Gravidez na adolescência: Em 2024, Marabá registrou 663 partos em menores de 19 anos

Entre 2015 e 2024, Marabá liderou os registros de partos entre adolescentes em toda a região de Carajás. Dos 46.223 nascimentos no município nesse período, 9.414 foram de mães com menos de até 19 anos

A frase “medo de engravidar na adolescência”, repetida como meme nas redes sociais por mulheres adultas, pode até parecer inofensiva. Mas por trás do humor, esconde-se um problema de saúde pública, que é também uma realidade grave e persistente no Brasil: a maternidade precoce. Só em 2024, foram registrados 258.631 partos de mães adolescentes no país, segundo o Painel de Monitoramento de Nascidos Vivos do Ministério da Saúde (MS). O número alarmante escancara não apenas a falta de acesso a métodos contraceptivos, mas também a violência sexual contra meninas.

A adolescência, para o MS e a Organização Mundial da Saúde (OMS), compreende dos 10 aos 19 anos, 11 meses e 29 dias. E é nesse recorte que os dados coletados pelo Correio de Carajás revelam um panorama inquietante: entre 2015 e 2024, Marabá liderou os registros de partos entre adolescentes em toda a região de Carajás. Dos 46.223 nascimentos no município nesse período, 9.414 foram de mães com menos de até 19 anos.

Ao analisar a série histórica, a reportagem observou que a proporção de partos em adolescentes em Marabá caiu de 24,76% em 2015 para 16,80% em 2024. No entanto, essa redução não foi contínua.

Entre 2015 e 2020 o percentual de nascimentos chegou a 18,85%, mas, nos dois anos seguintes — período de isolamento social imposto pela pandemia de covid-19 — os números voltaram a subir. Em 2020 foram registrados 42 partos de mães com até 14 anos, no ano seguinte, 2021, esse número subiu para 53. Em 2022 tornou a cair, chegando a 40.

Na faixa etária de 15 a 19 anos, foram registrados 824, 848 e 774 partos nos anos de 2020, 2021 e 2022, respectivamente. Os dados merecem atenção, uma vez que o aumento coincide com o agravamento da violência sexual no período da pandemia, já que muitas meninas ficaram confinadas em lares inseguros, submetidas a seus agressores.

DADOS QUE ALERTAM

A pausa na redução pode refletir tanto os efeitos desse isolamento, quanto a fragilidade das políticas públicas voltadas à saúde sexual e reprodutiva.

O aumento da gravidez precoce entre 2020 e 2022 acompanha uma realidade nacional sombria. De acordo com o Boletim Epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, em 2020, houve queda nas notificações de violência sexual contra crianças e adolescentes, não por redução real dos casos, mas por subnotificação. O fechamento de escolas e a redução dos atendimentos em saúde, principais canais de denúncia, silenciaram histórias de abuso.

Já em 2021, com o relaxamento parcial do isolamento social e a retomada do acesso a essas redes de apoio, o país registrou o maior número de notificações de violência sexual infantil dos últimos sete anos. A maioria das vítimas eram meninas (92,7%), entre 10 e 14 anos. Em mais de 70% dos casos, o abuso ocorreu dentro de casa, e em quase metade, o agressor já havia abusado anteriormente.

Os dados revelam que 76,8% das vítimas eram meninas; 57% dos casos foram classificados como estupro; 65,9% ocorreram dentro da residência; 38,9% dos agressores eram familiares; 80% dos abusadores eram homens. A maioria das vítimas era negra (pretas e pardas), de regiões com acesso limitado a serviços especializados.

Nesse cenário, os dados locais dialogam diretamente com o cenário nacional. A faixa etária entre 0 e 14 anos registrou números preocupantes nos últimos cinco anos em Marabá: 42 em 2020, 53 em 2021, 40 em 2022, 35 em 2023 e 43 em 2024. Essas gestações, além de serem juridicamente classificadas como resultado de estupro de vulnerável, são a expressão mais brutal da violação de direitos básicos.

E, apesar da tendência de queda, os números absolutos de partos de mães adolescentes continuam altos. Em 2024, foram registrados 663 partos de meninas com até 19 anos. Ao compararmos o ranking da região de Carajás, Marabá aparece à frente de Parauapebas (7.978 partos de adolescentes) e Canaã dos Carajás (2.602), consolidando-se como o epicentro da maternidade precoce no sudeste do Pará.

Nesse ponto, é importante ressaltar que embora esse volume de nascimentos tenha acontecido em Marabá, o município recebe parturientes de diversos municípios por ter a única maternidade pública da região, o Hospital Materno Infantil (HMI).

A gravidez precoce, especialmente em meninas tão jovens, é consequência de fatores estruturais: desigualdade social, negligência estatal e violência de gênero. Ela denuncia falhas na educação sexual, na rede de acolhimento e no acesso a políticas públicas. Exige respostas integradas, não apenas estatísticas. O ‘medo da gravidez na adolescência’ não é apenas um meme da internet, é uma realidade enfrentada por centenas de mães marabaenses.

(Luciana Araújo)

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