A indústria dos vistos e o pesadelo americano

Nos últimos cinco anos, o número de escritórios de advocacia especializados em imigração nos Estados Unidos cresceu significativamente, refletindo um aumento expressivo na demanda por serviços jurídicos nessa área. De acordo com dados da IBISWorld, em 2023, existiam 17.558 empresas de advogados de imigração nos EUA, representando um aumento de 7,9% em relação a 2022. Esse crescimento anual médio de 7,9% entre 2018 e 2023 evidencia uma expansão robusta e constante no setor.

Uma complexa indústria que envolve as diversas ofertas de vistos americanos e tem transformado o processo de legalização dos imigrantes em um verdadeiro pesadelo. Os dados do IBISWorld revelaram que em 2023 havia 428.302 escritórios de advocacia de imigração nos EUA. Um mercado que faturou US$8,7 bi em 2023. Uma indústria que tem aprimorado técnicas para fazer do imigrante um depositário fiel em médio e longo prazo, aproveitando o extenso período adotado pelo Departamento de Imigração americano para avaliação e resposta das solicitações de vistos e green cards.

Como jornalista e pesquisador da imigração, tenho dedicado grande parte da última década nos EUA a compreender os desafios enfrentados pelos brasileiros em busca de uma nova vida. Nos últimos anos, observei um aumento alarmante nos relatos de insucesso, frustrações, prejuízos e até crimes e estelionatos durante o processo migratório, afetando profundamente centenas de famílias e revelando um lado sombrio da busca pelo “sonho americano” que passa a ser um pesadelo.

Ao que mostram as evidências, o aumento da divulgação de vistos e facilidades no Brasil por parte destes escritórios e influenciadores digitais, tem provocado o aumento da demanda de brasileiros em apostar e pagar, e muito, pelo sonhado green card nos EUA. Valendo-se de uma narrativa pautada nas mudanças frequentes nas políticas de imigração do país, especialmente em relação a vistos, asilo, e questões de cidadania, o suporte jurídico nos EUA cai como uma luva na vida dos imigrantes em busca da legalização.

Como a espera por uma resposta do departamento de imigração pode levar anos, em muitos casos, a atuação dos escritórios, de modo geral, se pauta na tentativa de preservar a autorização de permanência do imigrante no país cobrando por cada ação envolvida – o que ao final vai garantir ao solicitante apenas uma dívida altíssima em dólar e nenhuma garantia de sucesso ou vitória no caso.

Acontece que, episódios recentes amplamente divulgados pela imprensa tem mostrado o surgimento de consultorias (muitas vezes não autorizadas a atuar nos EUA) envolvidas em fraudes documentais, propagação de narrativas ilusórias, além de escritórios de advocacia que não se comprometem com o processo integral e não garantem a devida proteção aos imigrantes.

O brasileiro precisa compreender de uma vez por todas a distinção entre internacionalização e migração para outro país. É preciso evidenciar que a internacionalização é um processo que permite livre trânsito aos EUA, podendo o solicitante seguir sua vida e residência normal no Brasil. Os EUA oferecem vistos que permitem esta modalidade, inclusive com autorização de trabalho, sem a necessidade do imigrante estabelecer residência no país norte-americano.

Outro fator que não é popular entre os conteúdos divulgados nas redes e nos eventos das consultorias imigratórias, é que o Green Card impõe sobre seu detentor a permanência obrigatória nos EUA restringindo o tempo em que este imigrante possa estar fora do país em no máximo seis meses. Muitos empresários, artistas e pessoas que são iludidas por esta conquista do green card – usualmente o processo mais caro oferecido pelos escritórios – não necessariamente precisam ou podem ficar “presos” aos EUA sem a possibilidade de seguirem seus negócios e carreiras no Brasil.

O fato é que existe um mercado lucrativo e pujante da venda de vistos americanos. Um cenário que o próprio departamento de imigração dos EUA quis evitar ao oferecer a possibilidade do solicitante fazer sozinho seu pedido, totalmente de forma online e com todas as informações úteis explicadas em inglês e espanhol. A pergunta que se faz é: quem de fato vive o sonho e quem vive o pesadelo?

*RODRIGO LINS é Mestre em Comunicação, Pesquisador da Imigração Americana, Professor universitário, jornalista e escritor. Teve a carreira reconhecida como extraordinária pelo Governo Americano em 2016 e reside legalmente nos EUA. É autor de outras obras no Brasil e no exterior. Dirige a agência de Comunicação, Marketing e Imprensa multinacional Onevox Creative Solutions com sede nos EUA e escritórios no Brasil, Canadá e Europa.

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