Entenda a polêmica sobre o projeto de passe livre estudantil

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No início de fevereiro, a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) apresentou à Câmara Municipal o projeto de lei que propõe a criação do passe livre estudantil. Após um mês do encaminhamento, a proposta passou pelo parecer das comissões de Legislação, Justiça e Redação; de Finanças, Orçamento e Fiscalização Financeira; de Educação e Cultura; e de Urbanismo, Transporte, Trânsito e Acessibilidade. Os vereadores fizeram apontamentos ao projeto, que deve ser debatido a partir do dia 18, quando as reuniões ordinárias retornam à Câmara. Apesar de a maioria demonstrar ser favorável ao PL, alguns questionamentos foram levantados, como possíveis falhas na projeção orçamentária e pedido de inserção de alunos bolsistas. 

Atualmente, a legislação garante gratuidade no transporte público apenas para alunos matriculados na rede municipal de ensino, que tenham renda familiar igual ou inferior a dois salários mínimos e residam a uma distância igual ou superior a um quilômetro da escola. Com a nova proposta, todo e qualquer estudante, sem limitação quanto à renda ou à distância, que esteja matriculado em instituição pública de ensino, seja de educação básica, técnica ou superior, passaria a ter acesso ao transporte gratuito. 

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O Executivo garantirá a verba para a aplicabilidade do passe. Segundo a proposta, o impacto financeiro estimado com a redução na arrecadação da bilhetagem, devido à diminuição no número de usuários pagantes, a ser custeado pelo Município seria de R$ 17.867.157,72 anualmente. 

Comissão de Educação e Cultura e objeções

A Comissão de Educação e Cultura foi a que mais apresentou objeções ao projeto de lei. Para entender os argumentos, a Tribuna ouviu os vereadores Sargento Mello Casal (PL), presidente da comissão, Cida Oliveira (PT) e Roberta Lopes (PL), integrantes do grupo. O vereador Mello Casal se posiciona a favor do passe livre estudantil. No entanto, ele pede maior transparência e detalhamento sobre o repasse financeiro ao consórcio e a qualidade do transporte público, além de questionar a ausência de alunos do ensino fundamental e médio de escolas particulares que são bolsistas. 

Já Cida afirma que a proposta representa um grande avanço para a educação pública e, apesar do desejo pela ampliação do público, a parlamentar argumenta que essa decisão deveria partir do Executivo por uma questão de constitucionalidade, visto que, neste caso, a Câmara não pode obrigar alterações nas despesas municipais. Além disso, a vereadora aponta atraso no parecer da matéria e, consequentemente, na votação do projeto, como tentativa de impedir a constitucionalidade da lei. 

A parlamentar Roberta Lopes diz que a proposta não apresenta o número correto de estudantes contemplados para análise do impacto financeiro e aponta o que chama de erro no cálculo do custo mensal da medida, enviado juntamente com a proposta. Segundo a vereadora, na tabela apresentada pelo projeto, “a divisão do total mensal a ser subvencionado pela bilhetagem, chega-se ao valor de R$ 3,25 e não os R$ 3,75 indicados”. Questionada pela reportagem, a PJF não respondeu sobre a diferença no cálculo. Roberta também se mostra contrária à inserção de universitários entre os beneficiados em razão da existência de programas que atendem estudantes de baixa renda na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e devido ao público já estar na faixa etária para o mercado de trabalho. 

A reportagem também entrou em contato com a PJF e solicitou uma resposta às objeções apontadas pelos vereadores. Em nota, a Prefeitura informou que o projeto em questão é o mesmo aprovado pela Câmara em 2024, tendo sido encaminhado pelo Executivo ao Legislativo para sanar um vício de iniciativa. Na época, a proposta do vereador André Luiz (Republicanos) não foi sancionada devido a uma norma constitucional que prevê que toda proposta que gere despesa deve ser realizada pelo Executivo. A PJF acrescenta que: “como já explicitado anteriormente, constatou-se que o impacto financeiro da medida pode ser absorvido pelo Orçamento do Município, o que permite sua aprovação”. 

 A resposta dos vereadores na íntegra: 

Mello Casal (PL) 

Sou totalmente a favor do Passe Livre Estudantil. Sei da importância desse benefício para milhares de estudantes que dependem do transporte público para acessar a educação. No entanto, como presidente da Comissão de Educação, minha obrigação é garantir que qualquer política pública seja implementada de forma transparente, responsável e sustentável.  O que estamos cobrando da Prefeitura de Juiz de Fora é simples: transparência nos números, responsabilidade fiscal e inclusão!   

