Projeto estuda tratamento para sintomas da menopausa em vítimas de câncer de mama

A pesquisa Avaliação dos sintomas vaginais de ressecamento e função sexual de mulheres sobreviventes ao Câncer de Mama após tratamento local com Radiofrequência, do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), está procurando voluntárias. 

Conduzido pela professora Nicoli Serquiz e orientado pela docente Ana Katherine Gonçalves, o estudo investiga uma terapia não hormonal para a síndrome geniturinária da menopausa (SGM), ou atrofia urogenital. 

O público dessa pesquisa é composto por mulheres entre 40 e 65 anos que já enfrentaram o câncer de mama, têm menopausa e apresentam alguns sintomas, como ressecamento vaginal, dor na relação sexual, infecções urinárias de repetição e desconforto vulvar. 

As voluntárias irão testar a radiofrequência em uma pesquisa que visa trazer melhorias em sua saúde vaginal e sexual, reduzindo os sintomas já mencionados, e restaurar a qualidade de vida. 

As pesquisadoras destacam que este é o primeiro ensaio clínico local focado nas mulheres sobreviventes de câncer de mama com essa tecnologia. Já houve, segundo a professora Ana Katherine, estudos semelhantes com mulheres em menopausa, mas sem câncer de mama.

“Esse é um estudo realmente que vai trazer para essa população específica muitos resultados que não temos ainda”, diz Serquiz. Para ela, esses sintomas, mesmo causando tanto desconforto, ainda são pouco abordados nos consultórios médicos.

“A nossa hipótese é que a radiofrequência vai ser um método que vai melhorar a saúde vaginal e a função sexual, trazendo qualidade de vida para essas mulheres e promovendo então uma reepitalização desse epitélio vulvovaginal”, completa.

Gonçalves explica que as mulheres com câncer de mama podem ter uma menopausa precoce devido ao tratamento para o câncer. A SGM é comum em mais da metade das mulheres durante o período menopausal.

As interessadas em se voluntariar podem se inscrever por meio do formulário disponível neste link. Mais informações podem ser obtidas pelo WhatsApp (84) 98117-8048.

Abaixo, confira mais sobre a pesquisa, a metodologia empenhada, de que modo participar e as expectativas das pesquisadoras, reveladas em entrevista à Agência Saiba Mais.

Agência Saiba Mais – Como surgiu a ideia de pesquisar esse assunto?

Ana Katherine – Esta pesquisa tem como objetivo melhorar a qualidade de vida e função sexual de mulheres na menopausa sobreviventes do câncer de mama. A atrofia urogenital acontece com a maioria das pacientes na menopausa. Os sintomas incluem: perda involuntária de urina, infecção urinária recorrente, ressecamento intenso, dor durante a relação e corrimento, que muitas impossibilita a mulher de ter relações sexuais, prejudicando sua qualidade de vida. 

Nicoli Serquiz – As mulheres na pós-menopausa sofrem com diversos sintomas. E um dos sintomas que mais afetam a sua qualidade de vida são os sintomas locais na região da vulva e da vagina, que são o ressecamento vaginal, a dor ao urinar ou mesmo a dor na relação sexual. Esses sintomas são pouco relatados pelas pacientes e pouco abordados pelos profissionais de saúde. Com o passar do tempo, nós fomos vendo que isso tinha um impacto na qualidade de vida dessas mulheres. Com isso, o grupo de pesquisa fez os primeiros estudos relacionando terapias físicas com o tratamento desses sintomas.

Na verdade, para procurar uma nova terapia que não utilizasse hormônio. Hoje, nós temos as terapias físicas, que são os lasers e a radiofrequência. Eles se baseiam na produção e no estímulo de colágeno naqueles locais. Antes, quando a mulher menstruava, o estrógeno era responsável por isso. Com a menopausa, os níveis hormonais de estrógeno caem com a produção do ovário. Isso faz com que o epitélio, a pele da região da vulva e da vagina, se tornem ressecadas e com o passar do tempo, esse ressecamento só aumenta, causando todos esses outros sintomas.

ASM – Como vocês selecionaram esse recorte?

NS – Com isso, foi visto que para essas mulheres na pós-menopausa, essas terapias que não utilizam hormônio conseguiam durar uma qualidade melhor do que esse estímulo ao colágeno. E aí foi quando foram estudadas as terapias físicas. Quando nós observamos pacientes na pós-menopausa, mas também pacientes que fizeram terapias oncológicas para o tratamento de câncer de mama, vimos que o índice e a intensificação desses sintomas são ainda maiores, e foi por isso que a gente acabou selecionando esse grupo de pacientes. 

