Ainda me surpreende como uma demonstração de afeto, como um beijo entre dois homens, causa tanto frisson, tanto alvoroço, tanta raiva e revolta.
Também me surpreende como os discursos de depreciação, de desqualificação, de mácula contra a sociedade se atrela a esse ato tão bonito: um beijo entre dois homens.
O lugar onde ele ocorre fica manchado, impuro, impróprio para o “cidadão de bem”… Pais proíbem os filhos de frequentarem um lugar assim… Parece contagioso, perigoso demais. Um lugar onde isso ocorra, começa a ser malvisto, mal falado…
Safadeza, viadagem, tem pra que fazer isso em público?! Tem pra que dois marmanjos se agarrarem na frente dos outros?! Se atracarem?! E quem achar “normal” tá acobertando uma putaria sem tamanho.
Ver dois homens se beijando provoca gritaria, tumultua, atrapalha a “normalidade”. E se isso for normalizado, eu quero ver o cabaré que vai ser! Quero só vê a putaria que vai virar! Isso não é normal! Não pode ser normal! Não pode ser normalizado! NÃO POOOOOODEEEE!!!
Precisa ser proibido, ser constrangido, ser envergonhado, amedrontado e punido. NÃO PODE NORMALIZAR ISSO!!! NÃO POOOOOODEEEEE!!! Alguma coisa deve ser feita!
Esbravear o ódio, o repúdio é preciso. Porém o grito usado como arma de intimidação, nem sempre funciona. Tem quem grite mais alto. Tem quem grite muito mais alto QUE PODE, SIIIIIIM!!! QUE HOMEM BEIJA HOMEM, QUE MULHER BEIJA MULHER, QUE TRAVESTIS BEIJAM QUEM QUISEREM. E QUAL É O PROBLEMA?! NATURALIZEM ISSO!!!!
Beijar deixa de ser um simples e normalíssimo ato de amor para virar ato político, para se transformar em luta pelo direito básico das afetividades expressadas livremente, mesmo que correndo o perigo do ataque. O beijo público entre dois homens é uma revolução.
O amor sempre será revolucionário! Sobretudo quando ele é explícito, sobretudo quando ele não é normalizado por quem não acha que ele seja natural, sobretudo quando os lábios e corpos colados de dois homens mexem tão visceralmente, tão intrinsicamente com o conservadorismo.
Fico ainda perplexa, surpresa, porém indignada quando vejo tanto ódio diante de uma cena de amor. Porque o amor não pode ser proibido para ninguém, para nenhuma identidade, para nenhuma orientação, para nenhuma performance, para nenhuma existência.
Amor é amor, e, portanto, plural, diverso; é para todos/as/es; é potente, gostoso, safado, pegajoso, (in)decente, (im)próprio, sedutor, barulhento, sensual, provocativo, transformador e mutável; é instrumento de mudanças também; é experimentação. Amor se reinventa, se renova, se expressa como e quando quiser. Amor sopra ventos, ventanias, vendavais. Amor é tsunâmico, é revolucionário, sempre revolucionário!
“Que o leque balance o vento da mudança, porque o novo sempre vem.” Novos amores sempre virão. “Amor é bicho instruído”, já disse Drummond. E que seja ele, o amor, aquilo que sempre me surpreenda bela beleza que ele carrega. Que seja ele, o amor, aquilo que nos surpreenda sempre! “Sobretudo o amor”!
The post Quem tem medo do beijo gay ? appeared first on Saiba Mais.