Controle de idas ao banheiro em empresas será julgado pelo TST

Neste ano, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) deve julgar se o controle de idas ao banheiro, com impacto em programas de incentivo, configura dano moral presumido —quando a violação a um direito é tão evidente que não é necessária a comprovação de sofrimento pela vítima.No caso que será analisado, o tribunal avaliará se o impacto desse tipo de monitoramento no cálculo de bônus representa uma ofensa à dignidade do trabalhador. O programa de bonificação em questão é o PIV (Programa de Incentivo Variável), sistema que tem como base metas de produtividade.O tema será examinado como recurso repetitivo. Até o momento, o relator e a data de julgamento ainda não foram definidos. Lorena Lara, advogada trabalhista do VLF Advogados, explica que esse tipo de recurso costuma ser utilizado para uniformizar a jurisprudência em temas de grande repercussão social.Nesses casos, é comum que haja divergência nas decisões tomadas por diferentes tribunais. Para uniformizar os julgamentos, a advogada explica que a decisão tomada servirá como parâmetro para os demais processos que tratem da mesma questão jurídica.Os casos analisados envolvem principalmente trabalhadores de teleatendimento, mas a decisão valerá para outras categorias profissionais.Em abril do ano passado, a Terceira Turma do TST se posicionou sobre o tema após o julgamento do recurso de uma teleatendente indenizada em R$ 10 mil por dano moral. O relator do caso considerou que a prática configura abuso de poder.As empresas do setor argumentam, no entanto, que a organização das idas ao banheiro é indispensável no telemarketing, considerando o regime jurídico diferenciado para esses trabalhadores.”Eles possuem jornada especial de 6h, com duas pausas programadas de dez minutos, além do intervalo mínimo de 15 minutos”, explica a advogada trabalhista e sócia do Pessoa & Pessoa Advogados, Juliane Facó.Nesses casos, se muitos atendentes forem ao banheiro ao mesmo tempo, a operação pode ser prejudicada, gerando penalidades à empresa, uma vez que a Anatel estabelece um tempo máximo para contato direto do consumidor com o atendente.”Isso não quer dizer que o trabalhador não possa usar o banheiro quantas vezes achar necessário e nem que deve justificar a ida ou ter um tempo máximo de uso. Qualquer excesso ou conduta vexatória cometida pela empresa que ultrapasse o razoável deve ser punida pelo Judiciário ou órgãos de fiscalização”, destaca Juliane.Algumas disposições específicas relacionadas aos trabalhadores de telemarketing estão previstas na NR-17 (Norma Regulamentadora 17).Mauro Cava de Britto, secretário-geral do Sintetel-SP (Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações no estado de São Paulo), afirma que o sindicato é contrário a determinadas formas de aplicação do PIV.”Algumas empresas acabam privilegiando o sistema de aderência, em que quanto mais tempo sentado na posição, maior é a produção. Isso é equivocado, uma vez que o trabalhador precisar estar bem para exercer a atividade trabalhista com qualidade”, diz.Para evitar abusos no controle de idas ao banheiro, o secretário destaca a importância de que as regras dos programas de incentivo sejam discutidas e aprovadas junto aos sindicatos.Em nota, o Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações do Paraná, estado com a maioria dos casos julgados sobre o tema, afirma considerar a inclusão das pausas para ir ao banheiro no cálculo do PIV como assédio moral organizacional.”Se revestindo em controle indireto do tempo do trabalhador para exaurir suas necessidades fisiológicas, ferindo, portanto, a honra e dignidade do trabalhador, causando dano moral, independe de qualquer prova da extensão ou existência de prejuízo”, diz a organização.Em depoimento do caso que será julgado pelo TST, um dos supervisores da trabalhadora declarou que as pausas para ir ao banheiro não eram proibidas. “A gente apenas orienta a ter cuidado porque isso afeta tanto o nosso resultado [de supervisor] quanto o do trabalhador. Como supervisor da autora, nunca cheguei a buscá-la no banheiro, nem a ameacei ou expus as metas dela para a equipe”, afirmou.Lorena Lara, advogada trabalhista do VLF Advogados, afirma que o programa não possui regulamentação específica, mas está amparado pela Constituição.”A legislação prevê a necessidade de clareza e transparência nas regras do programa, para que os trabalhadores tenham conhecimento dos critérios de elegibilidade e cálculo das bonificações”, diz.IMPACTO NO JUDICIÁRIOEspecialistas avaliam que a transformação dos casos em dano moral presumido pode ter implicações significativas.”Por um lado, pode facilitar o acesso à Justiça para os trabalhadores que se sentirem lesados, agilizando o processo de indenização. Por outro, pode gerar um aumento no número de ações trabalhistas, sobrecarregando o Judiciário”, afirma Lorena Lara.Juliane Facó complementa, destacando que é provável que inúmeros processos sejam abertos pedindo a aplicação do precedente. “O tempo de resolução dos conflitos pode se alongar ainda mais se o tema for levado ao STF para uma decisão divergente”, pontua.O QUE OS TRABALHADORES PODEM FAZER SE OBSERVAREM QUE SEUS DIREITOS ESTÃO SENDO DESRESPEITADOS? 1 – Diálogo com a empresaBuscar uma solução amigável com o empregador, expondo a situação e buscando a regularização2 – Sindicato da categoriaProcurar o sindicato para obter orientação jurídica e apoio na negociação com a empresa3 – Ministério Público do Trabalho (MPT)Formalizar denúncia ao MPT, que poderá instaurar inquérito civil para apurar as irregularidades e buscar a responsabilização da empresa4 – Justiça do TrabalhoIngressar com uma ação judicial para pleitear o reconhecimento de seus direitos e a reparação por eventuais danos sofridos
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