“Domínio do parlamento sobre orçamento do Executivo torna Brasil ingovernável”

Jornalista José Osmando de Araújo:

“As espantosas deformações que o Brasil vem apresentando nas relações entre o Poder Executivo e o Parlamento, diante do crescente avanço do domínio do Legislativo sobre o orçamento do governo federal, ficam bem demonstradas quando olhamos para os números. 

Em 2019, quando o ex-presidente Jair Bolsonaro começou o mandato e iniciou esse o processo de rendição aos legisladores – inaugurando  um presidencialismo de coalizão que se expõe como disfuncional, prejudicial ao país e imoral sobre vários aspectos-, o valor das emendas orçamentárias tinham uma dotação de R$ 13,5 bilhões, passando facilmente para R$ 35,9 bilhões em 2020.

De um ano para o outro, como se verifica, o valor dos recursos orçamentários passado às mãos de deputados e senadores para sua utilização na forma de emendas, registra um acréscimo de robustos 165%, daí implantado-se uma prática que jamais ficaria nos mesmos patamares, impossível de recuo. 

Já sob o Governo Lula, entre 2024 e 2025, esse patamar, no aspecto numérico, mudou de patamar, (crescendo menos, se for feita a comparação com período anterior) numa proporção de  29% entre 2023 e 2024, e ficando em 13% de elevação para o orçamento atual de 2024/2025.

Mesmo com a retração forçada pelo Governo Lula e equipe comandada por Fernando Haddad, o atual montante das emendas orçamentárias, cujo valor no momento é de R$ 50,4 bilhões, é algo inadequado e ofensivo à governabilidade, pois esse método de relação entre os dois poderes coloca os agentes do Executivo no canto da parede, sendo forçados a mandar sempre mais dinheiro para as gastanças parlamentares, sob pena de ficarem em visível imparidade de governar e de ver matérias importantes de interesse público permanentemente engavetadas.

E tão ruim quanto não aprovar os projetos de interesse da Nação- como se viu nas dificuldades enormes para aprovação da LDO  de 2025, ou na paralisação do projeto que concede isenção fiscal do IR às pessoas que recebem até R$ 5 mil por mês- é o “meio chantagem” adotado pelas Casas Legislativas, de ameaçar o Governo e até as instituições com aprovação de projetos gestados por setores de oposição e segmentos extremados da direita, que ameaçam direitos adquiridos pelos cidadãos e sinalizam para riscos enormes a instituições constitucionalmente estabelecidas.

A realidade atual do Brasil mostra que os pesos e contrapesos nas relações de equilíbrio entre Executivo e Legislativo estão servindo a cada dia para controlar, inibir e até mesmo impedir o poder do Executivo, nunca do Legislativo. E isso ficará inegociável se permanecer nos níveis das práticas dominantes. 

Veja-se, por exemplo, que tem cabido em diversos momentos a intervenção dura do Judiciário para frear a ganância do Legislativo, como acontece no caso das emendas orçamentárias, notadamente das emendas PIX, que estão com valores próximos a R$ 7 bilhões suspensos, impedidos de pagamento, por decisão do Ministro Flávio Dino. São R$ 4,3 da Câmara Federal e R$ 2,5 bilhões do Senado.

Esses  valores, aliás, estão suspensos não porque o Governo tenha se negado a pagar. Mas em face da constatação feita pelo Tribunal de Contas da União, de que esses valores estavam bichados, com sua destinação feita de maneira irregular, através de emendas PIX, sem que houvesse o nome de quem indicou cada emenda e sem que se saiba em que ações, nos Estados e Municípios, seriam aplicadas, portanto, livres de qualquer fiscalização e acompanhamento. 

Começando pelo famigerado orçamento secreto, uma instituição que consolidou o poder interno exacerbado do então presidente da Câmara, esse processo de garroteamento do executivo tornou-se possível graças à capitulação do ex-Presidente da República às imposições do Legislativo, daí surgindo as tais emendas PIX, caminho fácil para substituir o orçamento secreto que fora detonado.

O quadro atual mostra o Brasil como ingovernável, com o deslocamento da capacidade de gestão pública sobre os orçamentos da União. A cada dia o governo federal torna-se mais frágil na sua tarefa de planejar e executar obras e serviços públicos, por redução do poder sobre as contas, ficando refém de articulações políticas que se dão dentro do Parlamento, e que mudam de rumo e força na medida em que cada  necessidade do governo é a eles exposta.

Mesmo com as recentes trocas de comando no Senado e na Câmara e a posse de novos mandatários, com maior capacidade de diálogo, temos, de fato, um Presidencialismo de Coalizão ao avesso, de ponta-cabeça, que só vem servindo aos anseios e e ao interesse de mando de deputados e senadores, com especial destaque às questões financeiras.”

 

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