Risco de apagão por sobrecarga de energia elétrica desafia o Brasil

Torre de transmissão: impossibilidade de controlar a geração causa concentração

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Os riscos de apagão por sobrecarga no sistema elétrico nacional desafiam o País. Um relatório do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), responsável por coordenar as operações de geração e transmissão de energia, aponta riscos de sobrecargas na rede de 11 estados nos próximos 5 anos.Um dos motivos apontados pelo órgão é a produção de energia por painéis solares em casas e comércios. O Espírito Santo não consta nessa lista, mas, como o sistema é interligado — com o Sistema Interligado Nacional (SIN) —, o estado pode ser afetado por um blecaute, como ocorreu em agosto de 2023, quando todos os estados foram afetados, menos Roraima, que não é ligado ao SIN.Carlos Sena, especialista em energia e membro do Fórum Capixaba de Energias Limpas (FCEL) do Centro Capixaba de Desenvolvimento Metalmecânico (CDMEC), explicou o assunto. No Plano da Operação Elétrica de Médio Prazo do SIN para 2025-2029, o ONS informou que o crescimento da geração distribuída “impõe desafios consideráveis à operação do sistema”. Divulgado anualmente, o plano propõe medidas e investimentos para reduzir ou eliminar riscos ao sistema, no horizonte de 5 anos. Sena explicou que há situações que impõem desafios ao sistema nacional.“Existe um planejamento desequilibrado. Como os leilões, que são feitos pensando no econômico, e não no técnico. Fazem estudos para instalação de linhas de transmissão, mas, até instalar, essa linha pode não surtir o efeito esperado. Maior parte da disponibilização de energia está no Nordeste, e a maior demanda, no Sudeste e Sul”.Segundo Sena, no caso das fontes renováveis intermitentes — energia solar e eólica, por exemplo — não é possível controlar a geração, e há concentração em algumas regiões, como Minas Gerais. O professor de Engenharia Elétrica da Poli-USP Dorel Soares Ramos frisou que há que se desenvolver novas arquiteturas de mercado, inclusive para estabelecer uma convivência pacífica entre as fontes renováveis, as convencionais e os recursos de armazenamento.“Há de se explorar a resposta pelo lado da demanda, melhorando a cooperação entre os operadores de distribuição e transmissão, significando trocar dados, regular funções e responsabilidades.”Procurada para participar da reportagem, a EDP não retornou.Busca por soluções locaisO relatório do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) é uma forma de dizer às concessionárias locais que busquem evitar a inversão de fluxo de potência, destacou Carlos Sena, especialista em energia e membro do Fórum Capixaba de Energias Limpas (FCEL).Isso acontece, segundo Sena, quando o excesso de energia gerada e não usada pelos consumidores que possuem painéis solares fazem o caminho inverso, passando da distribuidora para o sistema de transmissão.O especialista disse que, para solucionar esses problemas, teria de mudar a filosofia de planejamento do ONS. “Teria de se criar formas de autossuficiência regional, por estados, por exemplo, como é na Europa e nos EUA, e não nacional, como é hoje”.No relatório, o ONS identificou que, até 2029, quase 140 subestações de fronteira — que conectam redes de distribuição às linhas de transmissão — serão alvo do fluxo reverso, com riscos de sobrecarga “normal”, “admissível” ou “inadmissível”. É nessa classificação que estão os 11 estados citados na reportagem.A sobrecarga “normal” ocorre dentro dos limites técnicos dos transformadores. A sobrecarga “admissível” é a que acontece em níveis acima da capacidade dos equipamentos, mas dentro de uma margem de tolerância estabelecida pelos fabricantes. E a sobrecarga “inadmissível” é a que supera a margem de tolerância do equipamento.ONS diz que relatório indica recomendações e desafiosO Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) disse que, em curto prazo, o suprimento de energia no Brasil está assegurado e não há riscos de blecautes ou racionamento por falta de geração. “Tampouco há riscos sistêmicos na entrega”.Em nota, o ONS disse que “o Plano da Operação Elétrica de Médio Prazo do SIN sinaliza os possíveis desafios operativos e recomendações para fortalecer o sistema elétrico diante da evolução do setor, incluindo o crescimento da geração distribuída e das fontes renováveis”.Segundo o comunicado, o papel do ONS é antecipar cenários, avaliar impactos e propor soluções para garantir a confiabilidade e segurança do SIN. Porém, o mesmo não se pode dizer do cenário para período mais alongado.O diretor-geral do ONS, Marcio Rea, e os diretores do ONS, Alexandre Zucaratto e Christiano Vieira, responsáveis, respectivamente, pelo planejamento e operação do sistema, explicaram ao jornal Valor Econômico que os apagões que eventualmente ocorreriam com a sobrecarga, seriam localizados. É como, segundo eles, ao ligar dois ou três chuveiros elétricos, um disjuntor fosse desarmado sem desligar a casa inteira.O ONS disse que o aumento da geração distribuída e a inversão de fluxo de potência em algumas subestações são fenômenos técnicos mapeados e que estão sendo tratados pelo ONS.Para a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), “a maior presença das fontes renováveis na matriz elétrica nacional é economicamente viável, ambientalmente desejável e tecnicamente sólida e segura”. A associação disse que há um movimento que vai na contramão da transição energética, e tenta prejudicar as fontes renováveis, como solar e eólica.Saiba maisO relatórioO relatório, intitulado Plano da Operação Elétrica de Médio Prazo do Sistema Interligado Nacional, concentra perspectivas de investimento para o setor elétrico entre 2025 e 2029. O estudo aponta que o crescimento da geração de energia descentralizada, por meio de painéis solares, pode resultar em sobrecarga em 11 estados: Rio Grande do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Goiás, Mato Grosso, Rondônia, Bahia, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Piauí.O órgão observa que a micro e minigeração distribuída — painéis solares instalados em residências e comércios — e as usinas solares tipo 3, grandes instalações solares conectadas à rede, somam atualmente uma capacidade instalada de 53 gigawatts (GW), o que representa 22% da capacidade total do País.Espírito SantoO relatório do ONS apontou que “não foram identificadas subestações da rede básica de fronteira que possam apresentar fluxo reverso nos estados do Acre, Amazonas, Amapá, Rio de Janeiro e Espírito Santo neste ciclo de estudos”.O estudo também destacou a expansão do sistema de transmissão em 500 kV (quilovolts), ou seja, 500 mil volts, do ES, que permitirão aumentar o escoamento de geração da região Nordeste para a região Sudeste e a substituição de banco de autotransformadores na subestação que é responsável pelo atendimento às cargas da capital do Estado.Riscos de apagãoO Espírito Santo não consta na lista dos 11 estados, mas como o sistema é interligado — com o Sistema Interligado Nacional (SIN) — pode acabar sendo afetado por um blecaute, a exemplo do que aconteceu em agosto de 2023, quando todos os estados foram afetados, menos Roraima, pois não está ligado ao sistema nacional.Fonte: ONS e Carlos Sena.

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