TIC´s, IA´s e outras inquietações

E essa história de EAC? Isso podia funcionar bem para outras pessoas, mas não para mim. Suponho que você tem razão, mas deveria pensar melhor. Não há o que pensar. Claro que sim, mas então já não seriam os meus livros. No aspecto técnico, sim, mas, claro, não é a mesma coisa, pensei tomando outro gole do meu suco. Claro que sabia que muitos livros eram feitos assim, mas eu me negava a participar dessa fraude. Os programas de Escrita Assistida por Computador, os famosos EAC, estavam causando furor nas editoras. É evidente que não existe melhor redução de custos do que eliminar o escritor.

Esse trecho reflete uma das muitas inquietações pelas quais passa o personagem Ramón, um assistente editorial de uma grande empresa de comunicações, protagonista no romance do espanhol José Luis Saorín, traduzido no Brasil como “A curiosa história do editor partido ao meio na era dos robôs escritores” (editora Relume Dumará, 2005). Um detalhe a mais que dá um tom cômico a esse “romance de intriga”: o editor Ramon carrega uma identidade secreta, ninguém menos que um escritor, cujo nome é seu próprio anagrama – Nomar.

A indicação de leitura veio até mim por meio de José Muniz Jr., professor do CEFET de Minas Gerais e pesquisador sobre práticas de autoria e editoria. O professor esteve em Natal em novembro de 2024 durante o Colóquio de Revisão de Textos na UFRN, e tal como o personagem, Muniz Jr. demonstrou menos entusiasmo e mais receio diante das possibilidades oferecidas pelos recursos de Inteligência Artificial, especialmente as generativas, que “geram” músicas, imagens e textos escritos, tal como especulou Saorín quando o Facebook ainda engatinhava.

Sem dúvidas, as possibilidades são muitas e não há como negar que esses recursos podem ser importantes auxiliares. Por exemplo, como ferramentas didáticas em atividades de leitura e escrita, nas diferentes fases da produção textual, da geração de ideias à revisão final.

Mas há que se lembrar, como alerta Sérgio Almeida Silveira, professor e pesquisador da Universidade do ABC e criador do podcast Tecnopolítica, alguns elementos básicos ligados às Tecnologias de Informação e Comunicação de maneira geral:

– Não há neutralidade por trás dessas plataformas e aplicativos;

– É uma ingenuidade ter confiança e fé nos contratos;

– Outra ingenuidade é crer que os efeitos das coletas de dados são iguais para países periféricos e países ricos;

– A soberania digital local é permanentemente desacreditada e negligenciada.

A esse respeito, é bom recordar o que aconteceu recentemente com a UFRN, que teve dados de ensino e pesquisa bloqueados pela Google por questões contratuais. Em suma, há que se lembrar que essas TI´s são controladas pelas chamadas Big Techs, megacorporações bilionárias que – todos vimos com a posse de Trump – pertencem a bilionários apoiadores da extrema direita.

Por fim, é importante lembrar também que essas ferramentas, supostamente criadas para facilitar nossa vida, não podem comprometer nosso senso de autonomia, decisão de escolha e liberdade criativa, elementos humanos, demasiadamente humanos.

É o que concluo ao ver, irritada, o tal do copilot querendo interferir enquanto escrevo este artigo…

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