Investigados negam haver provas de “abuso de poder político e econômico”

As defesas do ex-prefeito Álvaro Dias e dos vereadores Daniell Rendall e Irapoã Nóbrega, ambos do Republicanos, afirmaram não haver provas de abuso de poder econômico e político contra eles nas eleições de 2024, como apontado pela investigação do Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN). De acordo com a denúncia, o esquema mobilizou toda a estrutura da gestão municipal, com o loteamento de praticamente todos os órgãos e secretarias municipais, além da cooptação de empregados terceirizados e servidores comissionados, para beneficiar o então candidato a prefeito Paulinho Freire (União Brasil) e sua vice Joanna Guerra (Republicanos), além dos próprios Rendall e Irapoã.

Álvaro Dias, apontando como o chefe do esquema de uso da máquina pública pelo Ministério Público, se disse “surpreso” com as notícias sobre “supostas irregularidades eleitorais no último pleito”. O ex-prefeito repudiou o que chamou de “tentativa de subverter a ordem democrática e a soberania da decisão popular”.

De acordo com Álvaro Dias, a eleição de 2024, “transcorreu dentro da legalidade, lisura e normalidade estabelecida pelo estado democrático de direito que o povo reconquistou nas ruas, havendo a proclamação, diplomação e posse dos eleitos pela Justiça Eleitoral”.

“Portanto, a eleição recente para prefeito de Natal, representa mais uma manifestação indiscutível da decisão popular, consolidando a democracia no nosso país”, completou a nota do ex-prefeito de Natal.

O vereador Daniell Rendall também emitiu nota assinada pela sua assessoria jurídica afirmando que ele tem “vê com tranquilidade o procedimento citado” e que as “denúncias tratadas no processo em referência já foram arquivadas anteriormente, em outros procedimentos instaurados pelo próprio Órgão Ministerial”.

“No caso, inexiste qualquer elemento de prova que sustente as acusações de abuso de poder político ou econômico, ainda que indiciárias. O candidato participou de todo o processo eleitoral com a mais absoluta transparência e respeito às normas postas e o vereador eleito está confiante no desfecho processual”, diz trecho da nota.

Quem também se disse tranquilo com a ação do Ministério Público foi o vereador Irapuã Nóbrega, segundo quem sua defesa “já demonstrou a fragilidade técnica da acusação, destacando que os fatos narrados são anteriores ao período eleitoral e que já havia se desligado da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SEMSUR) desde abril de 2024, seis meses antes do pleito”.

“O parlamentar reafirma sua confiança na Justiça Eleitoral e a defesa comprovará não haver elementos que caracterizem abuso de poder político ou econômico capazes de afetar a normalidade e legitimidade das eleições, requisitos essenciais para configuração do ilícito eleitoral”, disse a defesa do parlamentar.

As provas do Ministério Público

A ação do Ministério Público, no entanto, lista uma série de provas contra os acusados, que inclui depoimentos, documentos apreendidos, gravações de áudios e prints de conversas em grupos de WhatsApp, confirmando o uso da máquina pública nas eleições municipais de 2024.

Em um dos trechos da denúncia, ação afirma que “toda a estrutura da gestão do prefeito Álvaro Dias foi convocada para, no âmbito de suas respectivas secretarias, órgãos e entidades, direcionarem a atuação da máquina administrativa municipal, no afã de beneficiar os candidatos apoiados pelo prefeito, notadamente, em favor do candidato Sr. Paulinho Freire e da vice-prefeita, Sra. Joanna Guerra”.

As evidências coletadas pelo Ministério Público, apresentadas ao longo das 143 páginas da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), apontam que o modus operandi do esquema de uso da máquina pública era operacionalizado através da criação de grupos de WhatsApp, onde eram incluídos empregados terceirizados e servidores comissionados, “que eram gerenciados por secretários, operadores de campanha, ou mesmo pelo próprio candidato”.

Através dos grupos, as pessoas eram informadas sobre o dia e a hora dos eventos políticos, para os quais eram obrigadas a comparecer, em favor dos candidatos a vereadores apoiados pelo ex-prefeito Álvaro Dias, bem como do seu candidato a prefeito Paulinho Freire e da candidata a vice Joanna Guerra.

