Reformas no serviço público vão mudar 30 mil cargos ultrapassados

Esplanada dos Ministérios: modernização do funcionalismo

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Agência Brasil

Cargos como datilógrafo e ascensorista são algumas das 30 mil funções consideradas obsoletas pelo governo federal mas que ainda fazem parte do quadro de funções públicos federais. Como parte do projeto da reforma administrativa, a administração pública pretende modificar esses cargos para atender às necessidades atuais.Além de haver cargos efetivamente obsoletos, a avaliação é que não é necessário fazer concurso público para uma série de funções intermediárias que podem ser terceirizadas, como vigias, porteiros e recepcionistas.O Ministério de Gestão e Inovação (MGI) calcula em cerca de 30 mil as vagas de cargos hoje vistos como obsoletos. Além disso, 44.218 dos cargos do Executivo apresentam indícios de que devem ir pelo mesmo caminho. A reformulação faz parte de um processo contínuo na administração pública, explica o secretário de Gestão de Pessoas do MGI, José Celso Cardoso Jr.“São cargos que já foram importantes, mas perderam utilidade. Como os órgãos deixaram de incluí-los nos concursos, precisamos encontrar formas de preservar essas vagas, adaptando-as a funções mais atuais. Em vez de datilógrafo ou ascensorista, um auxiliar administrativo de nível superior, por exemplo”.Para viabilizar as mudanças, o governo publicou em dezembro uma medida provisória, que vai tramitar no Congresso em forma de projeto de lei, que transforma 29,7 mil cargos obsoletos em 28,4 mil vagas novas. A ocupação depende de autorização de concurso e de um novo provimento.“O uso de contratos temporários pode ser uma solução adequada em funções de caráter transitório ou cuja demanda oscile, como atividades de vigilância ou apoio administrativo” avalia o advogado Eduardo Sarlo.A Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), por exemplo, conta com uma série de cargos extintos, conforme listagem no site https://progep.ufes.br/descricao-de-cargos. Segundo a lista de servidores da instituição, uma série desses cargos ainda tem servidores ativos, como é o caso de nove contínuos e três operadores de máquina de lavanderia, por exemplo.A Ufes foi procurada, mas não se manifestou até o fechamento.A Secretaria de Estado de Gestão Recursos Humanos (Seger) informou que há 160 cargos extintos e 90 em processo de extinção, sem previsão de reestruturação para cargos nessa situação. Em 2025, foi concedido reajuste de 10% aos cargos em extinção.O que está nos planosLei vai criar critérios para demissões.> O governo federal prepara, desde 2024, um debate sobre um modelo próprio de reforma administrativa com o objetivo de evitar que o então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), avançasse com a proposta apresentada durante o governo Jair Bolsonaro, em 2020. Mas ainda há poucos detalhes de como seria esse novo modelo do governo federal para a reforma.> Paralelamente a Câmara dos Deputados se prepara para instalar um novo Grupo de Trabalho para discutir o tema, para substituir a PEC32/2020 por uma nova proposta com abordagem distinta e maior viabilidade política .Como é a PEC 32/2020Apesar de provavelmente ser alterada ou substituída por outra proposta, a PEC 32/2020 servirá como base da proposta final e serve para entender como deve ser a eventual reforma administrativa. Nela, estão os seguintes pontos, que podem ser modificados pela nova proposta:1. VínculosNo regime estatutário em vigor, os servidores são titulares de cargos públicos e somentes se distinguem efetivos de comissionados. A PEC prevê diferentes categorias nas unidades em que for adotado o novo regime jurídico de pessoal. A definição de cada grupo será feita por lei complementar, divididos em 4 categorias:> servidores ocupantes de cargos típicos de Estado;> servidores ocupantes de cargos não classificados como típicos de Estado;> servidores ocupantes de cargos de liderança e assessoramento;> cidadãos inscritos em concursos públicos no exercício de funções imputadas aos cargos que postulam, sem que sejam titulares ou estejam investidos.2. EstabilidadeEstabilidade: passa a ser restrita aos servidores em cargos típicos de Estado. Para adquiri-la, o servidor deverá passar pelo vínculo de experiência e permanecer, por 1 ano, em efetivo exercício com desempenho satisfatório.Demissão: a demissão poderá ocorrer por decisão judicial de órgão colegiado, em vez de depender do trânsito em julgado, como ocorre atualmente. Além disso, a demissão por insuficiência de desempenho será regulamentada por critérios definidos em lei federal, que