Antes de alcançar reconhecimento internacional, Heitor Villa-Lobos viveu um período pouco documentado, porém significativo, na cidade de Paranaguá, entre os anos de 1905 e 1912. Embora raramente tenha feito menção a essa etapa de sua trajetória em entrevistas, sua presença deixou marcas profundas na vida cultural local.
Após deixar o Rio de Janeiro, o jovem músico fixou-se inicialmente em Niterói, na região de Gragoatá. Posteriormente, dirigiu-se ao litoral paranaense, estabelecendo-se em Paranaguá. Na cidade, chegou a trabalhar em uma fábrica de banana glacê e, gradualmente, integrou-se ao cotidiano e à vida artística local.
Dotado de espírito empreendedor e profundamente dedicado à música, Villa-Lobos organizou um conjunto de jovens instrumentistas e realizou, em 26 de abril de 1908, seu primeiro concerto oficial no antigo Theatro Santa Celina — evento que se tornou um marco na história cultural do município. Atuou, ainda, na “Banda de Música Estudantina”, posteriormente transformada na “Orquestra Estudantina Paranaguense”, integrada por músicos como Celmiro Lobo, Aníbal Ribeiro, Jacob Weiss, Benedito Nicolau dos Santos, entre outros.
O compositor também participou da Banda da Associação dos Empregados do Comércio, que se apresentava nos tradicionais bailes promovidos pela “Sociedade Dançante Brisa da Marinha”, realizados nos elegantes salões do Club Litterário — importante centro da vida social e cultural parnanguara.
Durante esse período, Villa-Lobos exerceu diversas atividades no comércio local, tendo trabalhado em firmas como Elísio Pereira & Cia. e na empresa pertencente à família Veiga. Em uma dessas casas comerciais, desempenhou a função de caixeiro-viajante por aproximadamente um ano e meio. Paralelamente, envolveu-se em relacionamentos amorosos — segundo relatos, teria se apaixonado por jovens pertencentes às famílias Elísio Pereira e Veiga. Esses envolvimentos deram origem a histórias e rumores entre os habitantes da cidade, que viam em Villa-Lobos um jovem talentoso, carismático e de temperamento inquieto.
Sem recursos financeiros para retornar ao Rio de Janeiro, contou com o apoio de amigos parnanguaras, que se mobilizaram para angariar fundos e viabilizar sua partida — gesto que evidencia o apreço e a admiração conquistados por ele junto à comunidade.
Atualmente, o Club Litterário orgulha-se de haver acolhido, em seus salões, as manifestações artísticas iniciais de um dos maiores compositores da história da música brasileira, que, antes da consagração internacional, viveu de forma intensa entre os músicos e a efervescente cultura de Paranaguá.
E você, leitor, poderia imaginar que este grande maestro viveu em nossa cidade?
Portanto, ao passar pela Praça Fernando Amaro e olhar para aquele edifício ao lado da Caixa Econômica, é importante recordar que ali se apresentaram grandes personagens de nossa história.
RIBEIRO FILHO, Anibal. História do Club Litterario 1871-1972. 1. ed. Paranaguá: [s. n.], 1972. 461 p.