Após uma revisão sistemática que nós elaboramos em 2024, foi visto que poucos estudos ainda com evidência confiável existem. Esse estudo, realmente, não existe no Brasil e no mundo, utilizando a radiofrequência nesse grupo de pacientes.

ASM – Qual é a diferença da menopausa em mulheres que não tiveram câncer de mama e as que sobreviveram a ele?

AK – O tratamento padrão para esta situação é a terapia de reposição hormonal por via sistêmica ou vaginal. Entretanto, a terapia hormonal está contraindicada para as mulheres com câncer de mama, pois aumenta o risco de recorrência e metástases desse câncer. A finalidade do uso de energias é substituir a terapia hormonal em mulheres que não podem usar hormônios ou não desejam fazer uso de hormônios.

Em mulheres com câncer de mama, a menopausa pode ser mais precoce porque o próprio tratamento para o câncer de mama antecipa a menopausa, fazendo com que as mulheres com câncer de mama apresentem estes sintomas mais precocemente. Ou seja, mulheres jovens já podem apresentar atrofia urogenital .

ASM – Qual é a importância da pesquisa? Quais são as contribuições esperadas com ela?

NS – A importância da pesquisa, então, é a gente poder dar uma terapia sem hormônio para esse grupo de pacientes. O padrão ouro, hoje, é a não utilização de hormônio, a partir só de hidratantes, e que a gente sabe que fica muito limitada para a gente poder dar mais qualidade de vida para essas pacientes em relação à sua saúde vaginal, à sua relação sexual, alterações urinárias, e este estudo vem para dar uma opção não hormonal para esse tipo de tratamento.

ASM – Por que a pesquisa escolheu esse público, mulheres de 45 a 60 anos que enfrentaram câncer de mama? Explica o que acontece com elas durante as terapias de radiofrequência.

NS – O público-alvo foi escolhido para a gente tentar uma população mais homogênea. É uma idade um pouco menor de menopausa, porque essas pacientes que fazem tratamento oncológico geralmente têm a tendência a usar tratamentos e terapias em que a paciente entra em menopausa antes do tempo. Acaba que os sintomas de menopausa são mais identificados. Então, nós procuramos esse grupo de pacientes, principalmente pacientes que têm esses sintomas.

A intervenção, que é a radiofrequência, é um método físico em que faz a aplicação da radiofrequência microablativa na região da vulva e da vagina. São pequenas microagulhas; a radiofrequência vai fazer um estímulo de colágeno naquela área, para que aquele epitélio se refaça, para fazer com que [haja] lubrificação, reepitelização

e conservar a idade vulvovaginal dessa paciente, fazendo com que a própria relação sexual e os sintomas de ressecamento melhorem.

ASM – Já participou ou conhecia outras pesquisas semelhantes? Se sim, o que tem de novidade na terapia que vocês propõem?

AK – Este não é o primeiro estudo que realizamos com esta metodologia, realizamos e publicamos três estudos aplicando essa metodologia em mulheres sem câncer. Nos estudos anteriores, comparamos a radiofrequência fracionada microablativa (RFFMA) com o uso de hormônios em pacientes saudáveis e obtivemos resultados semelhantes.

Antes de utilizar a RFFMA, pesquisei que existiam bons resultados com o uso de laser para este propósito, entretanto, o laser é muito caro. O aparelho pode custar cerca de 200 mil reais. O aparelho de RFFMA é uma plataforma multifuncional que pode ser utilizado para outras funções, tais como diagnóstico e tratamento dos cânceres do colo uterino, vagina, vulva e pele com um custo que equivale a 20% do custo do laser, sendo relativamente acessível à maioria dos ginecologistas.

NS – As pesquisas estão em andamento, atualmente. Nós temos pelo menos sete trials no mundo inteiro em andamento, utilizando principalmente laser de CO2 e o IAG laser. Poucos estudos acabam utilizando a radiofrequência, nós temos três estudos brasileiros utilizando radiofrequência, que já se mostraram, na população da pós-menopausa, promissores com a melhora da função sexual vaginal e da função sexual dessas mulheres.