A planilha da Prefeitura estima um impacto de apenas R$ 1,5 milhão, mas uma conta básica, considerando 67 mil novos beneficiados, nos mostra um custo real de aproximadamente R$ 14 milhões mensais, levando em consideração o valor total da passagem, a quantidade de passagens e os 17 dias letivos. De onde será tirado esse dinheiro? Como a Prefeitura pretende garantir o repasse ao consórcio e a qualidade do transporte público?  O que nós queremos é uma apresentação clara e detalhada: 

Por que a Prefeitura não inclui alunos do ensino fundamental e médio de escolas particulares, mas que são bolsistas? Quando falamos de alunos de escolas particulares do ensino fundamental e médio que são bolsistas, o principal e mais importante critério para a concessão dessas bolsas é a renda familiar. A condição financeira da família do aluno é, geralmente, o principal fator determinante para o tipo de bolsa que ele pode receber.

Por que a Prefeitura não inclui também os responsáveis dos estudantes de baixa renda, que têm dificuldade em se deslocar sozinhos para a escola devido a questões de idade e possuem a necessidade de um responsável para a supervisão de forma a garantir sua segurança no trajeto?

Qual a garantia de que isso não levará ao sucateamento ainda maior do transporte público?  O subsídio ao transporte já existe e sabemos que o sistema enfrenta graves problemas: ônibus sucateados, que pegam fogo, perdem freio e colocam vidas em risco. Sem planejamento, a Prefeitura pode estar criando um colapso no sistema, prejudicando os próprios estudantes que pretende ajudar.  É muito fácil para os vereadores aliados da prefeita defenderem esse projeto sem questionar os impactos – afinal, eles andam de carro com ar-condicionado, enquanto o estudante encara ônibus lotados e inseguros. Nossa preocupação não é segurar o projeto, mas garantir que ele seja implementado de forma responsável, sem criar um problema ainda maior no futuro.   

Repito: sou favorável ao passe livre, desde que seja implementado com total transparência e responsabilidade fiscal. Até agora, porém, o que vimos por parte do Executivo foi apenas propaganda política e uma tentativa desesperada de desmoralizar quem realmente se preocupa com as contas públicas.

Cida Oliveira (PT) 

A proposta em questão representa um grande avanço para a educação pública em Juiz de Fora. Trata-se da garantia de que todos os alunos da rede pública tenham acesso ao transporte público para frequentar suas escolas, um direito fundamental e uma conquista histórica do Movimento Estudantil.

Como vereadora, dialoguei com a Prefeitura para avaliar a possibilidade de ampliar o público beneficiado pelo passe livre. No entanto, para 2025, o orçamento prevê a gratuidade para os alunos do ensino público, atendendo cerca de 90 mil estudantes. Embora tenha optado por não apresentar uma emenda neste momento, sigo comprometida com a ampliação desse benefício, pois nosso objetivo final é a implementação da tarifa zero, garantindo transporte público gratuito para toda a população.

Vale ressaltar que a extrema-direita tem utilizado dispositivos técnicos para atrasar a votação e impedir a constitucionalidade da lei. O parecer da matéria foi deliberadamente atrasado, impedindo que o projeto fosse votado em fevereiro, além do descumprimento do prazo regimental para emissão do parecer.

É importante esclarecer que vereadores não podem criar despesas para o Executivo. Isso significa que qualquer emenda obrigando a Prefeitura a incluir novos públicos no passe livre resultaria na inconstitucionalidade da lei e na impossibilidade de concessão do benefício.

Portanto, nossa estratégia é garantir, neste momento, a aprovação do projeto original da Prefeitura, assegurando o passe livre para os alunos da rede pública. Seguiremos, então, negociando com o Executivo para ampliar essa conquista no futuro.

Roberta Lopes (PL)

O projeto de impacto orçamentário enviado pelo Executivo contém falhas graves como o valor errado da passagem e a não inclusão da subvenção nos cálculos, não traz o número correto de estudantes que serão contemplados para análise do impacto financeiro, não faz uma estimativa dos estudantes que irão fazer uso do transporte gratuito além dos que já utilizam atualmente, não traz informações sobre redimensionamento da frota para atender o aumento da demanda sem prejudicar os passageiros atuais com superlotação, não cumpre com todos os requisitos exigidos pela LRF(Lei de Responsabilidade Fiscal). 

O projeto não contempla os alunos do ensino fundamental e médio que são bolsistas, mas contempla os alunos da Universidade Federal, o que é proibido por lei haver a priorização dos estudantes universitários em detrimento dos alunos do ensino básico. É também proibido por lei custear o transporte de alunos da universidade federal utilizando o Fundeb que, segundo informações, pode vir a ser uma das fontes de custeio, que também não fica clara no projeto. Além disso, já existe programa que atende os estudantes universitários de baixa renda não havendo necessidade da sua inclusão em projeto similar. Estudantes universitários também já estão em idade para o mercado de trabalho, o que lhes dá condições adicionais em relação aos estudantes mais vulneráveis, bolsistas, de ensino infantil, fundamental e médio. A estimativa é que o gasto com os estudantes da educação básica seja menor que o gasto com os universitários. Nossa batalha está sendo no sentido de que se inclua os estudantes bolsistas em face à não manutenção dos estudantes universitários no projeto, visto que a informação é que não haveria orçamento para apenas incluir os bolsistas, que são prioridade pela lei e pelo bom senso. 

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