A reação dos bolsonaristas do RN ao Oscar de “Ainda Estou Aqui”

A reação dos parlamentares bolsonaristas do Rio Grande do Norte à conquista do Oscar de “Melhor Filme Internacional” pelo longa-metragem brasileiro “Ainda Estou Aqui” variou do silêncio à tentativa de estabelecer uma falsa equivalência entre as vítimas dos crimes cometidos pela ditadura militar (1964-1985) e a situação dos extremistas condenados pela tentativa de golpe de estado em 8/1/2023.

O deputado federal Sargento Gonçalves (PL) preferiu ignorar em suas redes sociais a premiação inédita para o Brasil. Já o seu colega General Girão (PL) felicitou os “autores e atores” do filme pela conquista do Oscar, mas comparou o período da ditadura, denunciada no longa-metragem, à conjuntura atual do Brasil.

Para Girão, “nunca na história desse país tivemos tanta perseguição e prisões injustas”. “Nós brasileiros conservadores e patriotas merecemos premiar outro filme ainda não produzido: Ainda Estamos Aqui”, escreveu o deputado, acrescentando que quer “a verdade sobre o 8/1/2023”.

“Ainda Estou Aqui” é baseado no livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva, filho do ex-deputado Rubens Paiva, morto nos porões da ditadura millitar brasileira. Foto: Divulgação

Em janeiro, Girão foi condenado pela Justiça Federal no Rio Grande do Norte a pagar R$ 2 milhões por danos morais coletivos ao incentivar atos antidemocráticos no país após o resultado da eleição presidencial de 2022. A Ação Civil Pública que originou a condenação foi aberta pelo Ministério Público Federal (MPF).

Depois da condenação, o ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito dos atos antidemocráticos de 2023, solicitou o envio de cópia da decisão ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Alexandre de Moraes destacou que o deputado potiguar é alvo do inquérito que investiga sua “possível participação nos atos antidemocráticos ocorridos em 8/1/2023”, que apura ainda a “possibilidade de caracterização dos crimes de associação criminosa, incitação ao crime, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado”.

Postura semelhante teve o senador Rogério Marinho (PL), que não comentou diretamente o prêmio de “Ainda Estou Aqui”, mas compartilhou no X, antigo Twitter, uma mensagem de um advogado para quem a “situação atual do país não é menos grave nem menos violenta que a das telas”, comparando o presente aos anos de horror do regime militar de 1964, marcados pela repressão, tortura e morte de milhares de brasileiros.

O senador potiguar tem sido uma das vozes mais insistentes em defesa da anistia para os condenados de 8/1/2023. Para Rogério Marinho, apesar das provas apresentadas na denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), acusado de ser o orquestrador da tentativa de golpe de estado, o líder da extrema-direita não passa de um “perseguido político”.

Em seus apelos públicos em defesa da anistia, Rogério Marinho repete que a anistia “é o único caminho para pacificar o país”, mesmo argumento usado pelos que, no passado, defenderam a impunidade aos torturadores do regime militar de 1964.

Ainda Estou Aqui

O filme do diretor Walter Salles é baseado no livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva, filho da advogada Eunice Paive, que foi casada com o ex-deputado Rubens Paiva, sequestrado, torturado e assassinado nos porões da ditadura militar em 1971. Os restos mortais dele nunca foram encontrados.

Eunice, interpretada no filme pela atriz Fernanda Torres, se transformou em símbolo de resistência contra a ditadura militar em razão da sua luta incansável por justiça, pela verdade e pela memória.

Eunice Paiva exibe a declaração de óbito do marido, Rubens Paiva, preso, torturado e morto na ditadura militar de 1964. Foto: Reprodução

O reconhecimento oficial do assassinato de Rubens Paiva só aconteceu décadas depois, graças aos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, criada em 2012 pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Os militares acusados da morte dele, apesar de identificados, nunca foram condenados.

Ao receber o Oscar, no último domingo (2), Walter Salles dedicou o prêmio a Eunice Paiva. “Isso vai para uma mulher que, depois de uma perda tão grande em um regime tão autoritário, decidiu n~eo se dobrar e resistir”, discursou.

Transição incompleta

O caso de Rubens Paiva é um exemplo de como a transição brasileira da ditadura para a democracia deixou lacunas que até hoje não foram preenchidas. O país nunca fez um acerto de contas com o seu passado autoritário. Em vez disso, em nome da pacificação nacional, ofereceu anistia aos criminosos da ditadura.

Livres da responsabilidade histórica, os saudosos do regime militar, que até pouco tempo homenageavam torturadores e pediam um novo AI-5, ao voltarem ao poder através do voto tentaram dar outro golpe e agora pedem uma nova anistia.

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