A presença era controlada através de listas com o nome da pessoa, o número de contato e o cargo que ocupava na gestão municipal ou na empresa terceirizada. Para demonstrar o apoio aos candidatos, segundo o Ministério Público, as pessoas eram obrigadas a compartilhar conteúdo de campanha em suas redes sociais. Em caso de não comparecimento aos eventos ou da não demonstração de pública de apoio, os terceirizados e comissionados eram sumariamente demitidos.

De acordo com o Ministério Público, ficou “claramente constatado” que os agentes políticos, incluindo secretários, operadores de campanha ou mesmo o próprio candidato, foram “designados” para cooptar “os servidores comissionados e empregados terceirizados a eles subordinados” para participarem dos eventos de campanha de Paulinho Freire e Joanna Guerra, “como também em favor dos vereadores por aqueles apoiados, a partir do loteamento das secretarias”.

Esquema teve “ordem e concordância” de Álvaro Dias

O Ministério Público sublinhou, ainda, que o uso da máquina pública para favorecer a candidatura de Paulinho e Joanna Guerra, além dos vereadores eleitos Daniell Rendall e Irapoã Nóbrega, “não seria possível sem que houvesse a ordem e concordância do prefeito Álvaro Dias”.

“Houve a articulação de praticamente todos os órgãos/pastas e entes vinculados à administração do Prefeito Álvaro Dias no afã de apoiar a candidatura do Sr. Paulinho Freire e da Sra. Joanna Guerra”, cita trecho da ação, acrescentando que os vereadores eleitos Daniell Rendall e Irapoã Nóbrega foram beneficiados pelo “loteamento das secretarias do município”.

Em outro trecho da ação, é destacado que “a magnitude do esquema de favorecimento dos candidatos apoiados pelo prefeito de Natal, Álvaro Dias, perpassou toda a estrutura de pessoal de servidores comissionados e empregados terceirizados que laboram junto à máquina municipal, atingindo diretamente as famílias que dependiam do trabalho em questão para a respectiva subsistência, fato esse multiplicador de votos”.

A ação destaca, ainda, que a obrigatoriedade imposta aos empregados terceirizados e aos cargos comissionados para compartilhar em suas redes sociais o apoio às candidaturas apoiadas pelo ex-prefeito Álvaro Dias “alastrou de forma exponencial a influência política, em razão da força cogente da estrutura pública sob seus subordinados, ferindo, por conseguinte, a lisura e equidade do pleito Municipal de 2024”.

Igreja foi usada para fazer campanha disfarçada

A ação do Ministério Público cita que até mesmo a sede da Igreja Católica da Comunidade Cidade Praia foi usada para fazer campanha disfarçada para o então candidato a vereador Daniell Rendall, que era Diretor de Recursos Humanos da Secretaria Municipal de Educação na gestão do ex-prefeito Álvaro Dias.

De acordo com a denúncia, os funcionários dos CMEIs (Centros Municipais de Educação Infantil) e das escolas municipais da Zona Norte foram convocados por uma das coordenadoras da campanha de Daniel Rendall, Andreia Kátia, diretora do Cemei Stella Lopes, “para participarem de evento político” disfarçado de “gincana” na sede da igreja, “onde constava no local a presença de uma lista obrigatória para assinatura”.

A ação também cita que, com base nos documentos apreendidos na Secretaria Municipal de Educação pela ação realizada pelo Ministério Público no dia 7 de dezembro de 2024, “constatou-se que a referida servidora registrava em sua agenda pessoal as datas de reuniões relacionadas ao candidato Daniell Rendall, bem como as programações vinculadas a sua agenda política”.

Na agenda da servidora, foram encontradas referências a uma reunião com a participação da então candidata a vice-prefeita Joanna Guerra, do deputado estadual e filho do ex-prefeito Álvaro Dias, Adjuto Dias (MDB) e da secretária municipal de Educação, Cristina Diniz.