também estabelecerá as condições para perda de cargo em funções que não sejam consideradas típicas de Estado.Desligamento por motivos políticos: servidores com vínculo temporário ou em cargos públicos não poderão ser desligados por motivos político-partidários, exceto para cargos de liderança ou assessoramento.Estabilidade para servidores atuais: servidores que já ocupam cargos públicos no momento da promulgação da PEC manterão a estabilidade. No entanto, deverão ser avaliados periodicamente quanto ao seu desempenho. A avaliação de desempenho será regulamentada por uma lei ordinária e poderá resultar em demissão caso o servidor não tenha um desempenho satisfatório.Aplicação uniforme dos critérios de avaliação: servidores que já estiverem em exercício na data de vigência da nova sistemática serão submetidos aos critérios de avaliação de desempenho aplicáveis aos servidores de cargos típicos de Estado. A principal mudança é a uniformização da avaliação para todos, eliminando a diferenciação anterior.3. Contrato temporárioA PEC autoriza contratações temporárias por seleção simplificada: em caso de calamidade, emergência, paralisação de serviços essenciais ou acúmulo temporário de trabalho. Para atividades, projetos ou demandas de caráter temporário ou sazonal, com prazo de contrato previamente definido. Para execução de atividades ou serviços realizados conforme a demanda.4. Concursos públicosA PEC mantém a exigência de concurso público para empregos permanentes, com uma segunda etapa de “vínculo de experiência” que determinará a classificação final.A etapa vai durar pelo menos 1 ano para cargos não típicos de Estado e 2 anos para cargos típicos de Estado.5. Liderança e assessoramentoCom a PEC, deixam de existir os “cargos em comissão de livre provimento e exoneração” e as “funções de confiança” previstos atualmente na Constituição. Serão ambos substituídos por “cargos de liderança e assessoramento”, destinados a atribuições estratégicas, gerenciais ou técnicas. Critérios mínimos de acesso e exoneração serão estabelecidos por ato do chefe de cada Poder. É possível que os titulares no novo sistema desempenhem atividades atualmente exclusivas de servidores efetivos.6. Acúmulo de cargos Militares e servidores de carreiras típicas de Estado só poderão acumular funções como docência ou na saúde. Outras atividades remuneradas serão proibidas.Exceção: municípios com até 100 mil eleitores.Para os demais, será permitida a acumulação de cargos, desde que os horários sejam compatíveis. Hoje, isso vale apenas para docentes e profissionais da saúde.7. Limitação de vantagensA PEC proíbe a concessão a servidores públicos de: Férias acima de 30 dias anuais; Adicionais por tempo de serviço; Aumentos retroativos de remuneração; Licença-prêmio ou licença-assiduidade, exceto para capacitação; Redução de jornada sem redução proporcional de salário, exceto por questões de saúde; Indenização por substituição, salvo para cargos em comissão ou função de confiança; Progressão ou promoção por tempo de serviço; Parcelas indenizatórias sem requisitos legais, exceto para empregados de estatais.8. Novos princípiosA PEC 32/20 acrescenta novos princípios para o funcionamento da administração pública: imparcialidade, transparência, inovação, responsabilidade, unidade, coordenação, subsidiariedade e boa governança pública A Constituição atualmente inclui cinco princípios, que serão mantidos no novo texto: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiênciaLiberado contratar sem estabilidadeO Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que é constitucional a emenda que permite a contratação de servidores públicos via CLT, sem estabilidade. O advogado e professor Diego Pimenta Moraes explica que a decisão extingue a obrigatoriedade de um regime único.“Isso não significa que todos vão mudar a forma de contratação. Mas que há a possibilidade dos entes políticos não terem mais um único regime. Dessa forma, eles vão poder ter um regime estatutário, em conjunto com um regime celetista”.Moraes destaca que as novas regras valem apenas para futuros concursos. “Um aspecto importante é que o Supremo afirmou não ser possível a mudança dos regimes dos atuais servidores, ou seja, os atuais servidores que são estatutários vão permanecer como estão”.Ele lembra que o celetista não tem estabilidade, mas tem direitos como 13º, FGTS e seguro-desemprego.O advogado Guilherme Machado diz que nem todos os cargos poderão ser celetistas e que, mesmo sem estabilidade, “no caso do serviço público, o desligamento ainda precisará ser motivado por um fato”.

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