Mãe que perdeu o bebê após ter cesárea negada: “Nada vai trazer Heitor de volta”
| Foto:
Acervo Pessoal
“Nada vai trazer meu Heitor de volta, mas vou lutar até o fim por justiça”. Essas foram as afirmações que a atendente Isabelly Rossi, de 18 anos, fez à reportagem, ao relembrar as mais de 12 horas tentando dar à luz o filho, por meio de um parto normal, quando estava com 39 semanas e cinco dias de gestação, e teve o pedido por uma cesárea negado.A Tribuna – Durante sua gestação, você tinha alguma restrição quanto ao tipo de parto? Isabelly Rossi – Restrição não, mas foi recomendado pelo médico do pré-natal que eu fizesse uma cesárea, pois o Heitor era muito grande. Eu estava com início de diabetes gestacional, e ele já estava com 52 cm e quatro quilos.O que aconteceu no dia do parto?No dia 27, fui ao hospital. Estava com a glicemia muito alta e pedi por uma cesárea. Como estava com dois centímetros de dilatação, voltei para casa. Quando deu 0h40, voltei com dor para o hospital. O pai do meu filho explicou a situação, pedi pela analgesia e cesárea, e me negaram. Por volta de 10h20, eu estava com 8 cm, e me sugeriram ocitocina. Eu autorizei. Às 12h30 do dia 28 cheguei a 10 cm, e dava para ver a cabecinha dele, mas tinha o colo do útero, onde foi preciso tirar para ele descer, mas ele não desceu o bastante.Eu fiquei fazendo força, mas ele não desceu. Então a médica veio com o extrator a vácuo. Eu perguntei se isso iria machucar meu bebê ou me machucar, mas disseram que não. Usaram três vezes, mas não deu certo e fomos para a cesárea.Como foi a cesárea?Rápida. Heitor nasceu, chorou, abriu os olhos. Mas vieram me falar de uma suposta cardiopatia. Ele foi levado ao berçário e, quando minha sogra tirou a touca dele, viu que tinha algo errado. Ele ficou uma hora com vida. Qual foi a causa da morte?A médica assinou como “cardiopatia congênita”, mas, ao pedir que fosse feito um laudo, a perícia concluiu que a morte foi decorrente de hemorragia intracerebral, devido a traumatismo cranioencefálico. As lesões não necessariamente foram provocadas por trauma direto, mas sugere-se que a força que ele fez no canal de parto pode ter causado a fatalidade. O modo que o parto foi feito custou a vida do meu filho. Elas erraram e vão ter de pagar. Hospital afirma que seguiu protocolos clínicosPor meio de nota, o hospital São Camilo, em Aracruz, informou que manifesta a “mais profunda solidariedade e respeito à família do bebê Heitor, que veio a óbito, em nosso hospital, no dia 28 de dezembro de 2024”.Disse ainda que a mãe do bebê foi admitida em trabalho de parto e, durante todo o processo, a “equipe seguiu protocolos clínicos baseados nas melhores práticas da literatura médica, com o objetivo de garantir a segurança da mãe e do bebê”.Segundo o hospital, o caso está sendo analisado “com a devida seriedade”. Afirmou também “garantir que todos os aspectos sejam avaliados com transparência”.Procurado, o Conselho Regional de Medicina do Estado (CRM-ES) informou que todas as denúncias recebidas e casos com repercussão pública são rigorosamente apurados e aberta sindicância, mas não se manifesta sobre casos concretos, a não ser nos autos.“A sindicância tem como objetivo verificar os fatos e, se houver indícios suficientes de infração ao Código de Ética Médica, poderá resultar na abertura de um Processo Ético Profissional”.Segundo a Polícia Civil, não houve representação pela prisão das médicas, pois não estão presentes os requisitos para decretação da prisão preventiva. Acionado, o Ministério Público do Estado (MPES) informou que aguarda o recebimento do inquérito para análise de toda a documentação e posterior adoção das providências cabíveis.Direitos da gestanteMédicos podem forçar mães a fazer parto normal? Não. Tendo em vista o disposto nos artigos 22 e 24 do Código de Ética Médica, os médicos são obrigados a respeitar a autonomia das pacientes, segundo explica a advogada Francesca Avanza.Os médicos, afirma Francesca, são livres para atuar sem o consentimento das pacientes apenas em casos de risco iminente de morte.Quando os médicos podem recusar a cesárea?A equipe médica pode recusar a realização da cesariana, de acordo com a advogada Fernanda Ronchi, quando houver justificativa clínica clara de que o procedimento implicaria risco desnecessário ou superior ao do parto normal, ou quando a cesariana for solicitada fora do tempo gestacional recomendado (antes da 39ª semana sem indicação médica, por exemplo). Nesses casos, a recusa deve ser devidamente fundamentada e registrada no prontuário, e a paciente deve ser orientada com clareza sobre os motivos e alternativas.Quando há um alerta sobre possíveis riscos, a recomendação é que a equipe avalie cuidadosamente a situação e registre suas decisões de forma clara.