Entretanto, nós não temos nenhum ensaio clínico brasileiro que aborde esse grupo de mulheres na pós-menopausa e com sintomas de menopausa, e com tratamento de câncer de mama. Então, esse é um estudo realmente que vai trazer para essa população específica muitos resultados que não temos ainda. O que nós temos na literatura são apenas três ensaios clínicos randomizados, que eles se mostram ainda (como têm uma baixa população selecionada) com uma baixa evidência. Então, a gente quer tentar ver se para este grupo de mulheres [o tratamento] é seguro e eficaz.

Folder informativo – Foto: cedida

ASM – Vocês pretendem avaliar os efeitos da RFFMA na redução dos sintomas da SGM. Qual é a hipótese do estudo? O que é esperado que aconteça?

NS – A nossa hipótese é que a radiofrequência vai ser um método que vai melhorar a saúde vaginal e a função sexual, trazendo qualidade de vida para essas mulheres e promovendo então uma reepitalização desse epitélio vulvovaginal.

ASM – Como funciona a terapia? Explica para as potenciais voluntárias. 

AK – A RFFMA funciona estimulando a proliferação celular e a produção de colágeno, muco vaginal, melhorando a elasticidade vaginal, favorecendo a função sexual e melhorando a qualidade de vida das pacientes.

NS – A terapia é realizada a partir de três sessões. A aplicação dela será com intervalo mensal, então são três aplicações, nas quais são realizados alguns questionários validados e a avaliação da flora vaginal, também do papanicolau e alguns outros exames. Além dos próprios questionários em que a gente vai poder avaliar tanto a função sexual, saúde vaginal, tolerância ao método e segurança, nos três encontros e posteriormente num controle.

Serão selecionados dois grupos. É um ensaio clínico randomizado, em que um grupo vai receber efetivamente a energia e o outro grupo vai ser a ausência da energia, é o grupo controle. Todas essas mulheres posteriormente vão ser submetidas ao procedimento, mas nós precisamos fazer uma avaliação de controle para saber a real eficácia desse método.

ASM – Como participar?

NS – Para participar, temos links ou mesmo vamos procurar via telefone e e-mail nessa fase de recrutamento aquelas pacientes que fizerem parte dos critérios de inclusão, que seriam idade entre 40 e 65 anos com esses sintomas de ressecamento vaginal, dor a urinar, ardor ou mesmo dor durante a relação, com esses sintomas que já fizeram tratamento para o câncer de mama.

Atualmente, elas podem estar em uso da terapia hormonal, que é o tamoxifeno ou inibidodermatase, mas não pode estar realizando quimioterapia nem imunoterapia no momento. [Também considera-se a] ausência de infecções vaginais. Aquelas que fizerem parte desses critérios de inclusão serão selecionadas para essa primeira fase do estudo.

ASM – Por que é importante que mulheres nessa faixa etária procurem esse tratamento?

AK – As pacientes na faixa etária estabelecida podem obter benefícios com a terapia proposta. Como já mencionamos, já temos algumas publicações na área em revistas internacionais de alto impacto, em mulheres saudáveis, sem câncer. 

Como nos estudos que realizamos anteriormente, esperamos que a maioria das mulheres com câncer de mama se beneficiem com o tratamento da mesma forma que as que não tinham câncer se beneficiaram.

ASM – Muitas mulheres já procuraram a pesquisa? 

NS – Muitas mulheres já entraram em contato, sendo que algumas delas [não atendem aos critérios]. O que nós ficamos muito surpresas é que muitas mulheres realmente apresentam esses sintomas, e isso é muito pouco abordado e isso é muito importante a gente trazer, para que os médicos cada vez mais – e as pacientes também – possam entender a importância. Isso afeta diretamente a qualidade de vida dessas mulheres e não é normal. Nós temos tratamentos específicos para isso e nós podemos melhorar essa qualidade de vida delas.

ASM – Qual é a expectativa das pesquisadoras? 

NS – A importância do tratamento é que, uma vez que tenha a atrofia genital, decorrente a essa ausência de hormonal, não melhora a atrofia. Então, isso faz com que a gente realmente precise realizar algum tipo de tratamento, seja o tratamento local com hidratantes, seja o tratamento com hormonal, com o estrógeno tópico ou mesmo com terapias físicas. A expectativa é que a gente inicia o recrutamento agora, iremos iniciar as intervenções a partir de março e a finalização da primeira parte desse projeto piloto seria em dezembro.

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