O Ministério Público afirma que os funcionários da Secretaria Municipal de Educação “eram colocados diante de uma escolha coercitiva: apoiar o candidato consentido pelos gestores escolares, qual seja, Daniell Rendall, ou enfrentar a possibilidade de demissão sumária”.

“Isto corrobora com o entendimento de que havia uma organização estruturada em cada secretaria municipal, por meio da qual eram realizadas convocações de servidores comissionados e funcionários terceirizados para participação de atos de campanha coordenados entre a gestão municipal, os secretários dos órgãos municipais e os candidatos apoiados pela esfera de governo”, cita trecho da ação.

O Ministério Público conclui que Daniell Rendall “valeu-se do seu cargo de Diretor de Recursos Humanos da Secretaria Municipal de Educação para lograr apoio político em benefício próprio e de terceiro (do candidato a Prefeito, Sr. Paulo Eduardo da Costa Freire e da candidata a Vice-Prefeita, Joanna Guerra), por meio de influência dirigida aos empregados terceirizados a ele subordinados”.

Abuso de poder político e econômico na Semsur

O Ministério Público indicou, com base em depoimentos colhidos durante a investigação, que havia um esquema de abuso de poder político e econômico montado na Semsur (Secretaria Municipal de Serviços Urbanos) para favorecer as candidaturas de Paulinho Freire, Joanna Guerra e Irapoã Nóbrega.

O esquema, segundo o MP, objetivava “influenciar/coagir os servidores/terceirizados a prestarem apoio político” aos candidatos apoiados pelo ex-prefeito Álvaro Dias.

“Nessa esteira, é interessante notar que o Sr. Irapoã Nóbrega Azevedo de Oliveira foi secretário da Semsur da atual gestão municipal [do ex-prefeito Álvaro Dias], desincompatibilizando-se do cargo para concorrer nas eleições de 2024 a vereador de Natal em 05 de abril de 2024”, sublinha a ação.

O Ministério Público apontou a existência de “elementos de prova de abuso de poder político e econômico”, que segundo a ação consista na “ameaça aos empregados terceirizados no sentido de que a manutenção de seus cargos estaria condicionada ao efetivo apoio político” em favor das candidaturas de Irapoã, Paulinho Freire e Joanna Guerra.

Os depoimentos colhidos na investigação, ainda segundo o MP, “apontam que as ameaças de demissões foram ultimadas algumas vezes diretamente por parte do Sr. Irapoã Nóbrega Azevedo de Oliveira ou mediante intermédio de servidor da SEMSUR ou ainda em reuniões coletivas”.

Os trabalhadores lotados na Semsur, segundo os relatos ouvidos pelo Ministério Público, temiam “perderem seus empregos/cargos, ante as ameaças diretas e indiretas recebidas, como também dos casos de demissões realizadas”.

“Essa afirmação é reforçada ante o fato de as reuniões serem seguidas pela distribuição de listas de presença atestando o comparecimento do servidor comissionado e do empregado terceirizado a fim de se ter o controle sobre quais funcionários efetivamente compareciam aos atos. Os relatos foram comprovados através das listagens apreendidas na busca e apreensão realizada na sede do Partido Republicanos”, descreve o Ministério Público.

As listas apreendidas na sede do Republicanos, partido do ex-prefeito Álvaro Dias, da atual vice-prefeita Joanna Guerra e dos vereadores Daniell Rendam e Irapoã Nóbrega, continham os nomes dos servidores comissionados e empregados terceirizados que eram coagidos a participarem dos eventos de campanha dos investigados.

Cada listagem, ainda conforma a descrição do Ministério Público, era acompanha do nome do gestor da respectiva pasta/órgão/entidade, responsável pela mobilização dos servidores terceirizados e servidores comissionados.

Na sede do partido, também foram apreendidos documentos com a marcação de reuniões políticas nas secretarias municipais em favor das candidaturas de Paulinho Freire e Joanna Guerra. As reuniões, segundo o MP, tinha como objetivo levantar as demandas da população que precisavam ser resolvidas, a fim de reverter isso em apoio para a chapa apoiada pelo ex-prefeito Álvaro Dias.

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