Avanço do mar em áreas vizinhas ameaça praias de São Miguel do Gostoso

A cidade de São Miguel do Gostoso é conhecida como um paradisíaco destino de réveillon. O lugar ainda conserva as características de vila de pescadores pouco explorada pela “civilização”. Além disso, tem uma extensa faixa de areia, ideal para realização de grandes festas, acrescida pelo fato de ficar há pouco mais de 1h30 de Natal.

Mas, essa paisagem pode ser drasticamente alterada nos próximos anos quando praias vizinhas, que estão passando pelo mesmo processo de erosão visto em Ponta Negra, começarem a construir barreiras rígidas, jogando o avanço do mar para a cidade vizinha, nesse caso, São Miguel do Gostoso.

Um trecho que chama atenção é aquele que vai de Touros a Caiçara, passando por São Miguel. Mais recentemente passamos a perceber que o processo erosivo lá é muito alto. Muitos resorts e condomínios de luxo que receberam licenciamento ambiental para se instalar foram orientados a não construir próximo ao limite do terreno e houve um processo de recuo, mesmo assim, o mar avançou e já houve perda de vários hectares”, relata o professor de Engenharia Civil e Ambiental da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) Venerando Eustáquio Amaro.

O professor contabiliza que as taxas de erosão na região estão entre as mais altas do Rio Grande do Norte. Enquanto a média mundial de perda em praias arenosas é de meio metro por ano, na região setentrional do estado as perdas têm sido de cinco a seis metros por ano. A perda da área de praia pelo avanço do mar no RN nessa região varia de 42 as 60 hectares em até 20 anos.

Imagem: reprodução Google maps

É muito alto, quase um lote inteiro! Muitos dos terrenos que eram recuados, agora estão ameaçados. Isso é muito importante porque os donos desses terrenos vão construir algum tipo de engenharia para se proteger do avanço do mar. Se eles resolverem fazer o que a gente chama de ‘enrijecimento de praia’, que é o que fizeram em Ponta Negra, colocar rocha, fazer muro de arrimo… eles vão jogar a erosão para cima de São Miguel do Gostoso, que também está em processo de erosão, mas ainda pouco perceptível. São resorts com frente ampla, com centenas de metros”, conta Venerando.

Ainda hoje, São Miguel do Gostoso é conhecida por ter praias com centenas de metros de extensão, mas que já começam a sentir o efeito do avanço do mar.

Na chamada Ponta de Santo Cristo era um trecho muito extenso. Pra gente andar da costa até o mar era coisa de 400 metros a 500 metros, era um negócio imenso. Ninguém percebeu, porque ninguém ia andar meio quilômetro pra chegar no mar no meio do sol quente, mas com o tempo, essa praia foi se reduzindo. À medida que a erosão ia acontecendo sobre ela, ia alimentando a praia da Xêpa e aquela prainha que fica na frente de São Miguel, esse foi um trecho que ficou muito preservado nos últimos 50 anos, mas que agora não está estável”, alerta Venerando, que calcula que obras de enrijecimento das praias à leste vão acelerar a erosão em Sã Miguel do Gostoso.

Praia de Tourinhos, em São Miguel do Gostoso I Foto: Mirella Lopes
Muro e pedras para conter avanço do mar agrava problema em praias vizinhas I Foto: cedida

Uma história que se repete

O professor da UFRN aponta que a história que está acontecendo em São Miguel do Gosoto é semelhante ao que já foi visto em Pipa e Ponta Negra. Sem planejamento dos gestores, cada dono de resort, pousada e condomínio vai tomar suas próprias decisões para se proteger do avanço do mar, sem uma coordenação que oriente por uma solução coletiva e menos danosa.

A cidade não avalia essas questões, joga todo o processo erosivo para cima da praia e a gente vai ver o que estamos vendo em Natal em dez anos. Acreditamos que para 2030, o recuo da linha de costa vai variar de 70 a 120 metros, afetando não só os terrenos de Touros, mas também de São Miguel do Gostoso. Os donos desses terrenos vão buscar uma solução e como são resorts importantes, condomínios caros… o pessoal tem dinheiro para bancar uma obra de engenharia e proteger o terreno do mar. É quando veremos a intensificação da erosão na cidade”.

Em um dos casos, o professor Venerando explica que as casas de um loteamento foram recuadas ao máximo, mesmo assim, o avanço do mar levou 20% do terreno e, agora, as casas estão ameaçadas.

Em um desses terrenos eles perderam 5.600 metros quadrados de área e é um terreno de primeira linha. É coisa de milhões de reais. Hoje há casas caindo dentro do mar“.

Para solucionar o problema, o pesquisador da UFRN aconselha que os proprietários e empreendedores não adotem medidas isoladas e que procurem o órgão para uma solução coletiva, algo que seria inédito no Rio Grande do Norte.

O que aconselho é que eles não tomem uma solução isolada porque vai virar uma bagunça e não vai conter o processo erosivo. O negócio é juntar todos os ameaçados e aqueles que estão em risco em um consórcio e buscar uma solução junto com o gestor público. Eles precisam de uma solução mais robusta e não de medidas isoladas, o que é um desafio“.

Terrenos entre |Touros e São Miguel do Gostoso I Foto: cedida

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