As eleições no Congresso e nova realidade

Jornalista Eliane Cantanhêde:

“Inversão no Congresso: Davi Alcolumbre será na presidência do Senado o que Arthur Lira foi na da Câmara e Hugo Motta, na da Câmara, o que Rodrigo Pacheco foi na do Senado. Ou seja, Alcolumbre terá muita força e um poder muito maior para chantagear, ops!, negociar com o governo e Motta tende a ser mais cauteloso ao dar um passo tão grande – tomara que não um passo maior que a perna. Mas Motta foi apadrinhado por Lira e grande aliado de… Eduardo Cunha. Não estará sozinho.

Alcolumbre, do União Brasil do Amapá, e Motta, do Republicanos da Paraíba, têm muitas diferenças, mas ambos fortalecem ainda mais o já tão poderoso Centrão no Congresso e ambos estão embolados nas investigações do Supremo sobre emendas parlamentares esquisitonas. Logo, o Centrão está no comando, mas o ministro Flávio Dino está a postos no Supremo e o fator emendas tende a dar limites à beligerância do Congresso.

Tido como um dos ‘pais’ do orçamento secreto, uma excrescência sob a mira do STF,Açcolumbre é uma das estrelas das planilhas reveladas pelo nosso Estadão, em 2021, por garantir R$ 277 milhões em emendas do Ministério do Desenvolvimento Regional e jogar um mistério no ar: por que será que um senador do Amapá destina R$ 10 milhões para compras e obras fora do seu Estado, inclusive tratores (superfaturados, aliás) para o Paraná, a 2,6 mil quilômetros de suas bases eleitorais?

E Hugo Motta, que foi o deputado federal mais jovem eleito no País, aos 21 anos, e assume a presidência da Câmara aos 35, tem um probleminha nessa seara depois da operação da Polícia Federal sobre desvios de dinheiro público em Patos (PB). Os recursos para as obras suspeitas, quase R$ 5 milhões, foram enviados por emenda de Motta e seu pai, Nabor Wanderley, era (e continua) prefeito. Os dois não são diretamente investigados, mas…

Assim, as relações entre o Congresso e o Supremo, que vêm tendo troca de tiros, bombas e drones, tendem a ficar, digamos, mais calmas. Nem Alcolumbre nem Motta têm interesse em tocar adiante pautas como mandato, facilitação de impeachment e derrubada de decisões de ministros do Supremo. Além de pisarem em ovos por causa de emendas, Alcolumbre é amigão de boa parte dos ministros e Motta precisa comer muito feijão para peitar o STF.

Com o Executivo, a questão continua muito complexa. O presidente Lula tem de aprovar, finalmente, a segunda parte da regulamentação da reforma tributária e o ministro Fernando Hadadd pode precisar muito do Congresso em caso de novo pacote de corte de gastos, por exemplo. Qualquer governo, em qualquer parte do mundo democrático, precisa do Congresso, mas quantos países têm emendas parlamentares de R$ 50 bilhões por ano, orçamento secreto e outras jabuticabas do gênero?

É improvável, não impossível, que as duas casas do Congresso se dediquem num primeiro momento a pautas de aborto e drogas e ao explosivo projeto de anistia aos criminosos do 8 de Janeiro, que tem como real objetivo favorecer o inelegível Jair Bolsonaro. Depois? Depende da economia, do desempenho do governo, da popularidade de Lula, da evolução das relações entre Poderes e do jogo para 2026.

Outros temas fundamentais serão a regulamentação das redes sociais e da inteligência artificial, o pacote da Segurança Pública do ministro Ricardo Lewandowski e o projeto para endurecer a liberação de militares para disputas políticas, que seria, ou será, o fecho de ouro da passagem do ministro JoséMúcio pela Defesa, em pleno ano do julgamento histórico sobre a tentativa de golpe militar na era Bolsonaro.

São três pautas centrais na ácida polarização do País, com o governo de um lado, o bolsonarismo do outro e o Centrão no comando. Se a eleição de Alcolumbre e Hugo Motta uniu do PL ao PT, agora vem o dia a dia da política, das negociações, dos interesses regionais e particulares e das emendas, às vésperas das eleições gerais de 2026e com Lula no olho do furacão.

O pau vai quebrar.”

 
 
 
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