodeios pequenos.”
Entenda as regras do rodeio:
Entenda as regras da montaria em touros na Festa do Peão de Barretos 2024
Estreia nem tão boa assim
A primeira montaria profissional foi em 2016, em São Sebastião do Pontal (MG), quando um amigo ajeitou a inscrição. Mas a estreia não foi com a pompa que ele esperava.
“Não deu muito certo, eu caí. Foi a primeira vez e a gente emociona de estar num rodeio profissional. Eu vi que não estava preparado e que tinha muita coisa pra aprender ainda. Garra a gente sempre teve, mas ainda não tinha as técnicas aprimoradas pra montar nos touros maiores. Comecei a pegar firme nos treinos”.
O jovem caubói ficou dois anos longe das arenas profissionais. Durante o período, acabou pedindo à mãe que o emancipasse. Sendo menor de idade, não poderia competir nos rodeios quando voltasse para as disputas.
A volta de vez
Aos 16 anos, retornou às provas oficiais e, em Inocência (MS), conquistou o primeiro prêmio da vida na montaria profissional.
“Peguei minhas malas e ganhei minha primeira motoca com 16 anos. Uma semana depois, conheci um salva-vidas e ele já conhecia o pessoal dos campeonatos no Brasil e ofereceu pra ajeitar de ir pra um campeonato. Eu falei que era meu sonho. Fiquei morando com ele e treinando.”
Cássio continuou ganhando prêmios até chamar a atenção de Enrique Moraes, presidente da Ekipe Rozeta, uma das principais ligas de rodeio do país. Passou a integrar o time de competidores, mas a pandemia desacelerou as coisas por causa da suspensão dos eventos.
Oportunidade imperdível
Em 2021, Cássio sentiu que uma oportunidade de ouro tinha chegado. Ao fazer parte do casting em uma apresentação da Jovens Touros, uma iniciativa para promover o protagonismo dos touros de rodeio no Brasil, chamou a atenção do tricampeão mundial Adriano Moraes, presidente da PBR Brasil.
“Estava tendo uma disputa entre touros, a gente só monta pra apresentar os touros, pagam cachê. O Adriano estava lá, viu eu montar num boi que todos estavam com medo dele. Até pediram pra eu sair fora do touro, mas eu falei: ‘não, o Adriano está aí e a oportunidade que eu tenho é essa’. Montei nesse touro, parei e o Adriano falou que ia me colocar na PBR.”
Um ano depois, ao chegar à final da PBR Brasil, Cássio conquistou o título da temporada 2021/2022 na Festa do Peão de Barretos e carimbou o passaporte para competir nos EUA. Ainda em 2022, ele embarcou para Las Vegas e viu a trajetória mudar de vez.
“Era meu sonho desde criança, meu pai sempre assista às finais mundiais pela TV. Era o sonho do meu pai também. Quando eu cheguei aqui eu pensava em ir bem, que tudo ia dar certo. Todo mundo estava esperando minha estreia aqui, mas acabou que não foi uma estreia muito boa. Eu peguei um touro invicto, foi pra testar mesmo o caubói. Mas eu continuei, fiquei mais 15 dias pra sentir os EUA e depois voltar mais preparado. Eu voltei para o Brasil, conversei com a minha esposa, falei como era aqui, pensamos muito bem e decidimos que eu tinha que voltar”.
Cássio Dias Barbosa, de São Francisco de Sales, MG, vence a temporada 2022 da montaria em touros da PBR Brazil barretos, SP
Érico Andrade/g1
A conquista das arenas
No retorno de mala e cuia aos EUA, Cássio foi apadrinhado pelo brasileiro campeão mundial Guilherme Marchi, que virou seu treinador.
Com o segundo melhor desempenho nas provas entre os caubóis, Cássio passou a integrar o seleto grupo MVP (most valuable players), com os competidores das maiores notas, e foi selecionado para disputar o mundial da temporada 2023/2024. De novembro do ano passado até maio deste ano, foram 23 etapas.
“Eu sofri bastante com machucados. O sofrimento maior foi o joelho, eu arrebentei os ligamentos dos dois joelhos. Foi a parte mais difícil ter que lidar com os machucados e ainda ter que montar. Mas a vontade de montar era maior.”
Em maio, durante as eliminatórias, Cássio sofreu um sério acidente no terceiro dos quatro rounds. Ele acabou caindo do touro, foi pisoteado, sofreu várias lesões na coluna, no pulmão e nas mãos e acabou internado.
Cássio Dias Barbosa em disputa da montaria em touros nos EUA
Arquivo pessoal
A expectativa era grande para saber se o jovem poderia ou não voltar à arena para a grande decisão. Mesmo com o apoio do técnico Marchi e da esposa Juliana, Cássio ainda precisava de aval dos médicos e só obteve a liberação no dia da primeira etapa da finalíssima.
Mesmo machucado, Cássio tinha ampla vantagem para o segundo colocado, John Crimber, mas queria ampliar a pontuação. Ao encarar os dois primeiros touros, acabou caindo e ainda experimentou uma sensação indescritível com a dor dos ferimentos.
“Eu senti queimar. Eu estava tenso antes do primeiro touro, porque eu não sabia a dor que eu ia sentir. No segundo, eu também caí, mas embrabei comigo mesmo. Pensei: ‘eu estou dando muita moleza. Não posso cair. Eu tenho que dar um jeito.’ Eu precisava mesmo era parar em um touro.”
Com as quedas, Cássio viu o concorrente diminuir a distância, mas a tão buscada parada aconteceu na terceira tentativa, ao montar o touro Ricky Vaughn. Ele marcou 92,50 pontos, viu o opositor cair nas provas seguintes e só comemorou. Era campeão mundial da montaria aos 22 anos.
“Lá no momento eu nem conseguia acreditar porque estava com as costas quebradas e voltar pra montar uma final não é fácil, porque são os melhores touros do planeta e os melhores cavalheiros. A nata está ali, os melhores. A sensação de não falhar eu nem consegui muito desfrutar porque eu estava tão focado no serviço ali na hora. Meus companheiros estavam todos lá, todos comemoram muito. Foi a realização de um sonho, não só meu, mas da família toda.”
Cássio Dias Barbosa e a esposa Juliana estão esperando o primeiro filho
Arquivo pessoal
O futuro
Mal conquistou o título, Cássio emendou a competição da montaria em touros por times. Ele está disputa com a equipe Kansas City Outlaws, que tem o americano J. W. Hart como técnico e Guilherme Marchi como assistente.
Com a fortuna que tem acumulado, o mineiro já comprou uma casa para a mãe, algo que ele considera um gesto de gratidão de todo filho, e investiu em colhedeiras em um negócio que mantém com o sogro em Minas Gerais. O próximo passo inclui a compra de um sítio por aqui.
Para o futuro, os planos de Cássio incluem uma permanência de mais dez anos nos EUA. Ele pretende continuar dando o seu melhor não só para garantir que o nome esteja no hall da fama do rodeio, mas para mostrar ao filho que vitórias como as dele incluem sacrifício, dedicação e fé. O jovem caubói acaba de descobrir que vai ser pai.
“A gente está aqui, sofreu muito pra chegar, sabe que a vida é difícil, então a gente quer ter mais pra dar o melhor pro filho da gente. O que importa é que quando Deus escreve o final é lindo”, diz.
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